Capítulo 1 - Sérgio

45 9 5
                                    

O despertador do celular tocou na mesma hora aquele dia, Sérgio abriu os olhos mas permaneceu deitado na cama, em instantes adormeceu novamente. Não demorou muito para que o alarme tocasse de novo o obrigando a levantar. Realizou o clássico ritual matinal: checar as redes sociais, ir ao banheiro, escovar os dentes, tomar banho e trocar de roupa. Em uma hora o transporte escolar deveria chegar e mais um dia para tentar sobreviver em meio ao tédio e a falta de esperança que aquele lugar trazia.

Dentro daquela Sprinter cheia de adolescentes desanimados, todos isolados em seus mundos de sono e preguiça matinais, Sérgio era apenas mais um. A diferença estava no jeito e aspecto físico dele. Sempre calado vestindo alguma blusa preta, sempre observando com aqueles olhos azuis, sempre isolado com aqueles fones de ouvido e sempre motivo de chacota por causa do seu peso. Estava cansado, mas ainda conseguia conviver com aquilo. Na escola nunca foi destaque, nem nas notas nem em popularidade. Era sempre ignorado nas atividades em grupo e jogos. Seu dia resumia-se basicamente em existir.

Ao chegar em casa, às vezes ainda tinha que lidar com sua mãe e seu melhor amigo, Cabernet Sauvignon numa bela e enorme taça. Não podia reclamar da ausência de seus pais, uma vez que tinha muitas regalias por causa disso, como o melhor celular, o melhor computador e o dinheiro da gorda mesada. Sua mãe era coordenadora de enfermagem de um renomado hospital de Vitória e seu pai um grande empresário do ramo de peças automotivas. Ambos passavam a semana fora e eram raras as vezes que Sérgio os encontrava, por este motivo, conversavam apenas o básico. Ele não sentia falta da convivência, até gostava da liberdade que isso proporcionava. Podia fazer o que quisesse e o melhor, comer o que quisesse.

Sérgio passava muito tempo online, jogando, assistindo vídeos e numa constante busca por um amigo. Alguém que compartilhasse de suas idéias e que achasse graça de suas piadas. Ficava horas navegando em grupos de Facebook e fóruns de jogos, lia tweets de gente reclamando da vida e dava RT em cada um deles, menos os que falavam de amor pois ele nunca teve esse tipo de interesse. Não conseguia ver graça nesse tipo de interação, na verdade, não sabia porquê não achava graça. O que se passava dentro dele? Em que momento as coisas iam começar a acontecer de fato?

Ao anoitecer, pedia alguma coisa pra comer pelo aplicativo e seguia pela madrugada entre uma partida e outra, entre um filme e outro. Gostava das noites pois achava que era o melhor momento do dia. Ele pouco pensava acerca de ambições, sonhos e planos. As vezes queria sumir, as vezes achava que não conseguiria viver longe do seu mundo tecnológico de ilusões. Sentia falta de algo, ou de alguém, faltava alguma coisa para que tudo aquilo fizesse sentido e o impulsionasse para alguma direção. A cada dia a sensação de vazio só aumentava e a ideia de fugir já não ia parecendo tão distante e estranha assim. O que mais faltava?

O melhor lugar é onde você quer estar!Onde histórias criam vida. Descubra agora