— Você já foi a um estádio de futebol? — Julian quebrou o silêncio incômodo que se estalara entre ele e a futura mãe de seu filho. Como era estranho pensar àquilo. — Tipo, é a Alemanha e nós temos milhares de times, mas nunca se sabe.
— Não, nunca fui. — Ela guardou o celular em sua bolsa, ignorando o processo que devia ler, e rindo levemente da cara de espanto dele. — Os Baasch não são fãs de futebol. Não está no nosso sangue.
— E eles são fãs do que? — Ele tombou a cabeça para o lado, o boné preto fazendo sombra em seu rosto bonito.
— Tênis. — Ela deu de ombros, sem se importar com o olhar julgador. — Pulsos fortes, sabe? — Ela chacoalhou a pulseira de berloques presa ao braço esquerdo no ar.
— Sei. — Ele olhou para o outro lado, escondendo o sorriso inconveniente que teimava em aparecer em seus lábios. Como podia ter qualquer resquício de memória da noite que passara com Margot, nem ele mesmo sabia. — O que acha de ir a um jogo comigo?
— E ficar naquele lugar sozinha? Muito obrigada, mas não. — Tentara ser educada, no entanto, sabia que usara um tom mimado em sua voz. — É que, você vai jogar e não quero ficar sozinha no meio de pessoas que eu nem mesmo faço ideia de quem são.
— Estou fora por lesão. — Entortou os lábios. — Então, posso afirmar que lhe farei companhia o tempo todo.
— Vou pensar, ok? — Ele assentiu.
Porquê aquele cara, que ela via pela terceira vez ao vivo e em cores, havia a convidado para um jogo de futebol seria estranho se não fosse a situação ainda mais estranha e constrangedora em que se encontravam. Julian era um cara legal, pelo menos uma vez por dia a mandava mensagens perguntando se estava bem e se precisava de alguma coisa, ela sempre dizia sim para a primeira e não para a segunda, mesmo se estivesse aos prantos em um canto escuro de seu apartamento. Além daquela pouca comunicação, não havia muito para ser dito, afinal, por que conversar enquanto podem estar separados, se estariam unidos para o resto de suas vidas em alguns meses?
A questão era que Margot não queria aquela proximidade. Ela não precisava de mais um problema em sua vida e ter um filho com um desconhecido já era um grande demais para suportar, imagine então, gastar horas de seus dias com alguém como Julian. Ele tinha uma coisa inexplicável que se extendia para além das fronteiras do belo. Era seu jeito, o modo como suas mãos passavam pela lateral de seus cabelos finos e loiros, como coçava a nuca e as vezes a parte de trás das orelhas, era como seus olhos azuis eram tão penetrantes que pareciam ser sua alma e saber de todos os seus pecados, e principalmente, como seus labios cheios se desenhavam em um sorriso barbaramente sacana, como um dos lados se erguia mais do que o outro e uma covinha aparecia em uma das bochechas. Era tão charmoso quanto o próprio Don Juan.
Caras como Julian Brandt eram perigosos, e Margot preferia manter distância deles. Não queria estar perdidamente apaixonada a ponto de desistir dos próprios sonhos e objetivos, não queria ser manipulada por um amor incontrolável. Por isso, seu único amor era sua profissão, era o que a mantinha sã, o que a dava horas e horas de liberdade de seus pensamentos e de uma tristeza inevitável que sempre atingia quando estava sozinha e ela era uma mulher sozinha. Ela se cuidava, se entrentia e se culpava por erros do passado, presa em sua bolha de sabão que sabia poder estourar a qualquer momento. Era apenas Margot Baasch contra o mundo, sem ninguém.
— Margot Baasch. — A voz indubitavelmente feminina e levemente cansada, a fizera se levantar da cadeira, desconfortável da sala de espera daquela clínica, rapidamente. Apertou a bolsa em seus ombros e caminhou um passo a frente do jogador. — Margot, farei algumas perguntas sobre seu estilo de vida e preciso que seja o mais sincera possível, ok? Você é o pai, certo?
Após uma breve confirmação e dispensa de apresentações da parte dele, um interrogatório quase sem fim começará. Desde sua alimentação a possíveis doenças preexistentes em ambas as famílias, se já havia passado por alguma cirurgia ou outra gravidez. Quando a medica de fato se apresentara, doutora Anne Schmidt, Brandt e Baasch já estavam exaustos de respoderem perguntas e esperavam estarem livres em breve, mas passaram outras meia hora ouvindo sobre os principais cuidados que deviam tomar e a imensa lista de exames que precisaria realizar. A loira prestara atenção em tudo, a médica de fato conseguia a transmitir um pouco de confiança e calma.
