- Não acredito que ela fez isso! – Gizelly ria audivelmente sentindo sua barriga doer e os olhos lagrimarem.
- Juro que fez! O cara ficou tão mal que passava as noites aqui se enchendo de cerveja e resmungando que nunca mais iria tomar os vinhos que a vinícola dela produzia – Luiza falou rindo com a amiga – Ela até tentou conversar com ele, mas o menino mogli não aceitou muito bem o término, principalmente porque foi em frente à praça, onde todo mundo viu, e ainda mais com a revelação de que ela gosta de mulher. Foi o assunto da cidade por semanas, só faltou anunciarem na rádio local.
- Um cego perceberia que a Marcela ama jogar para esse time, até a mãe dela já sabia disso há anos e nem acreditava nesse relacionamento, pelo o que Má me contava.
- Não sei como a Má aguentou – Tomou um gole da cerveja em sua frente – Sério Gi, o cara é insuportável! Você não o conheceu porque ele chegou à cidade logo que você saiu, eu hein já pensou lidar com isso? Deus me livre, nem paciência para homem eu tenho mais, só finjo.
Gizelly riu e concordou, com ela era a mesma coisa. Estava feliz em poder contar sobre isso com Luiza, que já sabia de sua sexualidade há muito tempo e compartilhava da mesma sensação e experiência.
Luizera, como era chamada por muitos da cidade, estudara consigo na escola e desenvolveram uma ótima amizade, com ideologias parecidas tinham um companheirismo de ser invejado e até Marcela, que também fazia parte do trio, sentia um pouco de ciúmes delas, mas era apenas bobagem, pois as três sempre foram unidas igualmente.
Perdeu a conta de quantas cervejas já tinham bebido enquanto atualizavam as novidades.
Era definitivamente muito bom voltar a conversar com a amiga, reconhecia o quão a mentalidade de muitos cidadãos de Velho Sítio era atrasada, por isso também tinha muitos receios em voltar, mas ficava feliz pela amiga ter se desprendido desses pensamentos e ter se libertado das amarras que lhe eram impostas. Dessa forma, podia confiar em Luiza para contar tudo e falou sobre o verdadeiro motivo em estar de volta, o que deixou a gerente do bar contente por saber que a jornalista estava novamente realizando um sonho.
Confiava em Gizelly com todo o seu coração, por mais que não pudesse negar que havia ficado chateada com o seu afastamento, entendia e respeitava os seus motivos, e tê-la de volta era bom demais. Por isso, ofereceu-se para acompanha-la até a floricultura da avó como um apoio emocional caso precisasse, mas Gi negou afirmando que era algo que devia fazer sozinha.
Definitivamente, Gizelly não era mais a menina alegre que escrevia poemas e pregava nos quadros de aviso do colégio para que todos pudessem ler. Gizelly cresceu e com isso veio a tristeza e a melancolia por carregar diversos fardos, deixou de acreditar no amor fora dos livros, um dos motivos dos quais amava escrever, achava que assim poderia criar um mundo onde tudo era possível e em que seus sentimentos valiam a pena.
No entanto, algo dentro de si ainda insistia em dizer que deveria ter esperança, mas por enquanto apenas vivia imersa aos acontecimentos do acaso, era como viver sendo guiada pelas sugestões simples do destino sem ter que correr atrás de algo. Sabia que um dia teria que sair dessa inércia, só não sabia que o momento estava mais próximo do que imaginava.
Conversou com Luiza por mais algumas longas horas, o céu já denunciava que a noite havia chegado com a cor azul escura sem nuvens. Trocaram muitas ideias e compartilharam novidades, não saberia medir o quão bem estava com isso, por muitos dias achou que seria uma péssima decisão voltar à cidade, mas agora já enxergava o contrário. Não recordava qual tinha sido a última vez que havia se divertido tanto em apenas um diálogo, e reconhecia que esse era um dos mais diversos dons que Luiza possuía. A amiga tinha o melhor senso de humor e conversar com ela era a melhor coisa que poderia fazer, e agora gostaria de voltar a manter contato com ela.
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The One That Got Away - GIRAFA
RomanceGizelly e Rafaella se conheceram crianças enquanto moravam na cidade pacata de Velho Sítio. Um grande amizade que se perdeu no tempo. Com tatuagens iguais e memórias compartilhadas o companheirismo ficou no passado. Hoje, Bicalho luta para escrever...