Nenhum músculo do meu corpo conseguia se mover. Fiquei petrificada com a criatura gigantesca diante de mim. Garras enormes, bico mais do que triplicado de tamanho! Ela entortou o pescoço e mirou-me com aqueles enigmáticos olhos redondos brilhosos.
-Aaaaaaahh - finalmente gritei com todo o ar dos meus pulmões. - minhas pernas trêmulas se moveram e eu tentei correr toscamente.
A coruja gigante moveu sua enorme patas e me prendeu entre suas garras facilmente, quase formando uma jaula. Desesperada, tentei fugir, correndo pelo pequeno espaço que me sobrou, sem nenhum sucesso. Senti-me como um ratinho encurralado pelo seu predador. O coração acelerado estava para sair pra fora do peito.
"Merda! devia ter ficado no outro jardim! Burra, burra, burra!". - levei a mão a cabeça apertando os cabelos da raiz de tanta frustração comigo mesma.
-Espere criança! - Uma voz feminina e colossal ecoou.-Q-quem falou isso?! - Eu não parava de tremer, tremia mais do que o motor de um carro velho.
- Eu sou o espírito da noite. O ser que protege e concede a noite.
"A-a coruja falou isso?! Ou estou ficando maluca?".
- Não vou fazer nenhum mal a você, Silva.
-C-como sabe meu nome? - o temor ainda transparência em minha voz - E-e se não me fará nenhum mal, então me solta! - gritei, empurrando as mãos contra suas garras.
-Ah, desculpe-me por isso. Mas por favor não corra. Preciso falar com você, é importante. Promete não correr? - A coruja respondeu educadamente.
Prendi a respiração por um instante. Tudo que eu queria era sair correndo dali. No entanto, fiquei curiosa, o que aquele ser gigantesco teria para falar com uma serviçal do Palácio afinal? E se ela quisesse fazer algum mal, faria logo! Por que conversar?
Suspirei - está bem… prometo não correr - respondi mais calmamente desta vez.
As garras da coruja se moveram, revirando a terra e a grama nas quais se firmavam. Ela retirou-as do chão, deixando-me livre.
-Céus, como é grande! E fala!- minha boca não se fechava. Meus olhos a examinavam pontualmente, arregalados. - i-isso não é possível…
Sente-se Criança. - Com sua longa asa, ela apontou um tronco de árvore. - Não precisa ter medo.
Eu parei de encará-la por um instante com cara de abobalhada e sentei-me no tronco.
-Silva - ela me encarou com seus grandes olhos iluminados, era muito intimidador - você sabe o que você é, não sabe?
-O quê... eu sou… - Eu não tinha uma resposta muito certa pra isso. Até pouco tempo, eu era uma humana normal… e agora, agora até asas eu tinha! É algo que eu vinha me perguntando. O que sou, o que minha mãe era? - Uma fada serviçal? - respondi sem muita confiança.
-Errado! - Ela falou. - Você carrega todo o espírito da natureza. É o ser responsável pelo equilíbrio de tudo. Você transita entre todos os seres, reinos e mundos.
Eu entortei a cabeça, confusa - Como assim?
-Silva, você serve a nós os espíritos, ajudando-nos a manter o equilíbrio e a a vida em curso. Existem outros como eu. Eu sou responsável pela noite. Outros pelo fogo, gelo, plantas e assim por diante. Você é a guardiã de todos os seres.
-Guardiã?
-É a criatura que os humanos chamam comumente de mãe natureza. Talvez você entenda melhor se eu colocar assim.
- Eu?! Guardiã, mãe natureza?! - levei a mão a cabeça, bagunçando meus cabelos depenados - Que loucura! Não consigo nem controlar meus poderes! Como pode ser?! - Balancei a cabeça para os lados - Não… deve haver algum engano aqui, você pegou a pessoa errada!
- Não há engano algum, criança! - A coruja retrucou, um tanto ressentida. - Entendo que não tenha desenvolvido seus poderes ainda. Mas ninguém nasce pronto. Você vai desenvolvê-los com persistência e disciplina. E infelizmente terá que alcançar isso em um curto período de tempo e com um treinamento árduo. Nós, espíritos, precisamos de você para proteger o equilíbrio! E não podemos esperar mais nenhum dia. Cada minuto é crucial para evitar a destruição total.