— Pode deixar seu casaco aqui, abra os botões da calça e levante a blusa, por favor. — A advogada assentiu, deixando o sobretudo preto sobre a cadeira e seguindo as ordens dadas.
Elevara a blusa de algodão branca a altura dos seios, puxara sua calça o mais baixo possível, expondo a barriga sem grande mudanças aparente. Não era como se fosse a primeira vez que se espunhava tanto na presença do meio-campista, mas era a primeira vez que o fazia sóbria e aquilo definitivamente não era comum. Beliscara o interior de suas bochechas quando sentira o gel extremamente gelado em contato com sua pele quente e logo podia ver as imagens embaçadas fornecidas pelo transdutor. Não havia muito para se ver até o momento, apenas uma manchinha no que Margot chamou de vácuo, também conhecido, como líquido amniótico.
Julian estava sem reação. Olhava para a tela da TV como se observasse a Mona Lisa e tentasse procurar um significado para seu sorriso, entretando, o único sorriso que parecia misterioso naquela sala era o dele. Nem mesmo ele sabia o que sentir, era um misto de sentimentos: felicidade, medo, amor e preocupação. Sua mão procurou pela de Margot em um ato quase involuntário, sorrindo rapidamente para a mulher, antes de voltar a virar seu banquinho para a tela em que mostrava seu filho, talvez, fosse filha.
— Vou contar para minha família essa semana, me desculpe se algum deles for atrás de você. — O garoto de Bremen coçou a nuca, rindo nervosamente quando pararam próximos a porta do local. — Minha mãe com certeza vai atrás de você!
— Tudo bem, você pode dar meu número a ela e dizer onde eu trabalho. — Apesar de, por quase sua vida inteira, ter sido uma boa garota, Margot nunca fora a mais sociável e as mães de seus antigos namorados custavam a gostar dela, ela só podia imaginar como séria terrível conhecer a mãe do — bem, ela ainda não tinha um nome para chamar Julian. Pai do meu filho parecia um tanto quanto intolerável naquele momento. — Eu preciso mesmo ir, pode ficar com as imagens para mostrar a eles, eu tirei minhas próprias fotos.
— Certo, se precisar de qualquer coisa você sabe que é so me ligar. — Ele comentou, enquanto passavam juntos pela porta automática, sentindo o vento frio do meio de feveiro, atingir-lós. — Não exite em pegar o telefone, Margot, falo sério!
— Não se preocupe, se precisar prometo ligar. — Ela não ligaria, mas aquilo era o suficiente para ele seguir seu caminho. — Até logo, Julian.
— Até, Margot. — Ele acenou de volta, observando-a fazer seu caminho até a Mercedes estacionada a poucos metros.
Na comodida dos aquecedores de sua Land Rover novinha, o jogador encarava o compilado de fotos em suas mãos como se fossem joias raras. Um onda de preocupação o atingia, o que será que seus pais diriam? Eles gostariam de Margot? Como os dois — que não possuiam intimidade alguma — criariam um filho juntos? Como ele devia se preparar para aquele momento? Como ele devia saber educar uma criança? Como saberia se estava fazendo um bom trabalho? Como teria certeza que não ferraria a vida daquele pobre bebê que possuia o azar de o ter como pai?
Eram tantos questionamentos e quase nenhuma resposta, mas seus medos não o impediriam de continuar ali com Baasch. Pelo menos seus pais ficariam orgulhosos por não terem criado um canalha, ele estava assumindo suas responsabilidades e dando seu melhor em meio a confusão que estava sua mente. Ninguém dizia que receber uma noticia daquelas e ter que repensar sua vida inteira da noite para o dia, era fácil, mas aos poucos seus pensamentos se encaixavam.
Não que não imaginasse que algum dia formaria uma família, mas ele achava que conheceria alguém, se apaixonaria e então, depois do casamento, eles poderiam conversar sobre o assunto filhos. Brandt gostava de pensar que era um homem romântico, mesmo que sua ultima namorada discordasse vemente e que, em algum momento de sua vida esbarria no seu grande amor, ajudaria a recolher os livros, se ofereceria para pagar um café e buum, apaixonados para a vida toda. Certamente, agora viveria um clichê barato Hollywoodiano e ele nem mesmo era o diretor da decadente comédia romântica.
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SERENDIPITY | JULIAN BRANDT
Fiksi Penggemar"Serendipity é uma palavra em inglês que significa uma feliz descoberta ao acaso, ou a sorte de encontrar algo precioso onde não estávamos procurando."