Capítulo 7 - "8"

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Chaves estava no pátio da vila jogando futebol com a grande bola de Quico. Após um chute aleatório a bola entrou pelo corredor, sendo seguida pelo garoto.

— Ele vem com a bola...

Chaves surgiu pelo corredor da vila, ao lado da casa de Seu Madruga, e entrou no pátio carregando a bola de futebol em seus pés.

— Dibra um... Dibra dois, passa o terceiro e...

Com um pontapé a bola vai em direção ao portal de entrada da vila. Assim que Chaves viu que tinha acertado o centro daquele arco, comemorou.

— GOOOOOL!

Correu eufórico para buscar a bola e quando a agarrou percebeu que estava pesada demais. Ao olhar para baixo viu que não agarrava uma bola, mas sim a grande barriga do Senhor Barriga. O homem estava deitado de costas no chão, desmaiado com sangue escorrendo de sua cabeça. Chaves foi tomado de um medo repentino e saiu correndo pelo corredor de onde havia surgido.

No pátio em que surgiu encontrou Seu Madruga martelando algumas peças de madeira.

— Seu Madruga! Seu Madruga! Acho que o Senhor Barriga está passando mal!

O homem continuou o seu trabalho, martelando alguma coisa sem nem levantar os olhos para Chaves.

— Está passando mal, ou você o fez passar mal?

Chaves ficou assustado. Não queria confessar que ele tinha acertado Seu Barriga e o machucado. Talvez até causado sua morte. Enquanto remexia os pés e mãos nervosamente pensando em uma desculpa, desviou o olhar para os lados percebeu que aquele pátio estava diferente. O chão não era de cimento ou calçamento, mas de terra batida. As casas no entorno pareciam abandonadas e muitas já não estavam mais ali. A fonte de água agora era um poço artesiano. O céu era marrom e poeirento. Quando tornou a olhar para onde Seu Madruga estava, encontrou o rosto do homem quase colado ao seu.

— Nós devemos assumir as consequências por nossos atos, Chaves! — Disse Seu Madruga.

Mas não era Seu Madruga. Ou era. Mas diferente. Era mais velho. Usava um capacete na cabeça, ao invés do chapéu jeans. Tapando seus olhos usava uns óculos de aviador e um colete de couro que não combinava com ele, se sobrepondo a camiseta que Chaves também não reconhecia.

Ou reconhecia?

O pensamento o fez rodopiar. Aquela imagem não era novidade para ele. Conhecia o homem, conhecia o lugar que estava. Aquilo não era um sonho. Era uma lembrança.

Seu Madruga mais velho não tinha parado seu sermão.

— O que acontece é que toda ação que tomamos influencia outra pessoa. É a causa e efeito. Não existe escapatória. Mas você pode pedir perdão pelas ações que prejudicaram outra pessoa.

Chaves não tinha certeza se estava entendendo o que Seu Madruga dizia. Pensava que se aquilo fosse um sonho, ele poderia controlá-lo. E decidiu que iria controlá-lo. Saiu correndo de perto de Seu Madruga, avançando alucinadamente pelo corredor entre duas construções destruídas enquanto pensava em uma praia gostosa em Acapulco. Passou por uma porta giratória e assim que conseguiu adentrar o recinto viu seu barril, bem próximo à escada do pátio da vila. Chiquinha se levantou de trás dele e fez uma careta para Chaves.

— Não me pega, nanananana na.

Assim que Chiquinha saiu correndo em direção ao portão de entrada da vila, Chaves não se demorou a segui-la. Porém trombou com Seu Madruga entrando por aquela porta. Agora era o Seu Madruga que ele lembrava de viver na vila, com camiseta preta, chapéu jeans, bigode e costeletas bagunçados. Lembrou-se do encontro com o Seu Madruga mais velho lhe dizendo sobre a reparação das ações que atingiam a outros e então entendeu o que ele quis dizer: precisaria pedir desculpas pela bolada que acertou o Senhor Barriga. Abaixou seu olhar para o chão, onde tinha abandonado o homem gordo, mas não viu mais nada. Nem homem nem sangue. Então dois pés surgem em seu campo de visão acompanhados de um pneu. Chaves levantou o olhar e encontrou Jaiminho.

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