Prólogo.

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     Percy Jackson observou melancolicamente os bombeiros lutarem contra as chamas.
     Foi um milagre divino alguém não ter se machucado, não que ele se importasse, a destruição das batalhas que era obrigado a travar com os monstros eram tão frequentes que já perderá a capacidade de sentir remorso. Se convenceu que não era culpa dele, nunca pediu para ser um semideus e perseguido pelas feras do Tártaro.  
     Bufando, meteu as mãos no bolso da calça jeans surrada e começou a andar em direção ao hotel barato que estava hospedado com seu melhor amigo. Se perguntava quantas vezes mudaria de faculdade até ele e Grover terem que sair da cidade, já era sua terceira parada e estava começando a se tornar frustante. Se aproximando do subúrbio, entrou num prédio relativamente em bom estado, onde teve que usar as escadas por que o elevador quebrou (de novo). Tirando os sapatos, jogou a bolsa de lado, arrancou o casaco e deitou na cama, exausto. Era uma grande sorte que seu emprego só o exigia nós finais de semana, quando a clientela era tão proeminente que era necessário reforçar os garçons. Sim, o salário dele mesclado com o do amigo só dava para pagar o hotel, a faculdade e comida o suficiente para não morrer de fome (as vezes nem isso)... Mas, depois de tudo que passaram nos últimos meses, esse arranjo podia ser considerado um luxo.
     Fechando os olhos, se deixou levar pelo cansaço e adormeceu... Mas não acordou no mesmo lugar.

                                                 XXXXXX

     Sophia corria.
     Era tudo que fazia desde que fugiu do orfanato. O lugar onde ela era chamada de louca por ser caçada e atacada por monstros, criaturas horrendas que só ela via em pessoas apontadas como comuns. Onde era denominada como encarnação do anti-cristo, filha do demônio, seguidora de Satanás e foi exposta a dois exorcismos. Pulando de cidade em cidade, sem nunca pode parar, sobrevivendo a fome e aos ataques por pura sorte. Correndo, correndo e correndo. Como agora.
     Derrapando um pouco, entrou num beco, caído na clichê armadilha de ser sem saída. Um sibilar a fez se virar para a entrada do beco, onde uma mulher reptiliana entrou, brandindo uma lança. Sua pele era escamosa e com um sutil tom esverdeado, a partir do quadril surgia duas caudas de serpente, a fazendo se mover de modo bizarramente rastejante. Metal se agarrava ao seu peito e ombros, numa tentativa de representar armadura. Os olhos amarelos encaravam a garota como uma pedaço temperado e sedutor de bife.
     Num impulso, Sophia se direcionou a escada de incêndio, escapando por pouco centímetros da lança direcionada a seu peito. Chegando no topo da escada, olhou para baixo, observando em pânico que o ser subia na sua direção e ela estava sem saída. Só havia duas escolhas: Pular ou ser empalada pela mulher serpente. Ambas não eram convidativas. Ambas acabavam em morte.
     Engolindo em seco, lançou um último olhar para o monstro e se jogou do topo da escada de incêndio num ato final de rebeldia, querendo deixar claro que preferia se suicidar a se render. Enquanto fechava os olhos, aguardando pacientemente o choque contra o chão, não pode evitar pensar no quanto era injusto morrer assim depois de ter lutado tanto...
     E o destino reconheceu isso, por que Sophia não morreu assim.

                                                 XXXXXX

     Edgar Cornerstone não era um garoto de honra.
     Era um ladrão sem escrúpulo, que já tinha até matado (foi só duas vezes, em legítima defesa, mas ainda tinha ceifado a vida de alguém). Sempre colocou suas necessidades acima de qualquer um, disposto a tudo para beneficiar a si próprio e o resto que se foda. Foi o que aprendeu nas ruas, era como sobrevivia. Então encontrou Lupa.
     A majestosa loba sabia de seu verdadeiro caráter, ele conseguia ver isso na faísca de seus olhos, olhos incrivelmente humanos que parecia penetrar sua alma e enxergar pecados trancafiados nas profundezas da sua vergonha. Mas isso não lhe causou repulsa ou a impediu de treiná-lo, de explicar sobre a mitologia e contar que era um semideus. Depois o enviou para o sul, com promessas convictas que encontraria um lugar seguro, um lugar com pessoas "iguais" a ele. Guerreiros nobres, homens e mulheres de coragem, de honra. Teve vontade de gargalhar, mas apenas assentiu suavemente e partiu. Se esses semideuses fossem assim, aquele não era seu lugar.
     Suspirando, Edgar fechou os olhos e sentiu a floresta ao seu redor. Não sabia como, mas poderia dizer quanto tempo de vida tinha cada planta, o nível de fertilidade do solo e sabia que se tocasse qualquer vegetação poderia enviar ondas de poder que a deixaria mais saudável. Foi algo que sempre fez, uma capacidade que o mantinha vivo, pois bastava uma semente de árvore frutífera e em uma semana teria uma fonte inesgotável de comida. O resto, coisas materiais, ele roubava. Uma vida medíocre e criminosa.
     Edgar não notou quando a brisa gélida da noite ficou mais intensa, rodopiando ao seu redor, se aproximando de sua pele que, mesmo protegida por um grosso casaco, ainda sentia cada vez mais arrepios de frio. Apenas quando o vento açoitou seus cabelos e fez suas roupas dançarem ao seu redor, foi que interrompeu suas reflexões e olhou em volta, mas era tarde demais.
     Edgar sumiu num redemoinho de vento.

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