Os Pecados da Salvação

Capítulo 4

O dia transcorreu tão rápido, várias pessoas para atender e dar acolhimento, graças a Deus eu consegui me focar no que estava fazendo e não no que acabara de acontecer, mas eu sabia que de noite, os meus demônios me atormentariam e eu espero ter forças para fazer o que é certo.

Uma das razões de padre Matias ter me colocado para atender as pessoas, foi para aprender a me conectar a elas. É estranho, pois eu sempre me senti afastado da maioria das pessoas, mas ao mesmo tempo, ao ser educado e simpático, isso faz as pessoas se sentirem a vontade e se abrirem comigo, a bem da verdade, tenho essa sensação desde sempre, contudo, nunca realmente me senti a vontade para me abrir com as pessoas, uma vez que sempre estive nesse papel, para quem muitas pessoas confiaram coisas terríveis sobre suas histórias e as guardo comigo até hoje, mas nunca me senti realmente a vontade com alguém para ser simplesmente que eu sou... ao menos não até hoje.

Conversei hoje com diferentes tipos de pessoas, desde senhoras auto proclamadas beatas, até jovens confusos com a própria sexualidade. Uma mulher em especial me chamou a atenção, ela era alta, tinha pele clara e cabelo longo e me dizia não se sentir amada por Deus, e quando perguntei do por quê, ela havia me dito ter nascido Roberto, mas que nunca se sentiu Roberto e há alguns anos, fez uma cirurgia que converteu seu corpo num corpo feminino, assumindo a partir daí, a identidade de Larissa. Conversei com ela e disse que Deus ama Seus filhos por quem são no coração, e é  isso o que tem que importar, o resto são meros detalhes que facilitam ou dificultam nossa vida neste mundo o qual vivemos. Na presença de Deus, apenas nosso coração importa. Ela chorou e me pediu um abraço. Após o abraço, ela saiu e fiquei pensativo. Ela era uma mulher, e de fato, era abençoada por Deus. Eu tenho os meus demônios, mas acredito em Deus e busco servir a Ele, então sim, consigo reconhecer uma bênção de Deus quando vejo uma.

Mais tarde, quando fui para a casa de padre Matias, conversamos sobre os atendimentos, apenas omiti o fato dessa moça, pois sei que ele é mais tradicional em alguns aspectos, então decidi não compartilhar o que houve com essa moça. A  opinião dele poderia acabar sendo contrária. 

Depois de conversarmos, arrumei minhas coisas  e voltei para o seminário. Ao chegar em casa, coloquei minhas coisas  no meu quarto e fui tomar banho. Quando tirei toda minha roupa e entrei debaixo do chuveiro, me lembrei do almoço e como que de forma instantânea, meu corpo respondeu e ao me lembrar do toque dela... Senti minha glande latejar como há muito tempo não latejava. Há muito tempo tenho tido  um bom controle sobre meus desejos carnais, até então, eu não era a pessoa mais sexual do mundo e nunca tive tantas questões sexuais, na escola eu era considerado bonito, mas eu já sabia que meu caminho seria mais solitário, e minha mãe me castrava muito, colocando em minha cabeça a necessidade de seguir o caminho de Deus. Segundo ela, sou um milagre de Deus, então eu tenho que devotar minha vida a Ele. 

Minha mãe tinha câncer de colo de útero e não poderia ter filhos, isso para ela, foi como a morte, afinal ela sempre quis ter uma casa cheia de filhos. Depois de muito rezar, ela deu a luz a mim. Por isso que ela me chama de milagre de Deus e desde criança, me encaminhou para viver uma vida devotada a Deus.

Minha cabeça então voltou para os olhos expressivos da Elaine e senti como se sua mão tocasse agora a minha pele. E de leve, pude sentir as idas e vindas de minha mão que, na hora eu sentia como se fossem dela, decidi me entregar a fantasia de minha mente, fechei os olhos e permiti que enquanto a água do chuveiro caísse em meu corpo, que as mãos dela me tocassem e seu toque então, tornou-se mais preciso, mais rápido, e eu... ofegante. E foi indo, meu pau inchado, parecia que ia explodir, e ao gozar, que explosão gostosa, era o meu sim a Elaine, e ela nem sabia.

Sim, ejaculei. E como sempre, um sentimento de culpa me acompanhou logo após o prazer, mas desta vez, a culpa tão logo se esvaiu ao me lembrar mais uma vez do toque e do olhar dela. 

