8- Alessa não reconhece limites pessoais

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   Quando Maria acabou, eu me olhei no espelho, coisa que eu tinha me negado a fazer desde que ela tinha pego a máquina.
     Toquei na parte agora extremamente curta do meu cabelo. Ele estava todo preto agora, as luzes e o pouco azul que restava estavam no chão e a altura do meu cabelo agora estava no início do meu peito.
    Eu não estava estranha. Na verdade era um corte diferente, exatamente o que eu queria, mas uma parte do meu cérebro estava em puro surto, porque eu teria que falar com meus pais hoje, por vídeo chamada.
      Eu estaria tão morta.
Dei minha melhor tentativa de um sorriso de lado para Alessa.
- Eu falei que eu faria.
Ela deu um sorriso, levemente impressionado.
- Você não acha que seus pais vão brigar com você?
Eu me levantei da cadeira, falhando em não parecer preocupada.
- Não é como eles estivessem aqui- Ília interferiu, ainda com a tinta rosa forte no seu cabelo- e eles já são adultos o suficiente para saber que um corte de cabelo não define caráter, não é mesmo?
- Você só fala isso porque ainda não conheceu os pais dela- Alessa disse, se encolhendo.
- Meus pais também brigaram comigo quando eu comecei a pintar meu cabelo- ela disse, com um risinho- até eles perceberem que brigar não faria diferença nenhuma.
Como se meus pais fossem aceitar fácil assim.
      Eu sempre poderia torcer para que eles não notassem que eu raspei metade do meu cabelo.
      - Ília, vem aqui para o lavatório- Maria falou, e Ília se levantou rapidamente.
- Claro, eu já estou indo.
- Eu fico feliz que você tenha continuado a vir para cá- Maria comentou, enquanto enxaguava o cabelo dela- eu jurava que depois daquele feriado no ano passado você não chegaria nem perto daqui!
Eu tentei lançar um olhar para Ília em uma tentativa de uma pergunta silenciosa, mas ela não tirava o olhar da parede.
- O que aconteceu?- Alessa perguntou.
- Ah, Ília veio passar as férias de primavera aqui em abril e...
- Nada demais- Viviana cortou a avó, com a voz dura e eu vi Ília engolir em seco.
- Assunto sensível?- Alessa arqueou uma sobrancelha, perguntando como se a resposta não fosse óbvia.
- Talvez eu devesse pintar meu cabelo de roxo da próxima vez- Ília falou bem alto, tentando mudar de assunto.
- Roxo é uma boa cor- Vi disse- demora para sair.
Fiz uma anotação mental de perguntar o que tinha acontecido para Ília depois.

Quando nós voltamos para a escola, já eram quase sete horas. Ainda estava um pouco claro e o calor nos fazia andar pela sombra sempre que tivéssemos a oportunidade.
     Nós decidimos dar uma pequena volta pela escola antes de ir para o refeitório já que ainda era o primeiro dia de aula e eu ainda estava cem por cento perdida naquele lugar.
     Alessa parecia estar bem mais adaptada à nova escola, ou talvez só confiante na sua sorte, já que ela andava de costas enquanto tentava conversar com nós três.
     Ela sempre foi de se exibir.
Quando nós estávamos quase chegando, uma menina com o cabelo loiro cacheado, seguida pela menina ruiva, Sarah, acompanhada de outra menina passou por nós. A loira bateu ombro em Ília, não forte o suficiente para ela cair, mas fazendo com que ela desse alguns passos para trás para que ela recuperasse seu equilíbrio.
      Ília respirou fundo.
       - Eloise! Sempre é um prazer- ela disse com um sorriso forçado.
       - Você continua pintando o cabelo?- a loira disse, com um tom de falsa preocupação- eu pararia de fazer isso se eu fosse você. Uma hora ele vai cair.
       - Agradeço a preocupação, embora a cotovelada tenha sido desnecessária- Ília disse, tentando contornar a tal de Eloise, mas a menina continuou no seu caminho.
-  Acho que você pode considerar ela o troco por aquele soco que você me deu em Maio.
      Ília revirou os olhos, mas eu percebi que ela se encolheu um pouco.
      - Aquilo foi o troco por algo bem pior e você sabe.
      A tal de Eloise fez uma expressão de confusão.
      - Eu não sei do que você está falando.
      - Quer saber, eu estou com fome e sem paciência para isso hoje- Ília segurou minha mão e a de Vivian, que éramos as mais próximas dela- Au revoir- ela fez um gesto de cabeça e nos puxou para longe dali.
      A menina acenou enquanto nos afastávamos, e eu escutei Sarah murmurar um "Vamos, Ellie" enquanto a puxava para o lado oposto.
       Entramos na fila e ao perceber que ainda segurava nossas mãos, Ília as soltou rapidamente, usando elas para batucar de leve uma na outra, parecendo um pouco sem graça.
       - Então- Alessa falou atrás de nós- aquelas garotas são a versão da escola de vocês das "meninas malvadas"?
      - Eu não colocaria assim- Ília disse- nós já fomos amigas. A gente morava em outro estado na época e nossos pais trabalhavam juntos. Só que umas coisas aconteceram.
- Que tipo de coisas?- Alessa perguntou.
- Talvez você devesse parar de se intrometer assim- eu falei, antes que eu pudesse perceber o que exatamente eu tinha falado. Assim que eu me toquei, tentei consertar- acho que isso não é da nossa conta.
- Bem, eu não vejo nada de errado em fazer uma pergunta. Se ela achar que é muito pessoal, é só ela me falar e não responder- Alessa disse, dando de ombros e se esticando para pegar uma batata com o pegador.
- Acho que dá para você ter uma ideia se a pergunta é pessoal ou não antes de fazer ela.
- Bem, eu acho que só se comunicando com alguém você descobre quais são os limites de alguém.
Eu revirei os olhos, mas depois olhei para Ília para ver se ela iria responder ou não.
- Talvez quando nós nos conhecermos por mais de quarenta e oito horas- ela disse, se virando para pegar um pedaço de carne.
Depois de um tempo em silêncio, Alessa me perguntou:
- Você já pensou qual atividade extracurricular você vai fazer? Você vai ter que escolher no mínimo duas. Eu vou fazer jazz e dança contemporânea, talvez alguma outra coisa mas...
- Não sei- eu a cortei e fui para a mesa onde Alex e Luka estavam.

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