Capítulo 7

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À noite, depois de estudar um pouco, ligo para o Fumikage. Meu primeiro instinto foi ligar para o Denki a fim de lhe contar sobre Mezou e Neito, mas, se não me forço a estudar, isso não acontece, e estou ansioso para acertar minha dívida com a Ochako. Tokoyami atende ao telefone, e ouço a música altíssima ao fundo. Por um instante, minha respiração fica presa na garganta. Quando Shindo morreu, roubei o iPod dele e fiquei ouvindo suas músicas sem parar... na sala de aula, no meu sono, enquanto eu corri por quilômetros indefinitivamente. O álbum dele, xx, da banda The xx, sempre era o último a tocar e, quando parava, o mesmo acontecia comigo. Era difícil demais apertar o play de novo, recomeçar, sair da cama.

- Olá, Hitoshi Shinsou. Estou preso?

Respiro novamente.

- Não. Preciso lhe pedir um favor.

Ele solta uma risadinha.

- Eu não sabia que estávamos nesses termos de pedir favores.

- Não estamos, não necessariamente, mas temos muito em comum. Nós dois fomos traídos por um encontro lascivo entre Mezou Shouji e Asui Tsuyu.

- Essa é uma forma leve de discutir um assunto bem pesado.

- Sim, mas é a vida, e, se a gente ficar sério demais, vai se afogar nela.

Estico-me na cama e chuto as pernas para cima, contra a parede, apoiando os pés em um pôster da seleção americana feminina de futebol.

- Você é um filósofo e tanto.

- Na verdade, não. Vamos direto ao ponto. Queria lhe pedir que fosse a um encontro. - Segue-se uma pausa. - Não comigo. Com alguém mais parecido com você. Ela é excêntrica. E bonita. Tem um certo je ne sais quoi.

- Você não me disse nada de concreto.

- Ela fala um pouco de francês, faz um pouco de balé e é uma hacker e tanto.

Ele fica em silêncio e verifico o celular para ter certeza de que a ligação não caiu.

- Hitoshi, você se lembra de que a minha ex-namorada acabou de morrer, certo?

- Como disse, seria um favor para mim. - Procuro desesperadamente um argumento mais convincente. - Será uma boa distração. Sair de casa. Desligar essa música depressiva.

- Não saia do futebol para ser líder de torcida, Hitoshi.

- O que falei acabou soando errado. Quando meu irmão morreu, a única coisa solitária que me mantinha sã era sair e fazer coisas. Sei que luto é diferente para todo mundo, mas...

A voz dele fica mais suave quando se pronuncia de novo:

- Sinto muito quanto ao seu irmão. Mas não gosto muito de fazer coisas. Além disso, sou entediante num encontro.

- Acho que você seria um cara eletrizante num encontro - digo.

Ouço uma risada abafada e, sem querer, fico ruborizado. Foi algo idiota a dizer.

- Você sabe que sou um suspeito em um caso de assassinato, certo?

- Não se trata oficialmente de um caso de assassinato, não?

- Não sei. Eles não usaram essa palavra quando me interrogaram, mas já fui chamado para interrogatórios duas vezes. Não é um bom sinal.

Contenho um suspiro de alívio. Se estão focando no Fumikage, não focarão em nós. No fim das contas, talvez Tomoko nem faça o acompanhamento. Mas ainda devo o encontro à Ochako.

Garotos como nósOnde histórias criam vida. Descubra agora