Capítulo 1

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Eu esfregava as mãos insistentemente enquanto estava sentada no sofá da sala de uma chácara, rodeada por estranhos. A casa era de Carla, irmã do meu namorado, Víctor. Eu o conheci no Carnaval, logo completaríamos um ano de namoro, e ele decidiu que esse seria um belo dia para me apresentar a todos. Mas não foi bem assim que aconteceu.

Passar o Ano Novo em Paraty não estava nos meus planos. Cheguei um dia antes na cidade e adorei conhecer o lugar. Quase cinco anos morando no Rio e eu ainda não conhecia essa parte do litoral carioca. Confesso nunca ter imaginado que as praias dessa cidade fossem tão ricas no quesito beleza natural. Realmente, é de encantar os olhos.

Viajamos quase duzentos e sessenta quilômetros para eu conhecer a família dele e nos hospedamos em uma pousada, localizada no centro histórico de Paraty; um antigo casarão colonial com arquitetura do século XVIII, mas com uma decoração moderna e tropical que compunha também em seu cenário obras de arte dos artistas locais, pôsteres de clássicos do cinema e muito verde em seu jardim particular.

Depois de quase uma hora de arrumação em frente ao espelho, na dúvida entre batons, vestidos, sapatos e sapatilhas. Fiz um coque perfeito nos meus cabelos acobreados e passei quase meia hora tomando fôlego para encarar os olhares curiosos que eu atrairia. Depois disso, finalmente fechamos o quarto e saímos.

Eu mal podia conter o ritmo acelerado que batia meu coração e o suor frio escorrendo pelo meu pescoço com a visão da chácara grande e luxuosa de Carla. Víctor contou que aquele era o lugar de encontro das festas em família e me apresentou a todos, para logo em seguida me deixar plantada no sofá de sua irmã. Ele precisou ir ao encontro de Regina, sua ex-mulher.

— Ana, quer mais um pedaço de bolo? — perguntou Carla com voz carinhosa.

— Não, obrigada. — respondi, sentindo meu rosto corar.

Carla é uma senhora elegante, beirando os 50 anos, formada na área médica da dermatologia e proprietária de um dos centros estéticos mais bem conceituados do Rio de Janeiro. Ela era atenciosa comigo o tempo todo, e eu me sentia mal por não conseguir retribuir com o mesmo entusiasmo sua atenção.

— Não fique assim, querida. Víctor logo estará de volta. — Balancei a cabeça positivamente e ela saiu, ainda sorrindo, agora para os outros convidados.

Foi em direção à cozinha, onde estava seu marido Rodrigo, que preenchia os espaços vazios das bandejas com mais bolo. Ele parecia ter apenas alguns anos a mais que Víctor e era gerente de engenharia de uma grande empresa petrolífera, além de também possuir alguns dividendos no comércio.

Eu me sentia totalmente fora daquele ambiente aonde divertidamente crianças corriam pela casa e casais de amigos da anfitriã, que estavam acidentalmente sentados ao meu lado, sorriam felizes, imersos em seus assuntos, enquanto eu permanecia imóvel de frente a uma grande árvore de Natal com seus pisca-piscas reluzentes que fora colocada na sala a fim de trazer um ar natalino para o restante da decoração. Até ela era mais conhecida que eu por todos ali. Até ela combinava com o lugar, assim como todos. Menos eu.

Tudo isso porque Víctor tinha um filho de oito anos, e o garoto esteve bem durante o ano todo. Mas no Ano Novo, justo no meu aniversário, ele tinha que ficar doente, a ponto de ficar internado.

Víctor saiu às pressas, pouco antes das onze da noite. Foi para o ambulatório da cidade para encontrar a ex-mulher e o filho, que parecia estar com algum tipo de gripe, que havia piorado nas últimas horas, emergindo de um simples espirro e passando para uma febre muito alta.

Estive com Víctor o dia todo, e a cada hora daquele bendito dia, o telefone havia tocado com a voz estridente de Regina, a ex-mulher, do outro lado da linha.

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