Após o banho, eu não tinha certeza se eu deveria me confessar, me deitar ou rezar. Fui então para o refeitório. Eu não queria me deitar, mas também não queria falar com ninguém, nem mesmo com Deus neste momento. Eu queria mesmo, era sair e fumar um cigarro. Nunca fumei, mas agora me parece que seria uma boa opção. 

Infelizmente, como ainda não era diácono, eu não tinha a liberdade de sair sem me reportar ao meu superior. Fui então para os fundos do seminário, um lugar cheio de árvores com dois oratórios que ficavam nos muros que demarcavam os limites do seminário. Os muros eram altos e cobertos de hera, havia nos cantos espadas de São Jorge plantadas desde que o seminário foi fundado.  Foi quando tive a ideia de talvez salta-lo. Eu nunca havia pulado um muro na vida, mas ali, eu sentia que eu precisava de espaço. O seminário estava me deixando claustrofóbico, a casa de Deus estava me deixando sufocado e eu não sabia o que fazer. Havia no muro que ficava ao norte, um oratório grande, o qual seria fácil subir para poder escalar a parede e ir para o outro lado, eu só não tinha certeza se eu conseguiria pular de volta, mas a angústia e a necessidade de sair do seminário por algumas horas sem ter que dar explicações era tão grande, que acabei me entregando a este impulso e subi no muro, me sentei e olhei a rua. Estava quieta, iluminada pelos postes de luz e nem um sinal de vida, nem a direita e nem a esquerda. O seminário ficava num bairro afastado da cidade, num lugar bem tranquilo. Era possível que, se houvesse alguma vida ali, que fosse algo que representasse algum tipo de perigo. Pude observar o latão de lixo que ficava do lado de fora, e eu nem me lembrava da existência desse latão. Era alto o suficiente para me ajudar a pular de volta, quando eu voltasse. Pulei então, e sem destino, comecei a andar para a direita e ao andar, comecei a me lembrar da Elaine. Ninguém nunca me fizera sentir o que ela me fazia e eu não sabia como lidar com isso.

O conselho do padre Matias fora claro, "viva antes de você fazer os votos perpétuos". Eu não sei se ele tinha razão. Talvez tivesse. Nem sei direito qual os limites do que ele quis dizer com isso.

Mas isso não seria ir contra os mandamentos de Deus? Tantas questões se passavam agora pela minha cabeça. Quanto mais eu caminhava, mais dúvidas surgiam. Quando me dei por mim, estava agora perto da avenida principal, havia alguns poucos carros passando, "de fato, a cidade que nunca dorme" pensei. Foi quando uma propaganda me chamou a atenção. 

Era uma pichação com várias cores, provavelmente feita por algum hippie, dizendo "só se vive o hoje, então viva com intensidade".

Li a frase em voz alta e comecei a rir, gargalhar, quase histérico. Afinal, o que eu deveria viver com intensidade, meu sacerdócio ou minha paixão? Será que eu não poderia viver os dois juntos? Estou apaixonado por Elaine, isso é inquestionável, e também sou apaixonado pelo meu Senhor, então eu realmente não sei o que fazer. Elaine me daria os prazeres terrenos, meu Senhor, os prazeres eternos, então a pergunta permanece, o que devo fazer? O que devo viver com intensidade?

O relógio digital de um quadro de propaganda de um restaurante novo, dizia que agora era quase três da manhã e decidi então, voltar ao seminário, pois acordamos ás 5h30min para nossas orações iniciais, logo, o dia seguinte seria muito sonolento para mim. 

Consegui pular o muro de volta e fiquei um tempo no jardim, com receio de ter feito algum barulho, então depois de alguns minutos, passei no banheiro e acho que então, encontrei a resposta que eu buscava.

Ao entrar no banheiro, ouvi alguns sons, pareciam gemidos e em um dos boxes, haviam dois seminaristas. Não consegui reconhecer quem eram, mas certamente eles não estavam orando. Não era da minha conta, eu não era juiz nenhum para decidir quem deveria saber ou não daquela situação, então apenas usei o banheiro, dei descarga, a qual, o barulho fez os gemidos pararem na hora, e segui minha vida. 

Deitei na minha cama, virei para o lado, fechei os olhos, rezei a Deus pedindo orientação e então, dormi.