Capítulo I - O sinal não vai bater

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Aos alunos do 7ºC

- Todos os professores sumiram! - Luiz anunciava, atônito, para o 7ºC com um traço de desespero na voz.

Era quinta-feira e o professor Vilaça não entrou em aula às 7h30. O garoto saiu em disparada para consultar a planilha de agenda da semana, verificando turma por turma, e percebeu que o professor de Ciências não era o único que estava ausente na primeira aula.

- Você tem certeza, Luiz? - questionava Madu Malgero por formalidade, pois sabia que seu amigo não se enganaria em relação a isso.

- Às vezes eles estão em reunião... - propunha Tarsila com muito pouca convicção. Tentava oferecer explicações viáveis para acalmar os ânimos da turma.

No 7ºC, as discussões eram sempre acaloradas e filosóficas. Ainda se lembravam do dia em que haviam discutido por uma aula sobre um poeminha do livro didático de Português. Nathália Palumbo, por exemplo, era uma espécie de boneca Emília contemporânea, pois era capaz de propor as teorias mais complexas, fazendo as possibilidades de reflexão se multiplicarem sem parar.

- Mas e agora? - perguntava Mahayana incomodadíssima com a quebra da única rotina a qual havia se agarrado em 2020. Não era fácil acordar às 7h30 para assistir às aulas via Google Meet, mas ali, em novembro, já estavam acostumados com o ritual e, para muitos alunos do Liceu Jardim, o hábito era um conforto imenso dentro de um ano em que mais nada era o que já havia sido.

- Vamos avisar nossos pais! - foi a sentença de Rafael. O garoto era uma voz de sensatez e imaginava que os adultos conseguiriam pensar em soluções eficientes.

***

A situação era dramática. Sentada à mesa, na noite daquela quinta-feira, Denise não conseguia jantar. O caso já havia ganhado repercussão nacional e a garota não parava de lembrar as palavras que o professor Daniel havia dito, em entrevista, para os repórteres das emissoras que lotavam a porta da escola:

- Todos os meus professores sumiram!

Os pais de Denise estavam preocupados. A filha segurava o garfo e fazia movimentos aleatórios no prato de comida, seu olhar, contudo, vagava em um ponto qualquer em uma espécie de linha reta infinita...

"Todos os meus professores sumiram"...

A entrevista havia sido veiculada em todos os telejornais ao longo do dia. Dezenas de hipóteses foram levantadas, mas elas não eram suficientes para indicar para polícia uma linha de investigação minimamente coerente.

"Todos os meus professores sumiram!"

Repentinamente, a voz de Denise quebrou o silêncio da mesa:

- Mãe, onde você acha que os professores estão?

A mãe de Denise estava preocupada com a filha e não queria dizer algo que piorasse o estado de nervos da menina. Ainda à tarde, havia conversado com os pais de Letícia, outra aluna do 7ºC, e eles haviam dito que ela não havia saído do quarto ao longo do dia inteiro.

- Filha, vamos tentar não pensar nisso. Talvez amanhã as aulas já estejam normais!

Denise, contudo, sabia que normal talvez fosse o conceito mais difícil de definir em 2020.

"Todos os meus professores sumiram!"

***

Gabriel Valentino não queria ficar de braços cruzados. Mas o que poderia fazer? Lembrou de inúmeras palavras da professora Marina que poderiam iluminá-lo em uma situação de crise. Recordou-se, inclusive, da ocasião, em agosto, que haviam brincado do jogo "Marina na sua casa" e, por alguns segundos, riu lembrando os bons momentos que haviam vivido no EAD.

No entanto, os pensamentos do garoto, que se organizavam em uma espécie de castelo cognitivo de arquitetura sofisticada, logo o jogava novamente na teia intrincada do desaparecimento dos seus professores. O que poderia ter acontecido? Não se tratava apenas do sumiço de apenas um professor...

Imaginava como os familiares deveriam estar. No portal UOL, o caso estava anunciado em letras garrafais, e Gabriel já havia lido todas as atualizações sobre a situação. Naquele momento, 19h, tentava imaginar como poderia ajudar. No entanto, não chegava à conclusão alguma.

O garoto acabou cochilando. Só foi acordado vinte minutos depois, com um brilho do celular, que se destacou no breu em que seu quarto estava. Gabriel pegou o aparelho e viu na tela de rosto que se tratava de uma notificação do Google Classroom. Não acreditou no que viu...

Correu para sala, onde seus pais estavam e mostrou o conteúdo da notificação para eles. Antes mesmo da mãe ler a mensagem, o pai de Gabriel levantou-se, de imediato, e anunciou com euforia:

- Vamos à delegacia AGORA!

O rosto de Gabriel iluminou-se. Finalmente poderia ajudar de alguma forma e sabia que tinha em mãos uma pista absolutamente notável!

- O que está escrito? - perguntava ansiosa a mãe. O garoto segurou o celular em um ângulo que permitisse a leitura da tela:

"Povo querido do sétimo ano...!"

O raptoWo Geschichten leben. Entdecke jetzt