BOA NOITE

8 1 0
                                        

O relógio bateu três horas da manhã, mas na verdade, faltava poucos minutos para bater quatro. Quem acorda esse horário é o papai, daqui cinco minutos seu despertador vai tocar um som irritante que acordaria o resto da casa se ele não fosse ágil e rápido para desligar, mesmo que estivesse dormindo e o sono fosse tão de pedra ele odiava o barulho do relógio tanto quanto qualquer um, talvez algum dia ele pedisse ao seu querido filho que lhe ensinasse a como colocar música, afinal, quando ele não tinha que trabalhar mas seu filho tinha que estudar, ele escutava uma musiquinha da banda favorita do garoto tocar para que acordasse e ele acordava até que de bom humor, muito bom humor. Com certeza era a musiquinha.
Um segundo e o relógio cantou. O homem velho rapidamente colocou a mão sobre o despertador e bateu com tanta força que achou que tivesse quebrado o celular, mas não, não tinha quebrado. Ele se levantou, cansado e de péssimo humor. Olhou a mulher na cama, ainda dormia como um anjo. Ele a beijou de leve na testa antes de caminhar até o banheiro com as luzes apagadas. Apenas quando chegou no banheiro acendeu as luzes e trancou a porta. Ligou a torneira e a água saiu fazendo um barulhinho. Colocou suas mãos na água fria e jogou no rosto. Ele sempre fazia isso pra vê se acordava, mas não acordava. Fechou a torneira e a água parou de escorrer. Quando ele olhou no espelho, teve uma surpresa, não era a sua cara rabugenta, barbuda e molhada que ele via, era apenas eu sorrindo. Seus olhos saltaram e agora ele parecia mais acordado. Deixei meus braços negros atravessaram o espelho e o agarrei no pescoço.

— Volte a dormir — eu disse. — Volte a dormir.

E ele adormeceu, caiu no chão como lixo e as luzes do banheiro se apagaram.
O relógio bateu quatro horas da manhã, mas faltava poucos minutos para bater cinco. Quem dormia como um anjo na cama de casal era a mulher, diferente de seu marido, ela demorava mais para desligar o despertador, mas o barulho não era tão irritante, era uma musiquinha calma e também não era alta. Na verdade, a música a fazia ter vontade de dormir outra vez, principalmente pra quem tem que tomar remédios que a ajudem a dormir, para impedir sua maldita insônia.
Um segundo e o relógio tocou a musiquinha, bem baixinha e calminha. Ela ficou um tempo parada ainda de olhos fechados antes de se levantar, se espreguiçar com delicadeza e pegar o celular para desligar o despertador. Quando fez isso, leu algumas mensagens de bom dia e as respondeu. Então, finalmente, se levantou da cama, calçou suas pantufas cor de rosa e saiu andando com os cabelos lisos e loiros grudados na testa. Andou no escuro mas quando chegou a cozinha acendeu as luzes, como de costume colocou o café para fazer, não demorou muito pra sentir o cheiro da bebida se espalhando por toda a casa. Ela se perguntava se realmente sofria de insônia ou se bebia café o suficiente pra ficar acordada uma vida inteira. Ela pegou sua xícara favorita que estava escrito "você é a melhor mãe do mundo" e um coração enorme. Sabia que não era a melhor mãe do mundo mas se o filho achava isso então ficava feliz e era o suficiente. Ela deu um grande gole no café, não se importando muito se tinha queimado a língua. Se importava tão pouco que nem me viu chegando por trás, mas quando me viu, seus olhos saltaram de terror como o do marido e a caneca cheia de café foi parar no chão, quebrou em pedacinhos e ela gritou de espanto e também porque o café estava queimando seus pés. A prendi pelos braços e ela continuou sapateando com os pés.

— Volte a dormir — eu disse. — Volte a dormir.

E ela adormeceu, voltou a dormir como um anjo e seu corpo todo ficou sujo de café quente. As luzes da cozinha se apagaram.
O relógio bateu cinco horas da manhã, mas faltava pouco para bater às seis. Quem dormia todo torto era um garotinho de onze anos e ele babava de forma nojenta no travesseiro. O garotinho também era ágil como o pai, apesar da sua música favorita tocar no despertador, mas depois de desligar ficava um tempo deitado enrolando como a mãe.
Um segundo e não demorou muito para um rock and roll barulhento tocar e também não demorou muito para parar. Ele olhou em volta e estranhou que todas as luzes estivessem apagadas porque sua mãe ainda estava em casa quando ele acordava. Já estava de saída mas estava lá e se despedia do filho sempre com um bejinho estourado na testa e dizia "eu te amo, querido, boa aula."
Ele pensou, a mãe só acorda mais tarde quando tem que ir ao médico, então talvez tenha sido isso.
O garotinho se levantou resmungando alguma coisa, com certeza não queria sair das cobertas naquele frio e muito menos queria ir à escola.
Ele acendeu a luz do quarto, abriu o guarda roupa e começou a colar o uniforme branquinho do seu colégio. Quando terminou penteou os cachos loiros. Terminando, ele encarou a porta do quarto aberta um tanto assustado. As crianças percebem mais rápido, por isso são tão inteligentes, mas os adultos são lentos. O garotinho, já assustado, colocou os sapatos e saiu do quarto. Acendeu as luzes do corredor e foi primeiro no quarto dos pais ver se sua mãe estava lá, mas ela não estava não, a cama se encontrava vazia e bagunçada. Andou até o banheiro, ainda assustado mas precisava fazer xixi. Quando chegou lá, encontrou o pai deitado torto no chão, a boca aberta babando o que não era saliva e sim sangue e os olhos totalmente branco. Gritou e correu até a cozinha, aonde também encontrou a mãe no mesmo estado só que ensopada de um líquido preto. De novo ele gritou, com os olhos pulando quase para fora de horror e saiu para a sala. Procurou as chaves de casa para sair correndo dali e pedir ajuda mas não as encontrou, elas não estavam aonde ele tinha deixado antes de ir para cama dormir.

— Está procurando isso? — balancei as chaves e elas bateram uma nas outras fazendo barulho. Ele olhou para trás, olhou para mim, com o rosto mais cheio de horror do que quando viu os pais apenas dormindo. — Não seja teimoso, isso é hora de criança estar em pé? Volte a dormir.

Deixei que as chaves caíssem no chão e puxei o garoto pelos cachos. Ele gritou e gritou por alguns segundos. Crianças sempre dão mais trabalho, me pergunto porque todas elas detestam dormir.

— Volte a dormir! — gritei. — Volte a dormir!

O garotinho caiu no chão e voltou a babar como um bebê. A casa toda caiu em um grande silêncio pesado, eles estavam dormindo para sempre. Apaguei todas as luzes da casa e deixei que dormissem em paz.

— Boa noite, querida família.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Nov 20, 2020 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Em nome do diaboOnde histórias criam vida. Descubra agora