4. Reunião

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1 de Março de 2156

   A falta de entendimento ainda estava presente na sua face. Todo este diálogo fez-me esquecer por um minuto que eu trazia o meu pé preso nas rochas e que me doía bastante. Assim que me lembrei, soltei outro gemido.

   Os seus olhos percorreram até à zona onde o meu pé estava metido. A sua expressão estava neutra. Com a ajuda das suas mãos, ele levantou a rocha, conseguindo tirar de lá o pé. Dei um pequeno suspiro de alívio e olhei para o meu ferimento. O tornozelo estava negro com alguns arranhões.

   "Dói, Lua?" A sua mão tocou no meu tornozelo apertando-o um bocado, fazendo-me soltar um pequeno grito.

   "Qual é a tua?" Interrogo chateada. Não entendia qual era a ideia dele ao me ter feito isto, nem de me chamar de lua, nem entendia o porquê de não ouvir a minha mãe quando ela me dizia que era impossível fazer alguma coisa em relação à inquisição.

   O seu olhar parecia chocado perante as minhas palavras cruéis e fria, mas este se recompôs. Ele rapidamente dá meia volta, regressando para a casinha de madeira, onde eu tinha intenções de ir também.

   Mancando, dirijo-me lentamente até ao sítio que me estava destinado esta noite. Não sabia se era boa ideia ir para o mesmo sítio onde o rapaz foi, eu não o conheço. Nunca vi tal cara em Kahli.

   Observo as suas costas, que param mesmo à minha frente ao encarar a entrada que havia para o substerrâneo, dentro da casa. A sua mão agarrava a vela e iluminava a entrada, mas não se atrevia a mover-se.

   "Com lincença?" Tosso forçadamente para chamar a sua atenção.

   "Não podes passar para ali." Ele responde rapidamente, fazendo-me erguer as minhas sobrancelhas.

   "Eu tenho que usar este caminho. E para além do mais, não tens nada a ver para onde vou." Contraponho a sua ideia. Maisie devia de estar quase a chegar à reunião, e eu não queria perdê-la por nada.

   "Ela disse-me que era perigoso ir por ali." Ele aponta para o grande buraco que havia no chão.

   "Quem?" Tento informar-me dos seus esquisitos modosde falar.

   "A Sol." A sua contestação faz-me ainda mais confusa.

   Este ser humano que estava à minha frente não era normal, definitivamente. Tudo o que eu menos precisava era de um ser humano raro a impedir o meu caminho.

   Empurrei ligeiramente o braço que me tapava um terço do caminho e usei a escada para descer o buraco que havia no chão. A luz que provinha do pequeno objeto de cera ajudava-me na visibilidade para conseguir descer as escadas.

   Assim que terminei a pequena tarefa perigosa, olhei para cima. Os nossos olhos verdes conectavam-se uns nos outros, deixando uma desconfortável atmosfera à volta tudo.

   "Anda." Suspiro, abanando a cabeça em desaprovação a ele.

   "Não posso." Consigo ver o seu caroço de Adão subir e descer rapidamente.

   "De que tens tanto medo?" As minhas mãos vão de encontro à minha cintura. Era a pergunta mais parva que já tivera feito em toda a minha vida. Haviam centenas de motivos para ter medo de ir à festa.

   "De sermos apanhados." Consigo ouvir a sua respiração acelerar.

   "És um alvo mais fácil aqui em cima, na verdade." Explico-lhe.

   Pelos seus olhos, consigo entender que ele está com uma pequena batalha interna sobre as suas decisões. Após uns breves segundos de pensamentos, ele finalmente assente.

   Vejo a rapidez com que ele desce as escadas, deixando-me boqueaberta. Poderia ter sido uma queda em cheio. Eram por volta de uns quarenta degraus em linha perpendicular com o chão.

