3. Lua

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 1 de Março de 2156

   O nevoeiro que se acumulava no ar, à minha volta, impedia-me de puder ter uma nítida visão.

   Onde está toda a gente? Questionava-me, junto ao limite da cidade. Do outro lado a situação era igual, não havia nada. Ouço, de repente, o crocitar de corvos e subo o meu olhar para o cinzento céu encarando as várias aves pretas a circular lentamente. Os meus pés caminhavam de forma acelerada tentando sair o mais depressa possível do terrível mato. Assim que chego à minha zona , o silêncio da pequena cidade ensurdecia-me.

   O nevoeiro começa a desvanecer assim que chego a minha casa, não me permitindo a entrada nela assim que os vejo no chão. Os cinco estavam numa horrível e esmagadora imagem, com costas rasgadas e pintadas de vermelho vivo. Os olhos abertos a encarar o além, sem um único pestanejar. O ursinho de Willa e a boneca de Martha no chão perto delas. 

   Estavam mortos. A minha família estava morta. 

   Todas as pessoas estavam mortas. As lágrimas caiam dos meus ilhos e afastei-me lentamente do meu lar. Eu só queria desaparecer.

   Tropecei noutros corpos. Corpos de pessoas pertencentes a ambas as zonas. 

   Um círculo de homens vestidos de negro formou-se à minha volta. Os meus joelhos doiam das feridas causadas pelas esmurradelas no chão de pedra. Uma arma foi apontada à minha testa. Fechei os meus olhos e enfrentei o meu destino. 

*

   Um grito sai dos meus lábios quando acordo do maldito pesadelo. Lágrimas cobriam-me a cara e o suor molhava o meu corpo. Sentei-me na berma da minha cama e olhei a janela entreaberta do meu quarto. A minha mente viaja aos acontecimentos de ontem à noite: a chegada do meu irmão ferido, os gritos da minha mãe e o choro das minhas irmãs. A culpa é demasiado esmagadora neste momento. O meu sonho deixou-me mentalmente exausta. 

   Para de pensa sobre isto. Agora é só lutar. 

   Forcei o meu corpo a abandonar o conforto da minha cama. Passei a minha mão nos meus esbranquiçados, longos e despenteados cabelos. Quando caminhei para o quarto de Aaron eram precisamente quatro da tarde. Tivera passado o dia inteiro trancada no meu quarto. Suspirei preparando-me para o ver depois de ontem, e bati à porta branca do seu quarto, que era mesmo ao lado do meu. Ouvi um pequeno e fraco "Entre". Engoli em seco e entrei no local não ligando muito ao ranger da porta no chão. 

   Os olhos do meu irmão param em mim. O seu corpo repousava na cama de barriga para baixo e o seu tronco estava nu, apenas com o cobertor a cobrir as suas pernas longas. Fazia um esforço enorme para não olhar as suas costas. 

   Sentei-me na cadeira a seu lado e agarrei a sua mão começando a acariciá-la devagar como se a mesma fosse de vidro. 

   "Como te sentes?" Decidi questionar a pergunta mais estúpida do mundo neste momento. Eu sabia que ele estava mal, mas para não me preocupar, ele iria dizer que estava bem. "De verdade... Quero saber como te sentes e quero que sejas sincero comigo."

   "Mal." A sua voz fraca espalha-se no espaço fechado e sou obrigada a apertar a sua mão assim que interiorizo a sua palavra. No entanto ele continua a falar. "Estou mal psicologicamente e fisicamente. Tenho dores, Eva. Agora sei o que sentiste."

   "Acredita que ver-te assim dói-me mais do que feridas." Murmuro baixinho, semelhante ao seu tom, para não o perturbar. Agora também sei agora o que ele sentiu quando me viu. "Isso vai passar, eu prometo que vai. Eu sou tão estúpida." Sinto o meu queixo tremelicar.

Inquisition || h.sOnde histórias criam vida. Descubra agora