Comida e Vizinha

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— Mãe olha um mendigo. — uma garotinha passou apontando o dedo em minha direção.

Como se não bastasse a humilhação que eu estava passando, ainda tinham um público para rir da minha situação deplorável. Em todos esses vinte e sente a anos de vida nunca me senti tão esculachado e ignorado.

Eu estava jogado no chão do corredor com a roupa rasgada, sentindo minha barba tocar no estômago devido aos mil anos que fiquei ali abandonado com o coração partido. Na verdade foram só duas horas, mas senti como se fosse mil anos pela dor do desprezo.

Sakura me traiu de uma maneira cruel e triste. Fui apunhala-do pelas costas, ela jogou todo amor que cultivei por anos fora como se eu não valesse uma balinha.

— É só o vizinho gostoso do 72 filha. — a mulher me mandou uma piscadela levando a filha para o elevador.

Que ousada. Mas ao menos alguém me achava gostoso.

— Vou falar pro papai mamãe.

— Gostoso? Eu quis dizer feioso. — a mulher riu nervosa me fazendo revirar os olhos.

Bufei ouvindo a festa rolando no apartamento da frente. Tocava todas as músicas da galinha pitadinha, até patati-patata e xuxa. Sakura e Boruto estavam se divertindo e fingindo que eu não existia. A gente cria a criança com todo amor e carinho pra quando ela crescer alguns centímetros fugir de casa e nos abandonar.

Moleque traíra. Como eles tinham a audácia de dar uma festa enquanto eu estava aqui abandonado?

De repente a porta foi aberta e eu me levantei rapidamente vendo Sakura aparecer com Boruto nos braços, os dois usavam óculos escuros e cordões coloridos.

— Boruto está chamando você, ele disse que você é um vagabundo, mas é gente boa. — a mulher me olhou com seriedade enquanto mastigava um pepino.

Onde diabos ela achou aquilo?

— Meu garotao. Papai adora você. — abri os braços olhando emocionado para Boruto que me deu um sorriso pilantra.

Ele estava aprendendo a virar gente comigo, eu estava fazendo um belo trabalho como pai. Já consigo ver meu nome pelos jornais e revistas como melhor pai do ano.

— Entre tem um pepino pra você também. — Sakura me deu espaço e eu entrei no apartamento barulhento.

Observei os piscas piscas por toda parte me sentindo em uma balada infantil.

— Eu não gosto de pepino. — respondi fazendo uma leve careta.

— Mas é abusado. Vai comer o pepino sim. — Sakura jogou um pepino na minha cabeça e colocou Boruto no sofá.

Passei a mão no local dolorido, observando o menino ficar entretido assistindo as galinhas dançando na televisão e Sakura caminhar para cozinha ignorando minha existência.

Geralmente as mulheres quando me encontram já chegam abaixando minhas calças para dar um boquete. Sakura joga pepinos na minha cabeça e me ignora, por isso ela era especial.

— O que eu fiz pra você não gostar de mim? — perguntei a seguindo, vendo a mesma organizar um monte de comidas em cima de uma grande mesa.

Comecei a babar olhando para aquele tanto de comida. Além de linda ainda cozinha, Sakura era pra casar e ninguém tirava isso da minha cabeça.

— Você é um sem vergonha abusado e outras coisas a mais, quer que eu faça uma lista? — disse sem interesse colocando uma jarra de suco na mesa.

Eu não era um sem vergonha. Sou um cara humilde, de família e trabalhador. Como algumas mulheres no fim de semana e algumas nas quartas mas isso não me torna um vagabundo.

Pai por enganoOnde histórias criam vida. Descubra agora