ONE | RETALHOS ALECRIM

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JIMIN ANTES NÃO ACHAVA QUE GATOS DESAPARECIAM MAGICAMENTE; até chegar Kira, com seu pelo alaranjado e olhos de uma galáxia intergalática, mistura tão bela de tonalidade caramelo formando dois planetas flutuantes e gêmeos, adornando o rosto em 'V' do felino tão descarado que vivia a sumir por entre as frestas como se houvesse, entre elas, um guarda roupa de narnia ou buracos negros do universo, espalhados pelo piso a qual ele pisava com tanta maestria e tranquilidade.

Jimin adorava-o tanto quanto Cyndi Lauper, finais de semana e discos com cheirinhos de reminiscências em bazares secretos de becos da cidade. Adorava o jeitinho gracioso que o bichano ronronava e fazia ondulações com a pata rosada, adorava quando ele deitava em cima de si ou pedia por ração, se atirava no chão e rolava de um canto para o outro, querendo chamar atenção. Eram só ele, o gato e o tapete indiano naquele apartamento; e então tudo estava bem, encaixado em seus lugares com sinônimo de aconchego e casa.

E bem, não podia fingir que não ficava preocupado quando o gato sumia por tempo demais, naquelas suas fatídicas caminhadas que, por vezes, levavam o Park a pensar que ele havia sido raptado, roubado ou se perdido por aí.

Como naquele exato momento, em que a ausência daquele serzinho perdurava por 4 dias inteiros, tarde, noite e manhã sem aqueles miados ou qualquer rastro de que ele teria passado ali. Um infimo pelo não havia. E Jimin achava que poderia ficar sem cabelo tamanha a preocupação e aquele vazio entalhado no sofá, por muitos marcado por um humano, mas o do Park sendo causado por um gato desnaturado que estava pouco se lixando para sua síndrome de pai preocupado e danças solitárias ao som de Dido no domingo.

Jurava pensar em maratonar todas as suas animações favoritas naqueles momentos; e às vezes de fato o fazia, convidando Hobi, seu amigo, a sentar-se consigo no sofá e assistirem televisão até as vistas cansarem ou as barrigas doerem de tantas comédias ruins e boas numa antítese encaixada em cenas para gargalharem; ou então ficarem de olhos vermelhos e rostos inchados de tanto chorarem após um romance ou filme qualquer que envolvesse problemas mundanos — ambos adoravam se reconhecerem em personagens tanto quanto a sensação única do sol ameno batendo no rosto, balas de caramelo e roupas felpudas e quentinhas, mãos dadas com sorrisos e tudo mais — e o mais especial de tudo; se derramarem desleixadamente no tapete da sala para fazerem as pulseiras de miçangas de Hobi que era marca registrada do rapaz animado, festejos de coloridão que, apenas ao bater os olhos, podia quase sentir as ondulações de serotonina em seu cérebro.

E estava com o celular em mãos, já teclando os números em pé na pequenina varanda quando o viu — um vulto alaranjado à metros de distância, no terraço do condomínio ao lado onde um rapaz provavelmente com idade semelhante a sua se recostava numa cadeira, e um felino avantajado insistia em o atrapalhar de ler o livro que segurava em mãos, empurrando-o com a cabeça como quem pedia insistentemente por carinho e atenção. Da mesma forma que Kira fazia consigo.

Jimin não soube o que pensar.

Primeiro, o seu cenho se franziu e jurou estar vendo errado, por um momento, coçando os olhos e tudo o mais, as mãos se apoiando na batente do cercado metálico — num instante todo o medo irracional e cotidiano de cair precipício à fora se evaporando —, captando atento e certeiro a marca difusa de coração laranja nos pelos do felino, exatamente a única e peculiar que Kira continha, e que uma vez há muito tempo fora uma característica usada como barganha para levá-lo para casa.

Franzindo os olhos como se voltasse ao nono ano e não usasse lentes para sua míopia — Jimin odiava usar óculos - observou o rapaz de fios negros como o breu e o reconheceu num murmúrio, Min Yoongi; usava casacos fofos de brechó, tinha amigos que falavam alto demais e os olhos humanos mais felinos que Park já vira, afiados e... charmosos, curva bela que já lhe causou batimentos de súbitos acelerados ao se encontrarem por aí —
embora não fosse confessar isso nunca a ninguém.

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