Capítulo Um

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#DerramandoVinhoTinto🍇

O sobretudo vestido sobre sua blusa fina bloqueava todas as ondas de vento frio que os atacavam naquela noite escura de outono em Seul. Ainda naquele corpo, sentindo minuciosamente — e de forma tão incômoda — o sangue fervoroso se arrastar espesso pelas suas veias, a solidão permanecia a mesma, num recipiente tão pequeno, um corpo tão frívolo, efêmero como os segundos apontados no relógio de pulso que agora Taehyung carrega consigo.

Imaginou que, com a transferência, a imensidão do que lhe assombrava se tornaria, de alguma forma, branda. Algo tão imbatível e avassalador para o corpo onipotente de um Deus não deveria, certamente, se esgueirar de maneira sorrateira, a ponto de mal ser notada em sua movimentação, para um corpo que se mantém apenas através do pedaço de carne latejante alocado no lado esquerdo do peito.

Em seus pensamentos espiralados, aquela vastidão jamais caberia em algo dito tantas vezes inane.

Os grandes sentimentos caberiam apenas aos grandes deuses merecedores, mesmo que os infelizes.

Mas para sua lástima, o pequeno corpo parecia tender ao que desaparecia. A nuvem taciturna pairando sobre sua cabeça deixava a impressão de que, pelo o que sustenta em seus ombros, aquele corpo já se degradava, ainda que o sangue em suas veias continuasse a queimar com tanta força, com tanta... vida.

Ao seu lado, seu mensageiro que jamais deveria ser chamado pelo próprio nome outra vez. Hermes agora, nos cabelos loiros humanos estendendo-se até a testa, quase alcançando os olhos, seria Min Yoongi. A pele clara e brilhosa lhe recobrindo a aura ainda não podia esconder toda a magnificência exposta nos céus àqueles dispostos a encará-la e admirá-la, bem como a prata cintilante nas suas orelhas mostra de forma sutil a permanência da riqueza qual dispõe em sua própria terra.

Não muito diferente acontecia consigo, muito mais alto quando repousa nas botas de salto discreto, Taehyung exibe sua grandiosidade nos olhos escuros revelados através das madeixas longas de cabelo que caem sobre esses mesmos.

Suas vestimentas requintadas, tão bem selecionadas pelo seu interlocutor de segurança com o mundo humano, contribuem para a elegância que se arrasta com eles desde o primeiro passo que deram neste mundo, num beco estreito e escuro, até onde estão agora: uma avenida grande, exageradamente acesa, mas que ainda com toda a luz não era capaz de escapar de ser engolida pela escuridão da noite.

Antes que ousassem escapar dos céus de maneira imprudente, seu velho subordinado — o único, além do loiro mensageiro, cujo Taehyung definia limitações mais suaves — havia preparado esta pequena cidade para serem recebidos da maneira mais reverente possível, ainda em anonimato: uma reserva no hotel de luxo na principal de Seul, a cobertura 436 para o deus e aquela logo ao lado para seu mensageiro e fiel companheiro, Min Yoongi.

A organização delicada de Taehyung antes de sua vinda, extensa e demorada, incluindo dias de estudos sobre o mundo que tanto lhe instiga, quase acobertava o desespero decadente queimando em seu peito de forma tão insistente. Esperar para alcançar seus objetivos nunca foi de seu feitio — apesar de impaciência não ser exatamente algo que lhe marca a personalidade — e agora engolir suas ambições, estocando tão fundo seu anseio após tantos anos de satisfação imediata, parecia como a punição de seu pai insatisfeito para com ele; Depois de incontáveis anos passados, como se sua amargura jamais fosse dissolver-se, ele retorna para castigar Kim, ainda agarrado à memória de como seu sofrimento levou seu filho ao trono e os céus à sua governação desamparada e vergonhosa.

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