Capítulo 1

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23/10/2019 às 13:00 PM

A menina encara as nuvens do lado de fora de sua casa, em cima da velha escadaria que dá em frente ao portão para rua. Ela vê as formas das nuvens se transformarem..., se fazerem e se refazerem várias vezes. A garotinha pode enxergar através dessas nuvens corações, peixes, pessoas e até um castelo.

"Como é possível?", ela se questiona.

E enquanto ela se mantém vidrada naquele magnífico céu azul se aproxima dela um pequeno garotinho de cabelos esvoaçados e acastanhados, ele grita:

— Caméliaaa! Vamos brincar, Camélia!

Camélia desvia o olhar do céu com o coração altamente acelerado, ela olha para aquele menino baixinho e esboça um sorriso dócil, dizendo:

— Pedrinho, fala para o pessoal que já vou brincar com vocês.

O garoto, Pedrinho, ri envergonhado enquanto acaricia suas próprias mãozinhas e diz:

— Tudo bem então Mélia, vo fala pro pessoal, tá?

Camélia não segura o riso daquela fala curta de Pedrinho. O garotinho tinha somente 4 anos e já era altamente sapeca e ativo. Um belo exemplo de criança espoleta. Ela então, se aproxima do menino e acaricia seus cabelos esvoaçados (mesmo tendo somente 8 anos, Camélia era bem madura quando o assunto era outras crianças, ainda mais se forem pequeninas).

— Pedrinho, vou ver se mamãe deixa eu sair primeiro aí eu peço para ela mandar mensagem para tua mãe tá?!

A mãe de Camélia não permitia que a filha tivesse um celular, pelo menos não ainda. Pode até parecer antiquado — talvez até seja mesmo. —, mas Amélia tem motivos bastante contundentes, como:

1 — Uma criança com tão pouca idade com acesso a um smartphone pode ficar viciada no aparelho;

2 — Crianças são seres curiosos, e cabíveis a 'armadilhas', dar um aparelho celular a uma delas não significa que você conseguirá monitorar todos os passos delas, ainda mais se forem pequenas. Existem pessoas terríveis por aí e que as atraem facilmente, ou seja, todo cuidado é pouco;

3 — Vivemos em uma época onde as crianças não brincam tanto como antes, isso porque passam grande parte do tempo vidradas em um smartphone. Qual é a graça de viver uma infância assim?

Por esses e tantos outros motivos Amélia decidiu não dar acesso ao celular a sua filha. Isso gerou várias críticas a ela, como careta, antiquada, presa no tempo ou rígida demais. Mas, ela não se importava, ela sabia muito bem o quanto isso era certo para sua menina e o quanto a livrou de uma infância sedada a internet.

Camélia resolve entrar para casa. A garotinha abre a porta de casa e já sente o cheiro maravilhoso de bolo de chocolate que sua mãezinha estava fazendo. Ela estufa o peitinho e suga aquela essência para dentro, chegando até a fechar os olhos para se deliciar com aquele cheirinho impecável.

— Mamãe, mamãe chegueiii! — Camélia grita e corre direto para a cozinha.

Lá ela encontra sua mãe já colocando a cobertura de chocolate sobre o bolo, e enfeitando com belos morangos, ela só consegue dizer:

— Que delícia mamãe!

Amélia solta um sorriso ao ver a carinha engraçada que sua pequena fez ao admirar aquele seu bolo. Aí como ela amava essa menina, como ela era a luz da sua vida sombria. Ela era o seu centro, o motivo dela ainda suportar essa vida.

— Vá lavar essa mão Camélia, ou nada de bolinho para você.

A menina faz uma carinha de brava, mas vai para o banheiro sem reclamar.

— Mamãe, mamãe!

— Oi, meu amor, o que houve?

— Pedrinho perguntou se posso brincar com ele mais tarde? — Camélia faz um biquinho, tentando convencer sua mãe. — Posso mamãe?

— Hum, sei não em Camélia.

— Ah mãezinha, por favor, eu deixei meu quarto todo arrumado! Você deixa? Deixa vai...

De tanto Camélia pedir — aquela coisa de criança. —, sua mãe acaba cedendo.

— Tá bom Camélia, tá bom! Eu vou falar com a Sônia sobre ok? Mas, quando for 16:00 PM, vou te buscar, ouviu?

— Sim, mamãe.

Amélia, então corta um pedaço bem generoso de bolo para sua menina e fica olhando-a comer. Pode parecer ridículo, mas é coisa de mãe. A garota na ansiedade de brincar come o mais rápido possível seu bolinho, mesmo a contragosto de sua mãe que dizia para ela ter calma. Mas, como pedir calma a uma criança na ansiedade de se divertir com os amigos? Logicamente algo difícil.

Camélia come e lava seu pratinho rapidamente. A menina vai direto para o quarto na maior agitação. Ela ri e dança sozinha enquanto pede para a mãe a vestir como uma princesa (palavras dela).

Amélia mesmo com uma certa dificuldade vesti sua filha e penteia seu belo cabelo cacheadinho. Aqueles anéis cor chocolate que a deixavam ainda mais doce, a sua bonequinha.

13:40 PM

Após conversar com a mãe de Pedrinho, Amélia saí de casa junto a sua filha afim de a levá-la para brincar. Uma tarefa complicada, mesmo com todos esses anos de prática, andar em uma rua toda esburacada e mal asfaltada, para uma pessoa sem necessidades especiais já é deverás difícil, imagina então para Amélia, portando sua velha cadeira de rodas que mal a suportava em ambientes próprios? Amélia se sentia mal toda vez que saí e percebia que demorava mais tempo que os outros para chegar nos lugares, ainda mais se ela estava ao lado de sua menina.

Ela se sentia impotente. E não era só a calçada e a falta de ambientes adaptados que a faziam se sentir assim... eram as pessoas e seus olhares julgadores. Afinal, ela era uma mãe cadeirante e solteira. Uma 'coitada' era o que eles proferiram.

Amélia deixa sua filha ali brincando, mas, quando ela se afasta tristemente ouve:

— Olha lá... lá vem a filha da cadeirante. Ouvi falar que ela cria a garota sozinha, não deveria ela ter dado para a adoção? 

Doce CaméliaOnde histórias criam vida. Descubra agora