À noite, depois de estudar um pouco, ligo para o Fumikage. Meu primeiro instinto foi ligar para o Denki a fim de lhe contar sobre Mezou e Neito, mas, se não me forço a estudar, isso não acontece, e estou ansioso para acertar minha dívida com a Ochako. Tokoyami atende ao telefone, e ouço a música altíssima ao fundo. Por um instante, minha respiração fica presa na garganta. Quando Shindo morreu, roubei o iPod dele e fiquei ouvindo suas músicas sem parar... na sala de aula, no meu sono, enquanto eu corri por quilômetros indefinitivamente. O álbum dele, xx, da banda The xx, sempre era o último a tocar e, quando parava, o mesmo acontecia comigo. Era difícil demais apertar o play de novo, recomeçar, sair da cama.
- Olá, Hitoshi Shinsou. Estou preso?
Respiro novamente.
- Não. Preciso lhe pedir um favor.
Ele solta uma risadinha.
- Eu não sabia que estávamos nesses termos de pedir favores.
- Não estamos, não necessariamente, mas temos muito em comum. Nós dois fomos traídos por um encontro lascivo entre Mezou Shouji e Asui Tsuyu.
- Essa é uma forma leve de discutir um assunto bem pesado.
- Sim, mas é a vida, e, se a gente ficar sério demais, vai se afogar nela.
Estico-me na cama e chuto as pernas para cima, contra a parede, apoiando os pés em um pôster da seleção americana feminina de futebol.
- Você é um filósofo e tanto.
- Na verdade, não. Vamos direto ao ponto. Queria lhe pedir que fosse a um encontro. - Segue-se uma pausa. - Não comigo. Com alguém mais parecido com você. Ela é excêntrica. E bonita. Tem um certo je ne sais quoi.
- Você não me disse nada de concreto.
- Ela fala um pouco de francês, faz um pouco de balé e é uma hacker e tanto.
Ele fica em silêncio e verifico o celular para ter certeza de que a ligação não caiu.
- Hitoshi, você se lembra de que a minha ex-namorada acabou de morrer, certo?
- Como disse, seria um favor para mim. - Procuro desesperadamente um argumento mais convincente. - Será uma boa distração. Sair de casa. Desligar essa música depressiva.
- Não saia do futebol para ser líder de torcida, Hitoshi.
- O que falei acabou soando errado. Quando meu irmão morreu, a única coisa solitária que me mantinha sã era sair e fazer coisas. Sei que luto é diferente para todo mundo, mas...
A voz dele fica mais suave quando se pronuncia de novo:
- Sinto muito quanto ao seu irmão. Mas não gosto muito de fazer coisas. Além disso, sou entediante num encontro.
- Acho que você seria um cara eletrizante num encontro - digo.
Ouço uma risada abafada e, sem querer, fico ruborizado. Foi algo idiota a dizer.
- Você sabe que sou um suspeito em um caso de assassinato, certo?
- Não se trata oficialmente de um caso de assassinato, não?
- Não sei. Eles não usaram essa palavra quando me interrogaram, mas já fui chamado para interrogatórios duas vezes. Não é um bom sinal.
Contenho um suspiro de alívio. Se estão focando no Fumikage, não focarão em nós. No fim das contas, talvez Tomoko nem faça o acompanhamento. Mas ainda devo o encontro à Ochako.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Garotos como nós
RandomHitoshi Shinsou pode ter segredos sombrios, mas passado é passado, e ele se reinventou por completo. Agora ele é uma estrela: um jogador de futebol cujo grupo de lindos e populares amigos comandam uma escola particular. Porém, quando o corpo de uma...