   O seu corpo estava bem assente à minha frente. Sabia que iria chegar mais atrasada ao levá-lo comigo. Não é que ele seja um atraso de vida total, aliás, ele é muito intrigante.

   "Nunca te tinha visto em Kahli." Comento enquanto caminhamos pelos túneis.

   "Se calhar é porque sou de Ketler." Ele solta uma pequena risada deixando-me tensa em relação à sua curta resposta.

   Não fazia parte dos meus planos falar com um residente daquela cidade rica e cheia de privilégios. Posso estar em severos problemas se sou encontrada com este rapaz.

   "O que fazes aqui?" Murmuro rudemente.

   "À espera dela." As suas respostas incompletas e curtas não safistazem a minha curiosidade.

   "Pelos visto agora não estás à espera." Cruzo os meus braços sobre o meu peito.

   "Tens razão. Acho que vou ter com ela e ver se está tudo bem." Ele vira a sua cara para mim com uma expressão mais séria. "Na verdade, eu estava lá em cima a manter o caminho livre, caso alguém viesse intrometer na nossa saída." Um suspiro pesado.

   "Não é arriscado estar aqui pessoas de Ketler?" Questiono.

   "Sim, por isso é que só viemos uns cinco ou seis. Alguém precisava de vir para saber qual iria ser o futuro da cidade." Ele vai explicando, deixando aquela pitada de curiosidade quase escassa.

   "Voluntariaste-te?" Franzo as sobrancelhas.

   "Não." A sua singular resposta faz-me suspirar.

   Olho para ele que, neste momento, olhava em frente. A vela que nos iluminava o caminho, mostrava o estado da sua cara. Os seus olhos estavam a ficar ligeiramente vermelhos. Não sabia se havia algum motivo por detrás disso, talvez fosse apenas uma dor de cabeça, ou falta de sono.

   Empurrei os meus pensamentos para trás, quando me apercebi que tiveramos chegado ao tal subterrâneo. Esta festa não era nada semelhante às da floresta, a música não estava presente na nossa atmosfera. Era como se tivessemos entrado num lugar mórbido e silencioso.

   O olhar de quase todas as pessoas caem em nós. Sinto as minhas bochechas aquecerem, só me apetecia meter-me num canto.

   Os meus olhos suavizam assim que encontro Maisie, sentada numa mesa com outras pessoas. A sua mão ergueu-se e comandou que eu fosse ter com ela. Olho para o rapaz ao meu lado e este dá-me um pequeno sorriso para me incentivar. Caminho rapidamente até ela e sento-me na cadeira vaga ao seu lado. Não pude deixar de reparar que ela possuía um sorriso na cara.

   "Onde é que conheceste aquele rapaz lindo?" Ela puxa o meu braço e começa a falar-me ao ouvido.

   "Uh, na cabana de madeira." Respondo.

   "Ele é tão lindo!" Maisie volta a comentar, fazendo-me revirar os olhos.

   "Para com isso, ele é de Ketler e é muito esquisito." Explico-lhe.

   "Esquisito? Ele parece-me bastante social." Ela franze as suas sobrancelhas e aponta para ele, que estava rodeado de pessoas a rir.

   Na verdade, eu pensei que ele fosse um bicho do buraco, antissocial, que não soubesse ter uma conversa decente. Tal como aconteceu comigo ao início. Mas ali estava ele, perfeitamente são. Arrastei os meus pensamentos para fora da minha cabeça e tentei focar-me no essencial neste momento.

   "Maisie, qual vai ser a nova lei?" Interrogo desesperadamente.

   "O informador ainda não chegou, mas não deve tardar muito." Ela responde.

   Passados vinte minutos, uma voz grossa e áspera manda-nos a todos calar, chamando a nossa atenção. O homem desconhecido vai para cima da mesa e começa a falar.

   "Trago notícias, e creio que não são das melhores." O homem declara em alto e bom som.

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LY ♡

Inquisition || h.sOnde histórias criam vida. Descubra agora