-Destruição?! - Espantei-me- C-como assim destruição?!
A coruja tinha uma expressão de pesar em seu rosto:
-Infelizmente, alguma fada entregou-se a ganância. E pelo seus atos, acreditamos que deseje surrupiar todo o poder para si… - a coruja suspirou - Ela vem atacando os reinos, matando outras fadas e roubando seus dons para o seus propósitos pessoais. O que pode gerar nada mais do que destruição. E o pior é que sem uma rainha que una todos os reinos, eles estão divididos, trabalhando de forma individual, e alguns até mesmo entrando em conflito uns com os outros. E isso só os enfraquece mais.
-M-mas você é tão gigantesca e-e controla a noite! Não pode você mesma fazer alguma coisa? - interrompi a coruja, apavorada.
Ela balançou a cabeça para os lados:
-Não posso. Sou apenas um espírito. Não consigo me materializar. E minha interferência no mundo material tem um limite. - Ela me encarou mais profundamente - mas você, como fada guardiã, guarda o fluxo dos nossos poderes. E se ficar forte o suficiente, poderá até mesmo nos invocar para a batalha. É através de você que nos materializamos, Silva.
-Céus…. - respirei angustiada. - Eu tenho mesmo que fazer isso? Não há outro alguém? E-eu acho que é demais pra mim!
-Escute com atenção menina! Toda vida tem um propósito de existir. E para tanto, recebemos dons, que devem ser usados! O dom é uma semente que precisa ser cuidada e regada, se não ela seca e desaparece. Todos somos um só, estamos conectados. Se você não pode amar e compartilhar, um dos membros desse todo começa a apodrecer. Entende?
Eu nunca pensei ou precisei pensar sobre isso. Sempre presa em meu mundinho individual, nos meus problemas sem muito sentido. Mas a coruja estava completamente certa. Era algo que minha mãe faria. Ela nunca pensou duas vezes na hora de se sacrificar pelos outros. Ela sim faria essa tarefa melhor do que eu.
-E então, posso contar com você?
-E-eu não sou qualificada… - respondi, amuada, encolhendo os ombros.
-Você é Silva! A semente está em você! Só precisa treinar. Muitas vezes os seres vivos sentem isso. Mas é importante seguir a jornada. Mesmo que ela pareça demais pra você. Caminhe e o caminho se abrirá! Quando você se empenha em algo, "o como" se aflora. Você só precisa ter a coragem de iniciar o caminho, de pisar no primeiro degrau. Tudo que você precisar, aos poucos será provido, você verá. E quando piscar, terá escalado a mais alta das montanhas!
Meu coração batia fortemente no meu peito. Seria esse meu propósito? Eu vinha me perguntando, me torturado dia após dia com essa pergunta. O que sou? Por que estou aqui? E agora, talvez tivesse encontrado essa resposta… Era errado e sem sentido renunciar. Eu precisava ter coragem! Eu não sabia onde isso me levaria, mas estava sentindo nos meu ossos que eu precisava fazer isso. Seria isso o que chamam de intuição?
- Mamãe sempre dizia isso sobre os sonhos. - respondi - Na época, eu não compreendi. Ela dizia, muitas vezes os outros não vão entender. E eu particularmente não entendia as escolhas dela. Mas o seu caminho é somente seu. Se você sente que deve fazer algo, então faça! Não importa o quão maluco pareça ser.- Sua mãe era uma mulher sábia.
-É, ela era… - sorri de lado.
-E então? Qual a sua resposta?
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O reino das fadas: A rainha de todas as fadas
Fantasy•(Em andamento) Silva é uma adolescente de 17 anos de idade. Ela mora em uma aconchegante casa próxima à floresta. Às vezes ela consegue ver criaturas que ninguém mais vê, mas sua mãe a ensinou como ignorá-las. Estava dando certo, até que certo dia...