Prólogo:

1.6K 272 141
                                    

"Mulheres de Jerusalém, eu as faço jurar: Não despertem nem incomodem o amor enquanto ele não o quiser" assim dizia Salomão em Cantares capítulo oito, verso quatro.

Desde menina sempre ouvi de meus pais, em especial de minha mãe, sobre a importância de guardar o coração enquanto não fosse chegada a hora de ter amor desperto. Papai sabiamente até mesmo costumava me aconselhar: "a pessoa certa, no tempo errado, é a pessoa errada". Mas é uma verdade universalmente conhecida que a adolescência é quase um sinônimo de se apaixonar precocemente. Comigo, infelizmente, isso não foi diferente. E claro, por consequência, a decepção não demorou a chegar, e veio como instrumento do Senhor para quebrar meus planos e expectativas.

— Oh, querida, suas amigas me chamaram. Mamãe está aqui — ouvi aquela voz gentil ecoando do lado de fora do banheiro da igreja onde eu me escondia.

No mesmo segundo abri a porta e vi o susto de mamãe com meu semblante. Eu estava arrasada e em prantos. Como de costume, fui me acolher, como um bebê, nos braços daquela de quem ouvi tantos alertas quanto aos riscos iminentes dos caminhos que tomei.

— Ah, mami! Estraguei tudo! — lamentei com grande dor. — A senhora me avisou tantas vezes e eu não quis ouvir!

Mamãe ergueu meu rosto inchado em sua direção e acariciou minhas bochechas úmidas.

— Calma, Bianca. Respira — ela pediu devagar e repetiu alguns. — Conta pra mim o que aconteceu. Até agora estou sem entender.

Apesar de confiar em minha mãe completamente, isso não me livrou da vergonha de expor meus atos e admitir as falhas.

— Eu me apaixonei, a senhora deve saber por quem — revelei, mas minha voz saiu inconstante. Mamãe balançou a cabeça como se confirmasse suas suspeitas. — Tentei evitar, mãe. Mas como poderia? Nunca conheci um rapaz tão lindo, fofo, fiel a Deus — balbuciei, não conseguindo parar de chorar. Dona Renata riu discretamente ao me ouvir. Talvez pensasse ser uma brincadeira. — É sério, mãe! Relutei, mas quando o ouvi declarando que só beijaria sua esposa, meu coração se derreteu.

— Entendo, querida, mas...

— Não, mãe. A senhora não faz ideia! Desde que passou a congregar conosco, percebi que ele não é como esses meninos tontos da igreja. Ele participa de todos os cultos, nos estudos bíblicos faz perguntas interessantes, não perde as reuniões de oração e não finge orar como aquele filho do presbítero, além de estar sempre estudando com o papai. Ah! E a senhora mesma disse que admirava o modo como ele cuidava de sua avó — falei mais empolgada do que previ. — Me diga, mamãe, como eu não me apaixonaria por um rapaz assim?

— Bianca, filha, odeio ser aquela que quebra suas expectativas, mas preciso lembra-la, você tem quatorze anos, meu amor. — Ela alisou meus cabelos ruivos. — E tem uma longa jornada pela frente até poder se casar com um rapaz, mesmo que seja tão bom quanto este. Não posso te incentivar.

Aquelas palavras machucaram meu coração, mas, embora, não soubesse disso na época, eu precisava ouvi-las.

— Não será necessário me incentivar. Eu já estraguei tudo sozinha. — Deixei cair os ombros. — Fiz uma coisa terrível.

— Você não confessou os sentimentos pra ele, não é? — Mamãe observou e ao me ver morder o lábio, teve sua resposta. — Oh, filha! Quantas vezes não conversamos sobre esse assunto? A mamãe não te disse que as princesas não vão atrás dos príncipes? É o Rei quem escolhe e a entrega para aquele que se mostra digno de sacrificar até mesmo sua vida por sua amada.

Desatei a chorar de novo, me sentindo ainda mais tola.

— Não foi por querer, mamãe. Foi um acidente! — confessei desesperada. — Ele não deveria ter ouvido. Nunca mais vou conseguir encará-lo novamente. Foi um erro, mamãe!

Mamãe fez uma pausa e vendo meu estado, deixou o sermão de lado por alguns instantes e apenas me abraçou com força. Depois de apenas chorar por alguns minutos, eu a encarei.

— E agora? — perguntei buscando uma solução para os meus dilemas. — E se ele gostar de mim também? Poderia me esperar, não é?

— Talvez. — Mamãe olhou para baixo, certamente sabia que as próximas noticias seriam muito difíceis para mim. — Mas o melhor que você pode fazer agora é desfazer suas expectativas, porque seu amado está partindo para o campo missionário e já falou ao seu pai que não pretende voltar tão cedo. Não se iluda.

Senti mais uma vez o coração partindo-se em mil pedacinhos.

— Eu não entendo, mãe — admiti, sentindo a respiração ficando inconstante. — Por que Deus faz isso? Por que Ele não me avisou antes? Por que permitiu que eu nutrisse esses sentimentos, apenas pra acabar dessa maneira?

— Talvez Deus quisesse te ensinar algo, meu amor. — Ela suspirou e sorriu. — Te ensinar que o seu coração pode fazer planos, mas a resposta certa dos lábios vem do Senhor*.

-----

*Provérbios 16.1

-----

Prontos (as) para mais uma jornada? 😍😎

Do Grão à Perola - Livro 3 (EM PAUSA)Onde histórias criam vida. Descubra agora