25 de Junho de 1919
Querido amigo diário, ou apenas diário.
A real razão de ter aceitado a sugestão de escrever em um livro vazio eu ainda preciso descobrir, pareço uma completa estranha escrevendo para outro completo estranho que não fala e que nunca lerá qualquer palavra colocada aqui, mas eu sei que um dia morrerei e nem mesmo memórias restarão sobre minha existência neste mundo, então ao menos, caso alguém venha a ler o meu dia a dia tedioso, em um futuro distante o qual espero demorar para chegar, já que não quero morrer assim tão jovem e bonita, estarei escrevendo a partir do dia de hoje minha rotina prolixa e às vezes desafiadora.
Devo começar apresentando a mim mesma, certo? Bem, se este for o caso, vos apresento Kim Bora. Não tenho muito a dizer sobre mim. Sou filha única, com 23 anos e meu ofício neste momento é ler livros para as crianças na escola e ensiná-las a ler e escrever. Não sou uma escritora ou profissional em minha língua nativa, porém fazer isso é o que eu sei e o que me dá satisfação no momento. É uma profissão básica e inofensiva no início, mas que com o tempo tornará essas crianças fortes, com princípios, com vontades, ideais, desejos e sonhos que se realizarão, é algo que as fará crescer com caráter e que no futuro serão capaz de derrotar qualquer um que os ouse desafiá-los ou afrontá-los. Eles não permitirão que sejam diminuídos por qualquer um que seja, pois o peso de suas palavras em um vocabulário é capaz de destruir qualquer coisa em questão de um mísero segundo. As palavras têm um poder absoluto, tal poder capaz de mudar o destino de uma nação inteira, salvar vidas ou até mesmo tirá-las. Eu sou responsável por ensiná-las a usarem-nas. Talvez em breve as palavras que ensinei sejam ditas de maneiras cruéis pelos tais. Essa tal responsabilidade será minha e terei que levar as lamentações de pessoas feridas com elas para meu túmulo, mesmo sem eu saber. Ao menos, é nisso que eu acredito.
Meus pensamentos e lógica podem não fazer sentido para muitas pessoas, incluindo minha família. Não apenas meus pensamentos, como meus sentimentos também são totalmente ignorados e incompreendidos. Isso me faz pensar constantemente que não sou uma pessoa normal e que não pertenço a este mundo. Me entristece saber que sou alguém incapaz de receber amor por ser quem sou, não apenas a mim, mas também por aqueles que são como eu e se escondem atrás de máscaras e disfarces comuns, torço para que chegue o dia em que meus sentimentos serão compreendidos e nunca julgados pelas pessoas ao meu redor, mas enquanto este dia não chega, terei de deixá-los enterrados bem profundamente em meu coração.
Uma pergunta que se pode fazer para mim é: Como sabes que é incompreendida se nunca contou aos familiares o que sente de fato? Ah, certo, lhe digo então. Eu apenas sei. E como sabes? Simples, meu caro; na época em que estou vivendo, pessoas como eu são mortas nas ruas, presas, vistas como algo pecaminoso e desprezível. E sobre minha família, ela apoia as pessoas que matam as semelhantes a mim. Já perdi as contas de quantas vezes ouvi minha querida mãe dizer que prefere uma triste e dolorosa morte ao ter um filho ou filha que ama um igual, pois segundo ela, seu filho ou filha traria desonra, humilhação e outras incontáveis desgraças que nem mesmo eu sabia que existiam. É por isso que minha única solução é esconder de mim mesma tudo o que já passei a sentir antes e não me permitirei a sentir novamente, até o dia de meu casamento com um pretendente que minha progenitora escolher.
Digo por aqui com honestidade que comecei a gostar de escrever isto e passe a tratar o hábito com mais carinho e respeito, devo escrever também que desabafar para uma folha em branco e para mim mesma, desperta ânimo e alivia-me os músculos e o cérebro. Kim Bora está escrevendo um diário e este é o diário de Kim Bora, ambos encerram seus votos prometendo apenas entregar o conteúdo escrito para futuristas que por engano poderão encontrar estes registros. O que devo escrever por agora? Até logo? Ou até outro dia? Isto ainda irei descobrir, até lá, apenas esta primeira página será o início da minha história.
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Lótus
RomanceO século XX poderia ser comum para qualquer um, ou qualquer casal, menos para Kim Bora e Lee Siyeon. Duas mulheres que por um interesse em comum se apaixonam e decidem se comunicar secretamente por meio de cartas para que se safem da punição do crim...