duas noites sem dormir, a parede branca, o teto de madeira, a exaustão que engole minha sanidade, espera, são quatro e trinta e sete da manhã, uma taça de vinho talvez não faria mal, um vinho barato, um mundo que acontece enquanto eu não, meu deus será que a vida é só isso?
os dias preguiçosos que se desdobram, meu ceticismo inautêntico, a ânsia de existir
eu te pareço louca? eu te pareço insana? não responde
filha de vários colapsos mentais, me falta tanta coisa
a caneta sem tinta, as paredes que contam histórias tristes demais, Schubert tocando no fundo
só escrevo pra quem não existe mais
só escrevo sobre perda, decadência,
encontro motivos para chorar, cuspo as palavras da boca como se fosse sangue, minhas palavras não atingem nem a mim mesma mais
limpo minhas feridas com sal, oro para que um desastre me atinja, quero beirar o absurdo
te pareço louca? te pareço insana? não responde
o desinteresse branco, a cidade cinza e deprimente, a vida que faz-se melindrosa
tola, imprudente, meio maníaca
o medo hediondo de morar em mim, de estar só comigo mesma
não sou oceano, não sou continente indissolúvel
meu deus, será que a vida é só isso?
só me resta esse corpo
esse corpo moído de cansaço, incoerentemente frágil, quebrável
me perco dentro de mim e vou caindo na loucura na apatia no esquecimento na indiferença
limpo minhas feridas com sal, finjo que entendo o porque
me resta o silêncio, me resta esse corpo
olha de novo, te pareço louca?
te pareço insana?
não responde
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tudo o que a boca não diz
Poetry[um tributo a todas as coisas que me fazem querer cuspir sangue e chamar isso de poesia]