Encantado

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Nós deitamos tão agarradinhos pra dormir que parecia mesmo que ele era apenas meu ursinho. Acordei antes de todos preparei café e acordei meu namorado com muitos beijos naquele corpinho delicioso, João Tiago é do tipo magro, mas tem uma musculatura natural que mexeu com meu juízo a noite inteira. Precisei me concentrar e não acordar o garoto que ainda teria aula pela manhã. Carina apenas sorria ao ver nossa interação durante o café, fui deixar meu ursinho na porta da escola e de lá fui visitar minha avó.

Quando parei na porta da frente da casa onde cresci, minha avó varria a varanda distraída, cantava alguma cantiga de roda, porque era o que mais sabia fazer. A saudade apertou em cheio meu peito, mas ela sabe o quanto é importante minha busca pela quebra desse feitiço da Cuca.

- Vai entrar ou ficar aí todo abestalhado?³⁴ Te vi chegar menino, então apenas entre em casa e passe um tempo com essa pobre velha. - sorriu toda linda com aquela pele levemente enrugada.

- Sua benção!

- Que Deus te abençõe. Veio da cidade? Seu tio tá bem?

- Vim da cidade, mas não das bandas do Amazonas. O tio tá bem, já acabou minhas aulas, tirei boas notas como a senhora sempre pede. Também trago novidades, conheci o Pedro, que estudou com o tio Marcos, ele é o pai do menino que pode ser a minha salvação.

- Ainda achando que é um homem que vai te salvar? - não era uma bronca.

- Até a Caipora acha que é ele.

- Aquela menina sem juízo? Desde quando ela entende de sentimento. Chega mais, vamos tomar café com bolo de milho, na volta tu levas pro Pedro, ele adorava meu bolo, uma vez achei que ele seria meu genro. Peguei ele e seu tio aos beijos, mas, nunca passou disso e depois ele conheceu a Mariana. Casou com ela que parecia não segurar o filho até que veio o primeiro menino, mas a sorte não estava com ela e depois disso eles foram embora daqui, tu já era um pivete, não parava quieto e agora Pedro volta pra minha família através do filho dele. O mundo é um ovo. Conta mais sobre isso. - e eu contei, por boa parte da manhã, fizemos o almoço juntos como antes e depois que lanchei voltei pro vilarejo, ia jantar com o meu gatinho e precisava chegar bem vestido e cheiroso, e ainda tinha o pote com o bolo de milho pro meu sogro. 

 Quando cheguei na casa do meu ursinho, os pais dele tinham ido até a margem do outro lado do rio para levar as coisinhas do enxoval que já estavam prontas. Então ajudei com o jantar e entre um beijo e outro fomos nos conhecendo melhor, algumas coisas que temos em comum, outras tantas onde discordamos e a surpresa do inesperado.

- Eu sei o que você procura Beto, ou seria boto?

- O quê, do que me chamou? - aquilo gelou minha alma.

- Vi seus amigos te levando até a beira do rio na noite em que me salvou dos amigos idiotas do Doca. - levantei com tudo queria correr dali. - Espera Beto, me deixa falar. Depois, se quiser mesmo ir, vou entender.

- Benefício da dúvida, minha avó diz que todos merecem em um momento. Pode falar, desembucha.

- Voltei pra agradecer, quando me afastei o bastante senti algo diferente, como se fosse um puxão. Aí quando eu voltei a menina te segurava nos braços, tu estavas quase que deitado sobre ela, te achei um galinha, tinha acabado de falar pra te chamar de meu amor. Pensei, que safado tem namorada e queria uma rapidinha. Então chegou primeiro uma luz esquisita, e depois apareceu um homem que te carregou até a beira do rio. Fui abicorando de longe, não queria ser enxerido, até que tu caiu na água e depois apareceu, parecia falar com a menina e com o cara e depois afundou. Aí eu corri como quem foge da mulher de branco. Até te encontrar na praia naquela tarde onde te esperei todos os dias, fiquei matutando e matutando, o Doca já tinha me encontrado na festa da noite anterior, os amigos dele me viram contigo só na hora que já vinha embora, que foi quando te encontrei e não falei nem um oi. Pela manhã recebi um bilhete e era do Doca, ele dizia que tava arrependido e queria me encontrar, que precisava acertar comigo nossa relação que ia falar com o pai. Mas, não respondi, já tinha terminado com ele e não ia voltar atrás.

