Prólogo - Mau Presságio

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O último dos homens caindo de bêbados que sobrou presente na humilde taverna, – inteiramente tomada pela tripulação de Black depois de uma batalha nada desafiadora –, corria tropeçando em seus próprios pés para longe de lá, intimidado pela presença da mulher que declarava em alto e bom som, junto aos seus marujos, a posse da pequena ilha mercante que acabara de invadir. Portando sua espada em uma das mãos e uma garrafa de rum quase vazia na outra durante o processo, a capitã se mostrava orgulhosa de seu feito, afinal, mesmo que aquilo já tivesse se tornado uma rotina há anos, – e que tanto a ilha quanto a conquista da mesma não chegassem a entrar na lista de melhores histórias a se contar – a adrenalina da luta, por pior que essa fosse, nunca era demais. E apesar de não ser grande, essa era mais uma de suas vitórias, que agregava outro local conquistado à sua lista de domínios.

Era um bom motivo para se vangloriar, no fim das contas.

— O fato de não ter havido um único homem ou mulher suficientemente capaz de me entreter em uma batalha nas três últimas ilhas que saqueamos me entristece. O nível das pessoas decaiu muito... — a voz dela soou exageradamente dramática, o que fez seus marujos rirem. — Estão rindo de que? Eu não estou brincando!

Uma feição séria imediatamente tomou conta de sua expressão, ao mesmo tempo em que a lâmina foi apontada em ameaça para o grupo de piratas reunido em uma das mesas do local. A marra, porém, logo se desmanchou em uma risada suave que se rendeu à da tripulação, a qual não havia parado de rir mesmo com sua repreensão quanto ao fato.

— Certo, seus cães sarnentos, vocês estão perdendo todo o respeito e estão precisando de uma lição! Mas hoje eu vou deixar passar, afinal, estou de bom humor. Depois eu penso em punições adequadas — as botas já gastas pelo tempo e tantas batalhas travadas deixaram de tocar o chão quando a mulher tomou um impulso para se sentar no balcão de madeira, que rangeu com o ato. Ela então guardou sua espada novamente na bainha e deu o último gole no álcool restante na garrafa, que foi posta ao lado instantes depois de finalizá-lo. — Não ousem se acostumar com isso.

Ao relaxar a postura e deixar sua atenção vagar para outra coisa além da comemoração de seus marujos, de rabo de olho, Kiara notou uma de suas imediatas adentrando o lugar pela porta dos fundos e se aproximando de onde ela estava sentada. Esse fato fez com que a mais velha abrisse um pequeno sorriso.

A garota, porém, não detinha a mesma expressão leve e feliz que a capitã exibia; na verdade, seus olhos baixos e cenho franzido indicavam certa apreensão.

— O que foi, Gemma? — os olhos atentos para a mais nova analisaram sua expressão, procurando por algo ali escondido. — Não deveria estar bebendo e festejando com o resto da tripulação?
— Faz tempo que estamos longe de casa — um suspiro preocupado escapou de seus lábios ao dizer em voz alta o que lhe passava pela cabeça, e assim, não ficou difícil perceber o que estava errado: aquela frase trazia muito mais significado do que aparentava.
— Bom, qual é o problema? Não é como se um dos comerciantes da nossa ilha ou tripulantes rebeldes fossem se revoltar e incitar um motim — Black disse em tom bem humorado para amenizar o clima pesado que o comentário trouxe, mas ela sabia que deveria ouvir o alerta.

Gemma nunca se enganava em suas intuições. Pelo contrário; elas já haviam salvado a tripulação mais vezes do que a mulher poderia contar.

— Eu só... estou com um mau pressentimento — os olhos claros e firmes da garota sustentaram os da capitã para reforçar sua posição, não demorando com isso a fazer a mulher ceder e escolher dar ouvidos ao seu alerta.
— Partiremos de volta essa noite, então. Deixe os demais cientes — uma vez que a decisão foi tomada, os ombros da garota relaxaram, assim como sua expressão. — Obrigada por me avisar.

Sea Mission [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora