Capítulo IV

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A chuva começou fraca. Geralt se apressou, porém, teve tempo apenas de desamarrar o advogado do bardo e colocá-lo de bruços sobre o cavalo, e a água caiu do céu com mais força. O cavalo era um pouco teimoso, muito diferente de sua Plotka, que naquele instante estava segura do temporal e descansando da longa viagem, então, foi um pouco mais difícil guiá-lo pelo caminho que deveria ser curto, mas que por conta da falta de uma boa visão e um transporte obediente, ele demorou o dobro de tempo.

Um pouco à frente ele podia ver Jaskier sobre o alazão de Ciri, que o guiava devagar demais, usando a desculpa da chuva para ser cautelosa, quando na verdade não queria deixar o bruxo totalmente para trás. Zoltan seguia ao lado, resmungando em cima de um pônei, amaldiçoando o tempo enquanto perguntava constantemente se aquele contato com o frio não pioraria a situação do bardo, que insistia que estava ótimo, quando o corpo abraçado por si mesmo doía como nunca antes.

Geralt podia também escutá-los, e enquanto tentava manter o corpo desacordado do advogado equilibrado, desejou que a situação fosse diferente. Era ele quem deveria estar levando o bardo, era os seus braços que deveriam estar em volta do corpo trêmulo, mas seus desejos não passavam de sentimentos egoístas, o bruxo sabia, por isso não insistiu ou tentou se aproximar um pouco mais dos outros por todo o caminho. Ele só pôde ver os rostos de Ciri e Zoltan quando o Camaleão fora alcançado. A chuva estava mais intensa, e o advogado começara a dar os primeiros sinais de que estava para despertar, enquanto Jaskier não esperou um segundo sequer para se proteger da chuva e da companhia de Geralt.

— Eu vou levar o advogado até a esposa dele — o bruxo disse enquanto observava as costas do bardo se afastando, e só voltou a olhar para os outros dois quando ele sumiu dentro do cabaré. — Chamem alguém para cuidar de Jaskier.

Ciri assentiu com seriedade, e mesmo já estando completamente molhada, retirou sua longa capa e cobriu o corpo do advogado.

— Não demore.

Ela continuou com a expressão séria, mas não desviou o olhar desta vez, diferente de Zoltan. O amigo do bardo e do bruxo manteve o olhar baixo enquanto dava a direção da casa de Alois Bogdan, e antes de Geralt partir, também correu para se proteger da chuva.

Ciri o esperou, mesmo com as palavras do bruxo para que se cuidasse da chuva que virava uma tempestade. Ele ainda pôde vê-la enquanto ia em direção ao centro de Novigrad, e mesmo com toda aquela atenção, não o deixou menos entristecido. Eu a decepcionei; decepcionei todos eles.

A olhar espantado e preocupado da esposa de Alois Bogdan foi o primeiro cumprimento que recebera. Dentro da casa estava quente e aconchegante. O cheiro de pão fresco e um vinho recém-aberto tomavam o ar; ela estava preparada para receber o marido, mantendo a fé que o receberia de volta, mas as lágrimas foram dolorosas ao vê-lo tão machucado. Ainda assim, ela agradeceu o bruxo e o convidou para ficar. Apesar da sensação de que atrapalharia a recuperação do homem, ele cogitou aceitar. O Camaleão não era longe, mas duvidava que seria bem-vindo por muito tempo, mas, não houve como permanecer ali, quando o seu coração estava no cabaré.

Geralt partiu novamente quando os raios e trovões estavam em seu auge. As ruas estavam vazias e o barulho de pessoas fora substituído pelos sons da tempestade, que assustava o pobre cavalo, que há muito não aguentava mais o seu dono temporário. O bruxo até mesmo podia jurar ter escutado um suspiro de alívio quando o deixou no estábulo ao lado de Plotka, que o recebeu com carinho quando tocou sua crina. A égua bateu a cabeça na de Geralt, que abriu um leve e triste sorriso ao cumprimentá-la.

Os pés estavam encharcados dentro das botas de couro, porém, o bruxo sequer pensou em tirá-la quando entrou pela porta do Camaleão. Os cabelos pingavam chuva no piso de madeira, e por um momento pôde ouvir em seus pensamentos a voz do bardo reclamando do jeito descuidado com seu estabelecimento.

Pelo Ouro e o TrovadorOnde histórias criam vida. Descubra agora