01. Mudanças

240 24 77
                                    

Durante toda a viagem de trem, Alicia ficou ponderando sobre os motivos que levaram seus pais a enviarem-na para a cidade. Normalmente, não acharia ruim encontrar sua tia predileta, mas ela sabia em partes o que aquela viagem significava, e por isso estava um pouco aborrecida.

Nem o fato de seu cabelo castanho estar preso no estilo de trança que tanto adorava era capaz de melhorar um pouco sua perspectiva sobre aquele dia.

Alicia ouvira seus pais discutindo sobre seu futuro, demonstravam-se preocupados com sua atitude quieta e reclusa que desenvolvera ao longo dos últimos anos. Acomodada era a melhor palavra para descrever.

Porém, aquilo não era um problema aos olhos de Cici. Ela gostava da ideia do conforto e do conhecimento de seus arredores, o aconchego que isso trazia. Sua rotina na propriedade de sua família era determinada, seguida com cautela, e aquilo acalentava Alicia, seja para saber que passaria uma parte da tarde lendo ou tocando algum instrumento antes de suas aulas.

A realidade incontestável era que mudanças bruscas a assustavam, sendo a noção do desconhecido razão para recuo. Ela vivia um dia de cada vez, conhecendo seus horários por inteiro.

Alicia tinha aulas com bons professores, possuía bons conhecimentos de mundo já. Para ela, isso era aventura suficiente. No entanto, seu pai afirmava ter sentido falta de algo, e foi aí que ele decidiu colocar a própria irmã como algum tipo de auxiliadora na educação de Cici.

Não adiantou Alicia tentar convencê-lo do contrário, sua viagem estava certa. E, pela primeira vez desde que tinha oito anos, Cici se sentiu como uma criança emburrada quando foi colocada naquele trem, sendo separada de seu brinquedo favorito e obrigada a conviver com a informação de que não o veria por um bom tempo.

Uma pergunta que Alicia estava se fazendo constantemente agora era: Se o pai sempre afirmava que a admirava da forma que era, por que insistir em mudá-la? Ela não estava sendo o suficiente?

Essas reflexões aumentavam seu mau humor. Até quando sua tia a buscou na estação, suas sobrancelhas ainda pareciam estar formando um vinco, pois a primeira coisa que Margot disse, depois que ela elogiou como os olhos azuis de Alicia combinavam com o vestido branco dela, foi:

— Acho que deveria ter trazido um chá para esse estresse seu, Cici. — o comentário pegou Alicia de surpresa, e sua tia conseguiu fazê-la rir um pouco.

— Desculpe, tia Maggie, eu fiquei um pouco... Enjoada com o balançar do trem. — a tia sorriu satisfeita com o apelido, e encaixou o braço da sobrinha ao seu enquanto cada uma carregava uma das malas de Cici, os vestidos das duas balançando em harmonia — Você tem um chá para isso também?

— Pode apostar que sim, vamos te colocar de volta nos trilhos rapidinho. — Margot riu alto do próprio trocadilho, a gargalhada contagiando Alicia a sacudir a cabeça enquanto sorria, um pouco mais leve.

Elas caminharam para fora da estação, sendo apresentadas à cidade que estava em seu auge de movimentação naquela manhã. Pessoas andavam de um lado a outro, ou carregando sacolas de lojas ou indo resolver alguns negócios e uma carruagem ou outra passava pela avenida.

Alicia se surpreendeu com tanta vida. Ela conhecia a cidade de algumas outras visitas, mas estava ali agora com uma nova percepção, a de que aquele seria seu lar por algum tempo. De repente, o medo da mudança se arrastou por sua pele, e um nó se formou na garganta, lembrando-a das perguntas que fizera a si mesma.

Das perguntas que provavelmente possuíam respostas afirmativas.

Parecendo perceber o súbito desconforto, Margot sorriu para a sobrinha, chamando a atenção para si, ofuscando tudo ao redor.

Cubo de Açúcar ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora