III

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Quase duas semanas depois o celular de Ramos tocou. Era o diretor do museu, informando o nome da artista que faria a restauração do quadro de Battaglia; seu nome era Helena Alves.

Bastou uma procurada no google para que Ramos a conhecesse brevemente. Era uma pintora brasileira aparentemente renomada na área da restauração artística, especializada principalmente em pinturas realistas.

Durante os dias em que ficou sem notícias do diretor do museu – não que tivesse esperança de recebê-las – Ramos tinha tido tempo suficiente para fazer suas pesquisas. Enfurnado no seu escritório deixando de lado a namorada e todos os outros assuntos da vida pessoal, o investigador fez de tudo para procurar informações pelo tal Battaglia e, no fim das contas, tinha obtido muito pouco sucesso.

Ernesto Battaglia era um pintor ítalo-brasileiro de estilo majoritariamente realista que tinha morrido muito jovem, e só. Não havia muito mais informações confiáveis a respeito do sujeito e, ao que parece, a pintura que seria restaurada era a única que ele havia feito em vida. Pelo menos a única que havia concluído para além dos esboços. O homem era um mistério e talvez não fosse à toa que sua Magnum opus atraísse tantos obcecados. O mistério talvez fosse a fonte de tudo, o charme letal encantador, pensou Ramos, não podendo segurar um riso de canto de boca. Tentaria evitar teorias conspiracionistas até conversar com Helena.

Essa, por sua vez, devia conhecer algo a respeito do pintor. Qualquer coisa que fosse útil para ajudar na investigação. Três ocorrências de automutilação nas últimas duas décadas, todas relacionadas à um objeto específico, haviam começado a levantar certa polêmica a respeito das autoridades e de sua eficiência quanto a alguma investigação. Vale mencionar que nesse tempo todo a polícia se omitira de declarações oficiais diante da grande mídia e esta estava faminta por uma explicação.

Naquele mesmo dia Ramos ligou para Helena. Nas duas primeiras vezes não obteve resposta. Na terceira ligação, já no fim da tarde, ela atendeu.

– Sim?

– Helena Alves? A pintora?

– Exatamente – confirmou curiosa – Quem fala?

– Ricardo Ramos, investigador da polícia. Eu...

– Fiz algo de errado, sr. Policial? – questionou ela, a voz calma e furtiva.

– Não, não, de forma alguma! É que eu gostaria de fazer-lhe umas perguntas... Sobre arte. Fiquei sabendo que a senhora é quem vai fazer a restauração da...

– Me chame de você, policial. Ou senhorita. Não devo ser tão mais velha que você e tampouco tenho marido – acrescentou, ainda com a voz calma, e então prosseguiu – A restauração de Battaglia? Que tem ela?

– Ah, bom, como a senhorita deve saber, ela tem sido envolvida em algumas polêmicas referentes à...

– Mutilação? Suicídio? A famosa "Maldição Battaglia?". É disso que se trata? – adivinhou, astuta como uma leoa em caçada.

– Isso...

Houve um breve silêncio. Ramos ouviu o som característico que faz quando se risca uma superfície com uma caneta. Dois segundos depois o silêncio foi quebrado.

– Semana que vem, quarta-feira. Venha ao meu ateliê às oito. Até lá já terei adiantado um pouco da restauração, portanto terei tempo para lhe contar o que sei.

– Obrigado.

Nem tinha terminado a palavra ouviu um clique e a ligação havia terminado. Ramos achou-a um pouco rude, mas agradeceu por pelo menos ter conseguido um horário com a senhorita Alves.

A Perfeição da DorOnde histórias criam vida. Descubra agora