• CAPÍTULO 02 (Degustação)

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CAPÍTULO 02

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CAPÍTULO 02

VIKTOR

DIZEM QUE O amor e o ódio andam de mãos dadas.

Eu digo que o amor prefere a companhia do medo.

Somos ensinados a amar desde pequenos, e junto com esse sentimento, aprendemos também como é o terrível medo de perdê-lo. Mas alguns amores são passageiros como as estações, vêm e vão na mesma velocidade, rápidos demais para causarem grandes estragos; outros se abrigam em nossos corações e criam raízes tão fortes que nem o poderio do tempo é suficiente para arrancá-las.

Elena...

Elena é a minha raiz.

Ainda hoje, quando fecho os olhos, consigo lembrar com riqueza de detalhes a sua expressão durante o enterro dos pais, a forma como ela chorou nos braços do irmão enquanto as duas pessoas mais importantes de sua vida eram cobertas com terra. Naquela época, tudo o que doía em Elena, me machucava profundamente, e foi desesperador assistir seu sofrimento sem poder fazer nada.

Minha mãe, que sempre trabalhou para o senhor e a senhora Kokorin, decidiu deixar a residência deles para me acompanhar à São Petersburgo, onde eu faria faculdade. No começo, pensei em desistir e ficar com os dois. Eu não queria deixá-los após já terem perdido tanto. Eles eram a minha família, como eu poderia virar as costas e seguir com a minha vida?

No entanto, Aleksei, meu melhor amigo de uma vida inteira e irmão de Elena, me convenceu de que aquela era a melhor decisão.

— Não pode parar a sua vida por causa de uma fatalidade — disse-me poucos dias antes da minha viagem, no antigo escritório de seu pai. — Todos nós precisamos seguir em frente agora. Além disso, não é como se não fôssemos nos ver nunca mais. Em quatro anos você vai voltar e trabalhar para mim, e poderemos nos ver durante as suas férias também.

Eu sabia que dizer aquilo era difícil para ele. Desde pequenos, nós havíamos feito planos sobre nossas carreiras e a faculdade juntos, e ele teria que desistir de tudo para assumir os negócios dos pais cedo demais.

Mas, mais importante ainda, era a outra responsabilidade em seus ombros.

— Elena...

— Eu sei — ele me interrompeu, servindo uma generosa dose de vodca para nós dois. — Também não gosto de ver ela assim, mas minha irmã vai ficar bem. Vou cuidar dela, pode deixar. — Meu amigo estava devastado, com profundas olheiras de tristeza e a expressão cabisbaixa, mas precisava aguentar, não havia opção. — Sua namorada também vai para São Petersburgo, não vai?

— Foda-se isso.

Aleksei riu baixinho e virou seu copo em um só gole, depois o bateu sobre a mesa. O silêncio se prolongou e eu desejei, naquele instante, saber o que se passava na mente dele. Quando voltou a falar, sua voz soou melancólica.

Um Presente Entre as Cinzas | CONTO 2.5 | DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora