1 - Cidade Flutuante

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Cidade Flutuante

Enquanto corria descalço pela propriedade da família, o jovem de 17 anos pensava em como estava ferrado. Seu pai iria lhe matar. Provavelmente de forma lenta e dolorosa.

Correu mais do que seu porte físico parecia suportar, tentando chegar ao castelo o mais rápido possível. Não se importou com os espinhos pinicando os pés, ou com dois ou três galhos que lhe açoitaram o rosto no caminho. Só continuou correndo.

Na entrada da grande construção, Alfonse lhe esperava. Segurando uma túnica branca na mão direita, e um pente na outra. Puta merda, seus cabelos estavam tão desgrenhados assim?

- Seu pai vai ficar muito chateado, jovem senhor Arash. - Disse o governante enquanto se aproximava.

Tirou a calça e em seguida a camiseta surrada, vestindo a túnica com a ajuda de Alfonse.

- Eu sei, Alf. - Resmungou o garoto bufando entre as palavras. Antes que terminasse a frase, o empregado lhe puxava os cabelos com a escova, arrumando os fios negros para trás, num puxado estranho como lambida de gato. Irônico pensar isso, sendo que os olhos amarelos do garoto nitidamente eram como os de um gato. 

- Onde você estava?

- Com a Zahal.

Alf resmungou algo inteligível, enquanto Arash entrava no salão.

A visão que teve do alto da escadaria foi de todas as pessoas importantes de Uhrik reunidas no salão do piso zero. Todos com olhares falsos estampados em suas caras hipócritas. Então o jovem colocou em sua face seu melhor sorriso, trabalhado tantas vezes no espelho, e desceu as escadas. Faria isso por seu pai, por sua mãe, por seu reino e por sua magia.

Enquanto descia a escada, toda a ilha suspensa tremeu, em grande turbulência.

Enquanto descia a escada, toda a ilha suspensa tremeu, em grande turbulência

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- Mac, o que vai fazer? - Perguntou o conselheiro, ainda em choque.

Isolados em uma sala atrás da biblioteca, estavam: conselheiro D. Smith, padre William e Rei Mac.

- Merda Smith, eu não sei, não temos mais magos disponíveis no reino. - Respondeu o nobre, ainda um pouco atordoado, com a mente rodando em bilhões de nós por segundo.

Padre William, que até então estava em silêncio, resolveu se pronunciar:

- Sua esposa era maga, não era, Mac?

- Era sim, você sabe disso. - Respondeu o rei, irritado pela simples menção da mulher.

- Seu filho deve ter linhagem, deve ter alguma magia... - Insinuou.

Irritado e profundamente nervoso, rei Mac passou o braço por cima da mesa grande de mogno no centro da sala, jogando todos os objetos no chão.

- Eu já lhe disse que o moleque não tem magia, puta merda, que porra você tem na cabeça William?

Ressabiados, o padre e o conselheiro se calaram. Todos sabiam a magnitude do que havia acontecido hoje, mas apenas o conselheiro se atreveu a sussurrar:

- Precisamos encontrar outro mago, o mais breve possível. Ou será nossa ruína.

- Eu sei. - Concordou Mac, em tom baixo e triste.

 - Concordou Mac, em tom baixo e triste

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- Pequeno Arash... - Disse Alf, entrando na sala com muita pressa, esbaforido com o rosto vermelho e dentes rangendo do recente esforço de subir as escadas com pressa. - Seu pai quer lhe ver.

- O que foi? - Perguntou o jovem, sem muita convicção.

Já sabia em seu interior que o pai lhe chamaria para conversar após o baile. Seu subconsciente já estava em alarme desde o fim do baile, que algo estava errado. Sabia que o pai lhe convocaria e o assunto não seria agradável.

Ainda de calção de pijama, pois se preparava para dormir, desceu as escadas, as mesmas escadas que estava quando o reino todo tremeu. Inconscientemente tremeu novamente enquanto passava por ali, lembrando da sensação.

Atravessou o salão que os criados ainda limpavam, depois a biblioteca e apertando um botão em baixo de um livro falso, abriu a passagem atrás da estante, entrando na sala em que o pai o esperava. E lá estava ele, sentado rente a mesa de centro, sob a qual depositava o braço, com os dedos pressionando firme um copo de whisky com gelo. Nervoso, sabia que estava nervoso, seu pai só bebia quando o problema era sério. Esperou ali parado enquanto ele sorvia mais um gole longo da bebida.

Seu pai era um homem branco, magro e alto, porém cansado. Tinha olheiras profundas abaixo dos olhos amarelos, olhos iguais aos seus, a marca da realeza... Também tinham em comum a altura, no entanto a semelhança acabava ali.

O homem antes sentado, lhe dirigiu o olhar mais triste que já tinha visto em toda a sua vida. Leu sua face como decepção pura. Sabia que não estava a altura das expectativas, mas ver isso estampado no rosto do homem que mais amava, lhe doeu imensamente.

- Me siga. - Disse o pai, sem demonstrar mais nada.

O jovem então o seguiu. Passaram novamente a biblioteca, depois o salão e por último a entrada. Continuaram andando para os limites da propriedade.

- Sabe filho... - Começou calmo. - Tem coisas que você ainda não sabe e não compreende sobre nosso reino.

Arash revirou os olhos. Tão amarelos quanto os do pai. Já sabia como aquilo terminaria, seria mais um sermão de horas, falando como precisava se portar, como deveria agir e manter sua natureza escondida.

Chegaram até o fim do caminho, a beirada da ilha flutuante. Silêncio preencheu todo o espaço. Fazendo audível as respirações de ambos.

- Pai?

Olhou para o homem virado para o precipício. Calado.

Ficaram parados por mais alguns longos minutos, até que reparou que ele virava para si.

- Está chorando? - Perguntou o garoto, olhando o homem mais velho com o rosto molhado por lágrimas. Antes que pensasse, correu, abraçando-o. Forte, firme e com todo o amor que tinha pela única família viva, seu pai.

O homem afastou o filho delicadamente, entregou-lhe uma pequena caixa preta, com detalhes no fecho em dourado, e por fim, o empurrou.

Empurrou para o precipício, em queda livre.

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