𝑃𝑎𝑟𝑡𝑒 1

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ESTHER

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21 de dezembro de 2020

Segunda-feira

Esther estava prestes a explodir a cabeça do papai noel dançante na entrada da Doce Sonho. Na loja de bugigangas de 1,99 e outras coisas úteis para a vida humana não tinha nada de doce — no máximo, alguns chicletes que grudavam no céu da boca e pirulitos que quebravam os dentes das crianças.

— Esther! — Jandira berrou do interior da loja — Sua vez de limpar o banheiro hoje. Juliana teve que ir embora. Por favor, não esqueça os produtos debaixo da pia. Você sempre esquece.

Sua chefe também não era nada doce.

— Tudo bem — Esther tentou não soar irritada. A chefe passou apressada por ela, o coque castanho grisalho preso por uma fita laranja gritante. E então, sem dizer um tchau sequer, Jandira partiu deixando seus exaustos funcionários para trás.

— Olha, eu não queria dizer... — Bernardo surgiu carregando três caixas lacradas. — Mas Juliana teve gases. Ficou duas horas no banheiro hoje e pediu para que fosse embora mais cedo.

— Merda — Esther acariciou um ponto latejante em sua cabeça, lamentando-se pelo trabalho extra que teria naquele dia. Bernardo riu, jogando as caixas no chão. — Não jogue assim! Pode quebrar alguma coisa.

— São só guirlandas — ao tirar a fita, o rapaz pegou uma guirlanda e colocou sobre os cachos cor de chocolate. Seu uniforme cinza tinha uma mancha de pasta de dentes, mas ele não parecia se importar.

Esther olhou para o relógio na parede — ainda eram 18:30. Só poderia ir para casa às sete horas da noite. Para o alívio de ambos os funcionários, não havia mais clientes na loja. No entanto, ainda tinham que organizar as estantes e colocar novas mercadorias para o dia seguinte — e mais uma vez enfrentar um bando de consumidores lotando os corredores apertados da loja. A maioria comprava presentes de natal e enfeites. Como era de costume, as pessoas sempre resolviam comprar presentes poucos dias antes do Natal. Os enfeites ainda saíam, mas não tanto quanto no começo de dezembro e novembro.

O papai noel de 1,80 de altura balançava as mãos e cantava uma música incompreensível, piscando as luzes de suas roupas vermelhas na entrada da loja. Aquele ruído piorava sua dor de cabeça. Esther foi até lá e desligou-o, empurrando o bom e irritante velhinho para dentro. Bernardo o havia apelidado de Rourou, o que não era nada original e muito menos criativo. Ela aproveitou para fechar a entrada principal, evitando que mais clientes entrassem. Já escurecida do lado de fora, e um fino véu de chuva começava a cair.

— Ainda dá tempo?

Esther deu um pulinho e parou de descer o sólido portão. Ela encarou o metal cinza escuro, a ponta de seu nariz quase encostando na ferrugem. A moça engoliu a bile quando reconheceu aquela voz. Uma leve batida com o nó dos dedos ecoou por toda a loja.

A moça então levantou os braços, deixando o portão de enrolar subir novamente. Havia uma única pessoa ali, protegendo-se da chuva debaixo do toldo amarelo. A mulher era um pouco mais baixa que ela. Os cabelos lisos e pretos estavam um pouco úmidos, e seus olhos verde-folha pareciam mais claros sob a luz amarelada do poste mais próximo. Sua pele estava mais bronzeada que o normal.

Esther tentou controlar sua respiração, falhando miseravelmente. Ela se lembrou imediatamente do dia da festa da cidade, há alguns meses. As lembranças eram nebulosas, mas Esther se recordava de algumas coisas: Jaine segurando-a para mantê-la de pé enquanto a levava para casa. O embriagante cheiro de Jaine invadindo seu nariz. A súbita vontade de abraçar Jaine e não soltá-la.

Esther & JaineOnde histórias criam vida. Descubra agora