Dois: Solteira

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— Já volto, meninas — avisei às minhas duas amigas e ao levantar-me daquela mesa, dei de cara com aquele belo rapaz loiro. Um tremor passou pelo meu corpo, principalmente ao vê-lo sorrindo feito bobo, só aumentando minha desconfiança quanto às suas intenções de me chamar para uma conversa particular.

Micael, apesar de relativamente jovem, era um dos mais antigos membros comprometidos com o projeto de missões estabelecido naquela região da cidade. Semelhante a mim, seus pais também eram missionários e ele acabou seguindo o mesmo caminho quando mais velho. Eu não o conhecia muito bem, mas sabia que era simpático com todos e pelo seu envolvimento, parecia amar seu trabalho.

Não tínhamos muito em comum e até poucas semanas, nossa relação se resumia a cordiais cumprimentos e rápidas conversas formais. Isso até certo dia quando após um culto, ele resolveu se juntar a uma conversa minha com Lídia e um dos professores do instituto, mostrando-se muito interessado nas sugestões de projetos que dei.

Depois disso, os pretextos dele para puxar assunto comigo tornaram-se frequentes. A principio não vi segundas intenções e ao contrário de minhas amigas, não considerei que o objetivo dele com aquela aproximação repentina era apenas me conquistar. Mas tudo ficou claro como água quando, no dia anterior, ele resolveu me buscar e ainda presentear com uma rosa, coisa que não fazia com nenhuma outra moça, exceto, é claro, aquelas com quem desejava algo a mais. Ou seja, minha situação não era nada fácil.

— Podemos ir? — perguntei e, ansiosa para resolver aquela pendência o mais rápido possível, segurei em minha trança, alisando-a freneticamente.

Micael sorriu e para aumentar ainda mais o meu constrangimento, estendeu a mão para mim. Não sei se pretendia que eu segurasse como se já fôssemos um casal ou se queria apenas ser educado, mas resolvi seguir a segunda suposição e apertei, cumprimentando-o rapidamente.

— Sim, podemos ir. — Ele escondeu as mãos no bolso e me estimulou com um sinal a seguir adiante.

Aproveitando aquela oportunidade saí andando rápido e não sendo nada inocente, escolhi um banco na área externa, de frente para o jardim, onde alguns colegas realizavam uma oficina de artes ao ar livre, assim não correria riscos de ver o apessoado líder tentando alguma gracinha, caso tentasse.

Micael, então se aproximou com cautela e tomou um lugar ao meu lado.

Os primeiros minutos foram de silêncio entre nós, o que aumentou meu constrangimento. Ao encará-lo discretamente constatei seu nervosismo aparente e inquietação que me levaram a crer que problemas vinham por aí.

No mesmo instante orei mentalmente, pedindo uma direção do Senhor, pois não podia ser rude e ao mesmo tempo não deveria deixar de esclarecer que nada, além de amizade, aconteceria entre nós, caso seu objetivo fosse mesmo se declarar.

— Bianca, eu...

— Micael, eu...

Falamos ao mesmo tempo e isso me deixou ainda mais sem graça.

“Certo, talvez seja melhor deixa-lo falar primeiro” considerei comigo mesma, ainda tendo esperanças de estar enganada.

— Vá em frente — pedi incerta e mordi o lábio.

Ele esboçou uma risadinha, massageou a garganta e virou o tronco em minha direção.

— Bem, preciso confessar algo muito sério pra você — declarou por fim e ergueu o peito, como se finalmente tivesse tomado coragem necessária para agir. Ele tentou se aproximar, mas eu recuei um pouco mais. — Não sei se percebeu, mas eu tenho te observado bastante nesses últimos tempos.

Do Grão à Perola - Livro 3 (EM PAUSA)Onde histórias criam vida. Descubra agora