Capítulo 2: Bullying se pratica até fora da escola

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No dia seguinte, Gintoki vestia seu velho yukata escuro e puído que levara a noite toda e mais um pouco para secar após uma lavagem caprichada como nunca aquela roupa tivera. Lavara antes de dormir sem roupa no futon e coberto com os cobertores de forma a não passar frio como passara nos últimos anos até a véspera. A roupa do corpo era, obviamente, a única muda que possuía e Otose, evidentemente, não possuía uma roupa masculina para lhe ceder.

Se quisesse uma roupa mais quentinha e ao menos decente, realmente seria interessante aceitar a oferta da velha e trabalhar no bar. Ninguém queria um samurai nesses últimos anos, afinal, as espadas foram banidas em todo o país (exceto autoridades) após a guerra. Se quisesse sobreviver e deixar de passar frio e fome, além de espantar os fantasmas que o rondavam após deixar os campos de batalha, deveria realmente se reinventar.

Prendeu a faixa à cintura, fechando assim seu quimono. Encarou-se no espelho do banheiro, que refletiu seu rosto. Os cabelos limpos revelavam um prateado mais intenso, mas pensava em dar-lhes um novo corte. Ele não era mais aquele combatente dos campos de batalha, que só entrara na guerra numa tentativa fracassada de salvar a pessoa que lhe era mais preciosa. Por um momento, enxergou naquele reflexo o jovem com olhos ferozes que usava uma bandana branca na testa e se vestia todo de branco, onde era facilmente visto o vermelho das inúmeras marcas de sangue dos inimigos que atacava vorazmente com sua katana afiada. Aliás, fora aquela sua aparência que lhe rendera o apelido de Shiroyasha, o Demônio Branco.

Mas agora o Shiroyasha de olhar feroz desapareceria de vez, e restaria apenas o homem cujo rosto estava visivelmente melhor do que quando olhava para as vitrines ou poças de água em suas andanças. Um homem que precisava se reinventar, pois só pensava em viver um dia de cada vez.

O duro era encontrar coragem para encarar o vento frio durante a descida de escada até o bar da velhota, mas a necessidade era maior e a sua promessa deveria ser honrada. Queria ao menos ter um haori para poder vestir por cima do yukata e sentir menos frio.

Conseguiria roupas decentes se trabalhasse para a velha e recebesse seu salário de meio-período. Teria o que vestir e o que comer... E naquele momento sentia falta de comer coisas de que gostava, como doces, por exemplo. Leite de morango... Chocolate... Pirulitos... Manjus... Dangos... E até um parfait, por que não?

Parou de fazer suas divagações quando viu que estava à porta do bar. Sem fazer cerimônia, o albino abriu a porta corrediça e entrou. Avistou Otose por trás do balcão, que lhe disse:

― Daqui a duas horas abrirei o bar. Suponho que seja capaz de limpar este lugar, não é difícil.

― Faço isso pela metade do tempo. – Gintoki disse enquanto enfiava o dedo mindinho no nariz para limpá-lo e depois mandava a caquinha para longe.

Ele usou uma espécie de tira de tecido que se cruzava nas costas, que ergueu as duas mangas do quimono, para facilitar seu trabalho. Começou a limpar os móveis, nos quais quase não havia poeira, mas sim farelos de algum tira-gosto e a meleca resultante de bebida derramada. Sem se importar com a água fria, o albino passou a começar a limpar o chão. Agachou-se para passar o pano no chão, usando suas forças revigoradas após um descanso como nunca tivera e refeições decentes depois de muito tempo.

Quando deu o horário em que começava o funcionamento do bar, o albino acendeu a plaquinha luminosa ao lado da porta e, conforme solicitado por Otose, deixara a porta corrediça fechada. O frio seguia reinando absoluto no inverno, ameaçando a expectativa por clientes naquela noite. O que consolava um pouco a dona do bar é que naquele momento não caía neve, e isso significava que poderiam aparecer pelo menos os clientes mais antigos e fiéis. Gatos-pingados ainda eram melhores do que nada.

Crônicas de um samurai desempregadoOnde histórias criam vida. Descubra agora