Capítulo 13

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(Imagem meramente ilustrativa que peguei no Pinterest)

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Lianne falava de Samael com frequência na Lojinha.

– Nossas personalidades se completam. Ele é bem curioso e eu consigo responder suas perguntas. Ele é bem quieto e escuta tudo o que eu digo. Eu prefiro filmes e ele prefere livros, o que nos trás visões interessantes sobre filmes baseados em livros. Eu tava pensando: se ele é bigênero quer dizer que eu sou bissexual? Eu nunca me atraí por mulheres, então...

Ela estava tão concentrada na personalidade dele que nem se importava quando "ele" era "ela". Ela até perguntou como ele prefere ser chamado e ele disse que não se importa de ser chamado de "ele" ou de "ela". Tanto faz, basicamente. A aparência dele deixou de importar quando ela mergulhou para explorar sua personalidade. Estava se dando tão bem com Samael que queria expor sua felicidade. Me falava com frequência demais sobre ele.

Naquela tarde uma mulher de olhos verdes e cabelo preto entrou na loja. Meu coração quase parou. Ela parecia muito com alguém que me envolvi há anos, mas sua altura denunciava que não era a mesma pessoa – as pessoas não ficam mais baixas, certo? E se eu lembro bem o nariz também era diferente. Ainda assim eram bem parecidas.

– Boa tarde. – ela disse, sua voz era fina.

Naquele momento meu cérebro começou a ignorar tudo o que Lianne falava. Eu olhava para ela e olhava para a mulher lembrando do passado.

Minha mente mudou a aparência daquela mulher: agora ela estava mais alta, não tinha seios, seu cabelo era longo e as bochechas rosadas pela timidez frequente. O meu primeiro amor.

A primeira vez que nos vimos foi numa aula de história. Eu tinha 17 anos e ela era nova na escola. Nunca esqueci quando aqueles olhos verdes piscaram para mim, envergonhados, e me pediu ajuda na aula. Sua voz era grossa e ela era muito mais alta do que eu.

– Me chame de Amanda.

– Claro. Desculpe... Amanda.

Ela sorriu e naquele momento nossa amizade começou.

Foi tudo tão rápido. Sentir tanto carinho por uma menina quase me destruiu. Fiquei um bom tempo tendo crises diárias. Sentia que havia algo errado comigo.

– Argh, olha aquelas duas ali. Um desperdício, duas moças são bonitas. – foi o que ouvi da minha mãe quando passamos por um casal na rua.

Entretanto eu ignorei todas as minhas crises quando Amanda se confessou para mim. Fiquei tão feliz! E apesar do medo do que meus pais podiam pensar e medo do que as pessoas podiam fazer conosco, eu criava coragem quando via suas unhas pintadas e seu sorriso. Amanda sempre foi tão corajosa! Sempre exibindo sua feminilidade, mesmo que as pessoas falassem que ela é um menino.

Eu realmente a amei. Mesmo com as piadas e ofensas eu continuava a chamá-la de namorada. Na escola eu ouvia tantas coisas horríveis e quando respondia alguma ofensa geralmente eu ganhava um hematoma. Apesar disso éramos felizes. Eu era hipnotizada pela delicadeza dela e ela dizia admirar minha gentileza.

O problema foram nossos pais. Quando falei de Amanda meu pai bateu no meu rosto, minha mãe me humilhou com palavras – ela me xingou e ligou para o resto da família apenas para ter mais pessoas falando mal de mim. Eu pensava que conseguia aguentar! Sabia que Amanda não era bem aceita pelos pais e quis ser forte por ela. Foram difíceis os três dias em que minha mãe me ignorou completamente e meu pai só me dizia coisas ruins. E quando de repente eles ameaçaram me expulsar eu me vi sem chão. Eles sempre me defendiam e me tratavam bem, foi um choque essa mudança apenas porque eu disse que sou lésbica. E eu não queria morar na rua. Eu sabia que os pais de Amanda também a trataram mal e ela queria suportar por mim, mas nós duas não podíamos viver na rua – por isso tive que desistir do meu primeiro amor.

– Me desculpe por não ser forte o suficiente.

Eu me culpei. Devia ter sido mais forte, devia ter tentado mais. Nunca tive noção do tamanho da dor que causei. A última vez que vi Amanda foi quando nos separamos. Eu a procurei quando consegui meu primeiro emprego, mas ela se mudou e deletou as redes sociais. Nunca mais tive notícias.

– Acho que eu tô apaixonada por ele. Eu tô? – Lianne puxou a minha mente de volta.

– Você... ta apaixonada?

– Eu num sei. Tu acha que eu tô?

– Você que tem que saber!

Ela apoiou um dedo na bochecha e fez uma expressão de dúvida. Eu gostava bastante dela, como amiga. Eu achava que tinha uma vida frívola até que ela me mostrou que é possível ser feliz sendo simples. Eu só não tinha aprendido isso ainda.

"Ah, agora lembrei por que eu não queria fazer amizade com ela quando nos conhecemos", pensei, "é porque eu estrago tudo".

Lembrar de Amanda fez a minha autoestima baixar por completo. Fiquei com medo de ser magoada por Lianne e, pior ainda, magoá-la. Senti que de alguma forma eu ia estragar tudo outra vez.

Samael e LianneOnde histórias criam vida. Descubra agora