Torta doce

1.7K 212 59
                                    

Era torturante. Ao mesmo tempo que pareciam horas, não parecia ter passado um só segundo, mas então, tudo ficou frio e parou. Jaskier já não sentia mais os extremos ou o sufocar, ele não sentia mais nada fora um calor muito distante. Não era confortável ou trazia paz, era apenas o Nada.

“Você pode descansar agora” uma voz distante lhe dizia, era absolutamente sedutora e Jaskier não estava disposto a discutir com a voz. Ele queria descansar, deixar de sentir dor, não apenas a dor física mas a que se instalou no seu peito.

Jaskier sabia que poderia ter a resolução que buscava e que não teria que lidar com a consequência de suas escolhas se resolvesse ficar naquele conforto. Eskel não se incomodaria o suficiente e ele sabia que não valia o preço que Geralt teria de pagar – Geralt não o amaria de volta – então porquê deixar que adiassem sua morte? Jaskier se deixa ir em direção da voz, mas o calor distante tentava o puxar e uma voz tão distante quanto o calor o chamava.

“Por favor!” a voz implorava, baixa e quebrada “Eu sinto muito, eu deveria estar lá pra te proteger... Eu deveria ter ficado... Então, por favor, me deixe te pedir desculpas te olhando nos olhos...”

A voz falava e não parecia guiar para algo confortável, não parecia em paz, não parecia que todos os problemas de Jaskier iriam sumir se ele escolhesse aquele caminho ou sequer que fossem se resolver. Não parecia que ele seria feliz, na verdade, quanto mais ele cogitava aquele caminho, mais ele sentia o peito apertar e doer e mais ele tinha medo... Naquele ponto Jaskier já sabia que não era simplesmente um “medo” mas era a combinação fulminante de paixão e receio que o eletrificavam. Ele não tinha motivos para escolher aquele caminho. Não era uma decisão lógica escolher aquele caminho. É claro que ele escolheu aquele caminho.

Paz? Descanso? Tudo entregue de bandeja? Uma oferta tão tentadora que seria impossível resistir? Isso não faz história. Não é o que Jaskier busca, não foi para isso que saiu de casa. Ele saiu para conquistar o que é seu, para viver e se apaixonar, sofrer e superar. Ele não abandonou o que tinha para deixar histórias inacabadas para trás.

A primeira inspiração queima completamente o peito de Jaskier, era com se ele tivesse acabado de sair do ponto mais fundo de um lago. Ele não enxergava nada em um primeiro momento, focado em respirar e lembrar que precisava disso, mas sente que estava curvado e era um par de mãos que o sustentava. Ele se joga contra quem o segurava, não de forma agressiva mas por não conseguir se sustenta. Ele sente a respiração que normalmente é lenta acelerando e jura ter ouvido um soluço que condizia com as mãos trêmulas do bruxo que o tinha no colo. Jaskier fechas os olhos por um momento mas recusa se deixar desmaiar novamente e os abre, tentando entender onde estavam e o que estava acontecendo.

- Jaskier... Você... — Geralt começa, em uma confusão mas sorrindo em puro alívio. No primeiro contato visual que fizeram, Jaskier já levanta com a força que juntou e leva suas mãos ao rosto do bruxo no tempo em que seus lábios se juntam. Aquele beijo não foi um beijo por desejo ou prazer, mas foi a forma de Jaskier deixar claro que o queria por perto. Assim que se separaram, Jaskier encaixou a cabeça na curva do pescoço de Geralt, voltando a regular a respiração e recebe um abraço do bruxo — Eu achei que tivesse perdido você... Que tivesse cometido a maior falha de todas...

- Você não vai se livrar de mim tão fácil. — O trovador brinca e muda a posição para olhar o rosto de Geralt, tentava manter seu sorriso de sempre mas falha ao ver a expressão do bruxo — Você estava chorando...

- Você está bem? — Jaskier não fez uma pergunta, então Geralt não precisava responder.

Jaskier responde balançando a cabeça e voltando a abraçar Geralt com força, quem retribui o abraço e acariciava os cabelos do trovador.

- Geralt, eu quero saber o que aconteceu? — Jaskier pergunta preocupado, afinal, ele deveria estar morto naquele ponto — Você... Não aceitou aquilo... Aceitou?

O bruxo se mantém em silêncio, abraçando Jaskier.

- Geralt você... — Jaskier não parecia grato e saltitante como uma mísera parte de Geralt desejou que estivesse, mas também não parecia decepcionado como esperava. Parecia que tinham contado a pior notícia do mundo para ele naquele momento — P-por que?

- Existem pessoas quais valem a pena fazer sacrifícios... Um certo bardo que eu admiro e tenho apreço já fez incontáveis desses por mim, então eu tenho que devolver. — Geralt diz e evita contato visual até que põe ambas as mãos nos ombros de Jaskier e o puxa levemente para poder o olhar nos olhos — Jaskier, eu sinto muito, por tudo. Me desculpe por não ter sido mais rápido, por não ter sido mais forte, por não ter chegado a tempo, por não ter ficado, por não ter cumprido quando eu disse que ia e por ter te feito achar que alguma coisa daquela noite foi mentira. Me desculpe, por tudo.

- Você... Eu... Eu nunca fiz qualquer coisa daquelas esperando algo ou uma “devolução de favores” — Jaskier diz e aproveita que Geralt não parou o contato visual, juntando a coragem que tinha ali — Eu fiz porquê amo você, idiota! Eu não medi causa e consequência, eu só fiz o que eu podia!

- Eu fiz o que precisava pra manter você perto, Jaskier. — Geralt diz, queria quebrar o contato visual mas Jaskier não permitia — Eu não aguentaria te perder.

- Geralt, então diga... — Jaskier pede, mas sua voz falha naquele ponto — Eu repito que te amo quantas vezes quiser, mas diga...

Jaskier se sentia mal tendo que pedir aquilo, tendo que pedir para ouvir um “eu te amo” sem a certeza de que ele iria vir, afinal ter que admitir aquelas palavras em voz alta já eram desconfortáveis por sí só. Existem muitas formas de expressar amor, mas depois de todos aqueles anos Jaskier parecia não ser entendido e precisava deixar claro com todas as letras. Geralt fica silêncio, como se estivesse entendendo aquilo aos poucos e então ele pega a mão de Jaskier, entrelaçando seus dedos nos dele e o beijando. Jaskier não consegue impedir as lágrimas que caíram, mesmo sem entender o porquê de tanto choro. O beijo era cuidadoso, carinhoso, era como ele esperava de Geralt.

- Eu te amo, Jaskier. — Geralt tinha várias formas de dizer aquilo, mas disse da forma que Jaskier pediu para ouvir. Geralt dizia aquilo em cada contato com o bardo, mas aparentemente não era compreendido o bastante — E jamais farei você duvidar disso outra vez.

Torta - the witcherOnde histórias criam vida. Descubra agora