- Porque me chamou pra vir aqui naquela hora?

- Eu falei pro meu pai que demorei a voltar porque tinha encontrado o meu namorado. Meus pais são ótimas pessoas e te amaram de cara, tu mesmo sentiu isso. Não queria esconder mais que já sabia que tu era o boto, mas não o que sempre arrebenta as redes, não só a do meu pai, todos os pescadores conhecem o boto brigão, é como eles chamam o tal. Nunca acreditei na lenda até aquela noite.

Antes que eu pudesse responder, a porta da frente se abriu e ouvimos os pais dele chegando. Sorri, e fui cordial como eles mereciam, entreguei o pote de bolo que minha avó mandou. Seu Pedro ficou feliz igual pinto no lixo, mas a dona Mariana percebeu o clima entre o ursinho dela e eu. Aí ela perguntou se estava tudo bem entre nós, quando não soube o que responder, João se adiantou.

- Ciúmes, apenas isso mãe. O Beto me levou na escola antes de ir visitar a avó... 

- Acostume-se ursinho, seu namorado é lindo e um garotão assim vai chamar atenção sempre e em qualquer lugar.

- Na verdade sogrinha, o ciumento aqui da relação é eu. Nosso ursinho tem alguns amigos que não sou muito fã. Então, estamos tentando ajustar algumas coisas.

- Sabe Beto, te ouvir chamar meu filho de nosso ursinho me faz feliz. Como vai a dona Miloca? - meu sogro é muito foda, muda logo de assunto.

- Tá bem, disse pra ir lá com ela quando puder e levar a minha sogra. 

- Pai, mãe, porque não vão tomar banho enquanto termino o jantar com o Beto, vocês devem querer um bom banho, atravessaram de canoa o rio. 

Assim que eles saíram em direção ao banheiro que fica nos fundos da casa ele me olhou ainda cabreiro.³⁵ Nossa conversa foi interrompida e pra sorte dele num bom momento, estava mordido de raiva por saber que ele mentia, mas agora mais calmo entendo as razões.

- Então?

- Quer mesmo saber minha resposta? - Larguei as coisas que estava cortando sobre a mesa e levantei, cheguei mais perto dele só pra intimidar. Vi o medo correr nos olhos dele quando olhei na direção da porta da frente. - Me encantei quando te vi, tá meio tarde pra sair correndo, então é melhor se acostumar e começar a me chamar de meu amor.

- Prefiro Beto, meu boto. 

Então me beijou, precisou esticar o corpo pra chegar na minha boca, esqueci até que ele deveria prestar atenção nas panelas, segurei meu ursinho pela cintura e meti a língua na boca dele, delícia de beijo. E já beijei muitos caras e garotas antes, mas o meu ursinho tem mais encanto que o canto da Iuara. Me afastei sorrindo e voltei a cortar as coisas, afinal ele mesmo queria fazer o jantar segundos antes.

- Maldade!

- Quer mesmo que teus pais voltem e peguem a gente sem roupa? Sinto muito, mas esse corpinho aqui é só teu ursinho.

- Doido.

- A culpa é tua.

Continuamos o que precisava ser feito pro jantar, a conversa ficou mais tranquila e quando os pais dele voltaram o clima era de amor outra vez. Ele pode até não me amar, mas tá me fazendo bem.

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³⁴ cara de bobo;

³⁵ com medo;

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Hei babys, todos bem?

Estamos chegando ao fim. Mas não se preocupem, logo logo tem mais.

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