Prólogo - Império

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   A maioria das nações mais antigas do mundo tem histórias interessantes sobre seus monarcas. Reis benevolentes, conquistadores, justos, guerreiros, cruéis... Mas poucas tem a liberdade de dizer que já tiveram um soberano insano. A Rússia teve o czar Ivan, o Terrível que torturava e matava quem quer que ameaçasse seu posto, a França teve Carlos VI com seus surtos homicidas, o Brasil, a psicótica Maria I, até mesmo a Roma nomeou um de seus imperadores, Marco Cômodo, como soberano louco graças à sua obsessão heroica.

   Mas essa é a história de outro tipo de monarca. O Rei Louco, conhecido desde criança como Príncipe Demoníaco, o herdeiro da família Yi de Joseon, Yoongi. O Imperador Suga da Coreia não é citado nos livros históricos, e as pessoas ainda sussurram ao falar do monarca amaldiçoado, aquele que deixou o país cair em desgraça por cem anos. Mas o que a maioria das pessoas não sabem é que a história de Yoongi, embora cruel e violenta, tenha sido um romance, e que seus atos insanos e inconsequentes tenham sido causados por uma mulher.

   O antigo Imperador Gojeong, pai de Yoongi, era visto como um rei bom, íntegro e honrado, apesar de ter sido conhecido como O Rei Supersticioso, que contava com não menos que vinte xamãs pessoais, mantidas dentro do palácio imperial para afugentar espíritos malignos, receber profecias e manter a família real segura. Joseon era, até então, considerado um dos reinos mais afortunados e prósperos da Ásia, e o povo estava comemorando o nascimento do primogênito de Sua Majestade, filho da Rainha Min. No entanto, na noite em que a Rainha deu à luz, as xamãs do rei tiveram presságios consecutivos de um futuro obscuro para a nação, e assim que o filho do Imperador nasceu, a Rainha Mãe, tão amada pelo seu povo e monarca, morreu.

   As xamãs, extasiadas pelo chamado que receberam, confidenciaram ao Imperador que a alma do príncipe era tão negra e envenenada que a Rainha Mãe sucumbiu de desgosto. Gojeong, enlutado pela morte da mãe, jamais visitou o filho, e desde aquela noite não voltou mais aos aposentos da Rainha, que enfurecida culpou a criança pelo desprezo do marido.

   O Rei, obcecado com as profecias enlouquecidas da xamãs, espalhava amuletos pelo palácio na esperança de afastar o mau agouro, e logo que seu filho começou a andar o colocou nas mãos de seus melhores espadachins, generais e sábios, assim tentando evitar o futuro desastroso do país, preparando o príncipe para qualquer circunstância.

   O garoto logo começou a mostrar tendências violentas, castigando severamente seus servos, machucando cruelmente seus colegas de treino, e tendo uma personalidade fria e agressiva, assombrando até mesmo o mais rígido de seus mentores. Boatos começaram a percorrer na capital de que o Príncipe era um sádico insano, e de que era frequente o desaparecimento de servos do palácio, dos quais nunca mais se via ou ouvia falar. Preocupado com a reputação da família real, Gojeong, em puro desespero, lançou diversas leis e avisos, ameaçando castigos, espancamento e no pior dos casos execução caso alguém fosse pego proferindo insultos ao príncipe. O cenário social na capital entrou em decadência, todos os dias livrarias eram invadidas por agentes do governo procurando por livros expondo a vida violenta do herdeiro, caçadas por jornalistas foram abertas, execuções públicas eram exibidas em cada distrito, desde o mais nobre até o mais pobre, lar dos escravos, as ruas fediam a sangue e terror. Semanas de pânico passaram, se tornando meses, por fim anos, os boatos jamais cessaram, mas diminuíram a ponto de nunca chegar aos ouvidos do Imperador ou de seus conselheiros.

   O Príncipe cresceu em um ambiente hostil e impetuoso, adotando um comportamento calculista e tirânico. Aos dezesseis anos foi nomeado Capitão do Exército Real, e montou seu próprio esquadrão de milícia. O Imperador passou a mandar o filho para sustentar invasões de reinos rivais, dissipar revoltas no interior e até para batalhas intensas nas fronteiras de Qing. Os cidadãos, assombrados pelas chacinas de anos atrás, rezavam pela morte do herdeiro todas as vezes que ele deixava o palácio para guerrear, mas se decepcionavam e se chocavam quando o jovem militar voltava todas as vezes com vitórias cada vez mais grandiosas. Festas e comemorações eram realizadas em honra ao Capitão, opulência e luxúria eram ostentadas no palácio com mais frequência, trazendo de volta boatos em depreciação ao herdeiro. Livros proibidos descrevendo com detalhes essas festas podiam ser encontrados em livrarias ocultas, acompanhados de pinturas explícitas.

   Antes dos rumores chegarem aos ouvidos atentos do palácio e as buscas começarem novamente, o Imperador e Sua Majestade Imperial Gojeong de Joseon morreu inesperadamente, levando consigo todas as esperanças da nação. Yoongi herdaria o trono com apenas vinte anos, não mais que um garoto, carregando o peso de tantas mortes pela sua espada e o apelido de Príncipe Demoníaco, sendo chamado assim tanto por seus inimigos quanto por seu próprio povo.

 Yoongi herdaria o trono com apenas vinte anos, não mais que um garoto, carregando o peso de tantas mortes pela sua espada e o apelido de Príncipe Demoníaco, sendo chamado assim tanto por seus inimigos quanto por seu próprio povo

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Nota da autora.

Aqui vai um glossário de alguns nomes e conceitos que usei/uso durante a história.


Clã Yi: foi de fato o nome de uma das família reais mais poderosas de Joseon.
Clã Min: um clã nobre, família da Última Imperatriz da Coreia, ancestral do Yoongi.
Qing: antigo nome da atual China.

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