Eu sabia que não importava o quanto eu chorasse ou batesse de frente, ele não mudaria de ideia e no auge dos meus 17 anos teria que me casar com um rapaz de 20 anos, o qual eu nem conhecia. Meu amado pai faria uma aliança com a família dele em troca de ajuda financeira — já que o mesmo hipotecou nossa casa em uma de suas apostas milionárias.
A querida Sra.Menezes não se opôs uma única vez, sempre obediente ao seu marido. E isso com certeza eu não seria. Enxugo as lágrimas e começo a aceitar que este será o meu fatídico destino que eu teria que vivenciar por pelo menos 3 anos até que meu pai consiga pagar o Sr.Navalles — sim, eu era uma garantia um horror literário, mas no meu caso eu não me apaixonaria pelo meliante.
***
A noite já escurecia o céu e as nuvens já iam se amontoando, mostrando que logo a chuva cairia. Depois do jantar extremamente silencioso, pedi licença e subi para o meu quarto, me deitei para descansar e olhando para a janela onde as gotas de chuva apostam corrida sobre o vidro, dormi tendo o barulho dos trovões como trilha sonora.
Os cabelos negros molhados caiam sobre a testa e o deixava com uma aparência ainda mais e despojada, o garoto de 13 anos balançava no balanço feito de madeira de mãos dadas comigo — sim eu conseguia me ver, mas não estava vivendo o momento então possivelmente era só uma lembrança.
Nós rimos de de algo extremamente engraçado, mas logo depois cessamos os risos e ele se pôs a falar.
— Você voltará para me visitar Liza?
— É claro que virei Math — disse confiante. — Mas só se você me prometer que não mandará bilhetinho a nenhuma outra garota, principalmente a Sara.
— Eu prometo Liza, principalmente pra Sara.
— Eu vou sentir a sua falta, tenho medo que me esqueça um dia... — disse ele triste.
— Eu também sentirei a sua e eu nunca irei te esquecer, nunca Math eu prometo.
— Eu também nunca te esquecerei meu girassol.
Então de repente não me encontrava mais no jardim de sua pequena casa e sim, em frente a minha antiga casa, o garoto estava abraçado a sua mãe e eu estava ao seu lado e juntos observamos o carro sumir de nossas vistas, levando embora uma garotinha que chorava no banco traseiro.
Acordei cedo, a lembrança do sonho ou da memória ainda se mantia vivida em minha cabeça e agora eu começava a juntar as peças — talvez pela saudade meu subconsciente havia criado uma barreira não me permitindo lembrar desse momento, mas agora tudo começava a se encaixar, como se a cortina estivesse enfim se abrindo. Agora eu me lembrava, me lembrava quem era ele. Matheus era meu amigo antes de nossa mudança permanente para São Paulo (amigo e primeiro amor), nós éramos extremamente próximos, ele sempre me acolhia e me dava um girassol quando minha mãe brigava comigo, gritando o quanto eu não fui devidamente planejada, ainda me lembro do grave de sua voz soando em meus tímpanos...
— Você faz muita bagunça Eliza, eu já estou cansada desses brinquedos jogados, se você fosse um menino seria mais útil. — ela esbravejava.
E sempre que isso acontecia eu corria de encontro a ele e dizia:
— Eu não sei por que a mamãe tem tanta raiva de mim, eu não tenho culpa de ter nascido uma menina.
— E que bom que você nasceu uma menina.
E nós íamos para sua casa, onde sua mãe cujo o rosto eu não me lembro, apenas de seus longos cabelos lisos e pretos e do jeito que a mesma sempre me acalmava. Respiro fundo contendo as lembranças que voltavam rápidas demais, para acalmar o coração e a mente resolvo tomar um ar e saio para caminhar um pouco pelo jardim, descalça para sentir melhor a natureza — pois isso sempre me acalmava.
Sinto a grama raspar em meus dedos; úmida, áspera e um pouco pontuda, sorrio com a sensação e me sento debaixo do pé de Ipê rosa, onde algumas flores coloriram o massante verde ao meu redor.
E lá estava ela novamente, dolorosa e cheia de nostalgia, a lembrança que me fez ficar doente de saudade que eu a apaguei da minha mente. Ainda podia ouvir os passos apressados de meu pai rodando o quarto grande demais para uma única pessoa, a mulher de cabelos loiros, olhos claros e pele branca — já se entregava que pertencia a elite, sempre bem vestida e bem arrumada, estava apenas sentada e calada observando o caos que acontecia. E eu me encontrava sentada, joelhos dobrados e cabeça entre as pernas, o choro era alto e os soluços também.
— Pra que todo esse show Liza? — perguntou o homem alto, cabelo bem cortado e barba rala, vulgo meu pai. — Ele só é um menino qualquer, pobre, desfavorecido. Você fará muitas amizades ainda, amizades boas. — corto sua fala antes que ele prossiga.
— Amizades de elite. — encerro sua linha de pensamento.
— Isso querida, onde já se viu uma menina linda desse jeito, rica se relacionando com um filho de faxineira e nem pai o pobre coitado tem. — pauso e continuou, com seu ar de superioridade.
— Eu sei que o garoto não tem culpa de ter nascido pobre, mas você terá culpa do pensamento que os outros terão se te verem misturada com essa gente.— Seu pai está certo querida, já diz na Bíblia: diga com quem tu andas, que eu direi quem tu és.
— Vocês são ridículos — esbravejei. — Eu o amo pelo o que ele é e não pelo o que ele tem e ainda vocês tem coragem de dizer que seguem a Deus, Deus é amor não é ódio.
Ainda me lembro do olhar de fúria que eles me deram e depois disso fui proibida de ver ele e sua querida mãe e só depois de muito choro que me deram 10 minutos para a despedida e desde então nunca mais tive a oportunidade de revê-lo.
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O Destino
Short StoryA família Menezes faz parte da elite; sua casa luxuosa, seus carros importados e as muitas viagens que a família fazia delegavam isso. A família era típica de comercial de margarina, o pai um empresário, a mãe do lar - vivia para o marido e uma ún...