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Diante da janela, com severidade, olhava a dança do ar encorpado lá fora. Ficava assim até a luz do sol esbarrar na nuvem ao redor da cidade e mostrar sinais de que o dia iria começar.

Mas, naquela noite, a luz demorava. A escuridão ao redor se insinuava, como uma presença crescente e não o contrário. Como se minha única saída fosse aceitá-la crescente, em definitivo, como a minha mãe havia aceitado.

A angústia crescente, sufocante, foi cessando, quando vi os primeiros raios luminosos, mas não era do sol. No ápice de pensamentos opressivos, é possível ter alucinações, que só poderiam ser fruto do ódio, naquela ocasião.

Mas luz não sumiu da minha visão, ao contrário, crescia, trêmula. Levantei da cama e fui até a janela ver. Era uma chama alta, e não estava longe. Barulhos estranhos pareciam advir da direção do fogo. Pareciam berros, sons de pássaros ou murmúrios humanos, tudo ao mesmo tempo.

Quis sair, mas hesitei. Cheguei a pegar a lanterna, que pouco ajudaria, mas me serviria de guia, passo a passo. Fiquei olhando o fogo até conseguir ouvir sua crepitação. Concentrada, não pude evitar o grande susto de um som de coruja cortando o ar por cima da nossa casa. Tremi. O seu chirriado repentino e alto acelerou meu coração, fazendo meus ouvidos confundir com um berro humano direcionado para mim.

De olhos muito abertos para o horizonte vazio, resolvi fechar a janela, mas outro susto me tomou, quando quase toquei um pássaro, que estava pousado na janela. Era uma coruja, que me encarava no escuro, antes de alçar o seu voo para as trevas. 

A Matinta e o SonhoOnde histórias criam vida. Descubra agora