XVII

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O sol ainda não havia nascido. Estava tendo um sonho horrível, e em seu sonho estava sendo atormentada pela dor, uma dor que sentia agora. Estava banhada de sangue e gritava; o sangue não era seu, não havia nenhum machucado, e seu sangue era de outra pessoa. Mexeu-se na cama e, enquanto rolou sobre algo, o ruído a fez passar a mão e então tirou o envelope branco e simples de baixo de si, abriu o mesmo e observou a letra. Passou a ponta dos dedos por cima, e então começou a ler em voz alta. Como o envelope foi parar ali?

Indescritível Mackensie.

Quando comecei a escrever esta carta, pensei no melhor horário para entregá-la e decidi que o melhor horário é quando a noite lentamente passa o controle para o dia. Apesar da minha idade, que deveria ser carregada de experiências e galanteios, não sei bem o que colocar neste papel. Joguei algumas cartas no lixo por achar que não estavam boas o suficiente para serem lidas, então serei breve em minhas simplórias palavras.

Amanhã mesmo irei te buscar no instituto. Não precisará ficar aí, pois estou completamente curado. Foi mais rápido do que imaginava. Espero que aguarde minha chegada como eu a aguardo, ansioso, e espero que queira me ver como eu quero vê-la e protegê-la. Espero que pense em mim toda vez que se lembrar de algo bom. E espero que se lembre de mim toda vez que comer biscoito com gotas de chocolate.

Obs: é a primeira vez que cozinho; espero que esteja bom. Espero que não se importe, eu cheguei na janela de seu quarto à noite e me encontrei com Ducan, que deixou a carta aí em segredo por mim. Aparentemente ele é um possível aliado.

Com amor,

Maksimovich Andersen!

Após ler tais palavras, a mulher se levantou com um sorriso, passou a mão pelo cabelo bagunçado e mordeu os lábios levemente. Olhou para o criado-mudo, e então se aproximou, pegou um biscoito e o colocou na boca. A aparência era bonita, todavia o gosto era de matar — apesar de ser um doce, estava salgado e tinha um aroma de queimado. Ela cuspiu na mesma hora, passando a mão sobre os lábios.

— Isso está horrível, Maksimovich — falou baixinho para si mesma, sabendo que não receberia uma resposta do homem.

Ela foi para o banheiro e demorou horas se arrumando. Sentia que merecia isso, um dia para se arrumar completamente; certamente não tinha o dia todo, mas poderia aproveitar o restinho da manhã, já que acordara cedo. Assim que ficou pronta, arrumou o quarto e moveu cada móvel de lugar, pois sentia que era necessário fazer uma restauração no quarto para entender seus sentimentos. Enquanto empurrava a cama, escutou alguém bater na porta. Correu para esconder a carta dentro do criado-mudo e jogou os biscoitos pela janela, pois tinha certeza que se fosse Ferraro ela não sairia do quarto para esperar Maksimovich. Abriu a porta com um sorriso no rosto; era exatamente o loiro de fios longos que estava à sua porta. Seu sorriso se desfez de forma minúscula.

— Vim te buscar para o café da manhã — falou, sentindo um cheiro estranho do quarto dela; parecia ser comida queimada. Pensou em entrar, entretanto, a mulher colocou-se entre a porta para ele não passar.

— Eu não preciso de uma babá que diga a hora que tenho que comer ou não, isso é sufocante. — Cruzou os braços, demonstrando seu descontentamento com o homem.

— Depois do café, você e Erny sairão sozinha para uma missão; você precisa se alimentar bem.

— Achei que minhas missões seriam apenas com minha equipe.

— Você é a única humana da nossa equipe, a única que pode andar no sol; precisamos dessa missão, e Erny foi a única que se voluntariou a ir com você! — exclamou, explicativo.

— Claro. — Não queria estender assunto, e o homem se mostrava cada vez mais curioso com o que tinha em seu quarto.

Saiu do quarto completamente, fechando a porta atrás de si, e tentou sorrir para o homem, mas falhou miseravelmente. Tinha uma péssima impressão dele, um arrepio percorria sua espinha e algo dizia para não confiar em Ferraro. Caminhou em silêncio com as mãos no bolso. 

Lua de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora