Q.u.a.t.r.o.

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🎄

Rada conferiu mais uma vez sua mãe no quartinho de costura, intercalando sua atenção no vestido que confeccionava para ela e no seu irmãozinho, Gidie, que ocupava-se em morder e babar sua mãozinha sentado aos pés da mulher.

Seu coração batia rapidamente dentro do peito, se sua mãe descobrisse que ela iria sair de casa para entrar na floresta, com certeza, levaria a pior bronca da sua vida.

Mira, sua mãe, não compreenderia suas intenções totalmente voltadas à saudade que sentia de Godwin.

Ela tinha um plano: pegaria sua cesta e iria até a floresta Hekseskog colher amoras frescas, não adentraria muito, sabia que ela estava perigosa com um monstro à solta, mas ela precisava das frutinhas para fazer a torta favorita do seu irmão e com sorte, trazê-lo novamente para o seu lar. Godwin estava muito magoado e sem motivos para ela. Eles eram família, continuavam sendo uma, por que ele estava tentando se desprender deles?

Rada não conseguia entender como poderia ser tão fácil para Godwin dar às costas a eles. Era muito injusto. E daí se não tivessem o mesmo sangue correndo em suas veias, o amor não era suficiente? Nunca houve distinção na criação dos três — quatro contando com Gidie, porém, ele tinha apenas dois anos —, Mira e Athanasi eram muito amorosos e justos para não amar Godwin como ele merecia. Então, se para Rada era ridículo o que seu irmão estava fazendo com eles, para os seus pais devia ser imensamente doloroso.

Uma torta de amora não resolveria esse problema familiar, porém, poderia amenizar a ferida no coração de Godwin. Valeria a pena se arriscar um pouquinho, o máximo que poderia dar errado era os pássaros terem comido as frutas e não ter o suficiente para fazer a sobremesa. Pelo que parecia, a bruxa só atacava à noite, quanto a isso, não precisava se preocupar.

Por minutos, ela pensou em uma desculpa para dizer à mãe e poder sair, entretanto, viu que o melhor era sair sem dizer nada. Por mais que morasse em uma fazenda, relativamente longe da floresta, era muito rápida, voltaria para casa antes mesmo que seus pais dessem falta dela.

Nesses momentos ela queria ter um cavalo. Seria bem mais fácil e rápido. Ou um cavalo e uma carruagem.

Conferiu mais uma vez sua mãe, que agora tinha Gidie nos braços. Com a cesta na mão, saiu de casa.

Seu pai devia estar ocupado alimentando os animais, não teria risco dele vê-la saindo.

Rada corria sempre que podia, desde criança, era um lazer que não abria mão, mesmo não sendo bem visto para as pessoas de Hekseskog. Ela já tinha quinze anos, camponesa, todavia, irmã de dois cavaleiros. As cobranças para um futuro casamento começaram, Rada não queria pensar muito sobre isso, não tinha nenhum pretendente, ninguém que queria se casar com ela e ninguém com quem ela queria se casar. A única coisa que ela sabia é que gostava de correr e isso era algo que seria vetado pelo seu marido, afinal, esse seu estranho hobby não ajudaria em nada a cuidar de sua futura casa.

Quando avistou a floresta engoliu em seco, vacilando um segundo em sua corrida e em sua ideia. Lembrar que ali agora habitava um ser que machucou seu irmão mais velho e matou seis pessoas que ela chegou a conhecer, mesmo que de relance fazia crescer o medo da própria morte.

Parou de correr, decidindo que faria o possível para não chamar a atenção. Agarrou a alça de sua cesta com força, estava ofegante pela corrida, suando e com medo. Talvez sair de casa não havia sido uma boa ideia.

— Vai ser rapidinho — disse para si mesma, tentando se convencer que em breve estaria em casa, fazendo a torta com o único perigo de deixar seu sabor horrível, algo que duvidava acontecer.

O Natal das bruxas de HekseskogOnde histórias criam vida. Descubra agora