Ela - Português

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  Acordo com o barulho do despertador e antes mesmo de abrir os olhos, jogo meu braço direito para o outro lado da cama querendo envolvê-la em um abraço, mas sinto o colchão frio e vazio ao invés de seu corpo aquecido. Levo cinco segundos para entender o motivo da sua ausência á essa hora da manhã, já que ela nunca acorda antes das 10h.
  Mas assim que eu entendo, sinto lágrimas escorrerem pelo meu rosto ao lembrar daquela maldita ligação e desejo profundamente que eu nunca tivesse acordado. Doeria menos do que lembrar. Bem menos.
  Limpo as lágrimas com força com as costas da mão e me levanto da cama. Quando chego no banheiro vejo que é inútil tentar secar o rosto, elas vão continuar caindo não importa o que eu faça. Desvio os olhos do espelho, em parte porque é uma visão ridícula (o inchaço do choro não ajudou em nada a cara de sono), e em parte porque eu odeio tudo isso.
  Eu achava que com o tempo as coisas iam melhorar, mas mesmo depois de quase um ano eu ainda me derramo em lágrimas ao acordar e perceber que ela nunca vai voltar. Claro que já não é tão ruim quanto antes. Nos primeiros meses eu acordava gritando seu nome todas as manhãs. Agora eu não grito mais. Pelo menos não na maioria das vezes.
  Não que nada disso signifique alguma coisa, é claro.   
  Ainda sinto vontade de destruir o quarto todas as manhãs. Quero dizer, não vale a pena manter as coisas em ordem se ela não estiver aqui para desarrumar tudo. Mas não posso deixar Alex ainda mais preocupado. Não seria justo. O cara mal teve tempo de sentir o próprio luto porque cuidou de mim por meses. Sempre soube que éramos melhores amigos, afinal crescemos á um corredor de distância um do outro. Mas o que ele fez por mim vai além da definição de amizade no dicionário.
  Tomo um banho rápido e quando volto para o quarto, olho para o armário aberto sem saber o que vestir. Tento imaginar o que ela escolheria e quase rio da obviedade da resposta. Se dependesse dela eu usaria minha calça de moletom todos os dias. Em suas palavras: "Ei, não é culpa minha se sua bunda fica tão gostosa nessa calça!". Mas isso não depende mais dela.
  Escolho uma camisa qualquer e saio do quarto com um suspiro. Pego o celular, a carteira, as chaves de casa e uma maçã. Não que eu tenha tido fome de manhã alguma vez na vida, mas se Alex tiver a mínima suspeita de que eu não comi nada desde o almoço de ontem, ele me puxa pela orelha de volta pro meu apartamento.
  Assim que passo pelo portão do prédio, meu melhor amigo para o carro com o mesmo sorriso de sempre. Me lembro de todas as noites em que ele dormiu comigo só para ter certeza de que eu descansaria. Ou de todas as vezes em que ele implorou para que eu tomasse pelo menos um copo d'água.
  Depois do acidente, Alex não saiu do meu lado até se convencer de que eu já estava bem o suficiente para voltar a morar sem ele na minha própria casa. Afasto as memórias da cabeça e entro no carro.
  Alex me conta de algum projeto novo do escritório onde trabalha enquanto dirige, mas não consigo me forçar a prestar atenção de verdade. Meu cérebro me leva a vários lugares diferentes mas nenhum deles é a sala onde o cara sentado do meu lado passa o dia. Na verdade, a maioria deles não têm nada a ver com ele. Mas sim com ela.
  Desde o dia em que eu a conheci, aquela garota nunca mais saiu da minha cabeça. Eu costumava sorrir toda vez em que pensava nela, um sorriso cheio de saudade e felicidade. Ainda sorrio de saudade, mas a felicidade se foi junto com ela.
  Ela era a mulher da minha vida. Eu sabia, ela sabia e eu aposto que qualquer um que olhasse para a gente na rua sabia também. Não passava um dia sem que eu a lembrasse do quanto eu a amava.
  As pessoas dizem que é melhor ter amado e perdido, do que nunca ter amado. Talvez um dia eu olhe para trás e concorde com isso, mas hoje não há nada que eu não faria para tê-la de volta em meus braços. Mesmo que seja por só mais um minuto. Mesmo que seja só por um último beijo e uma despedida.
  Saio do meu transe quando Alex estaciona o carro. Me surpreendo por não ter lágrimas escorrendo pelo meu rosto de novo. Talvez eu já chorado demais e não existam mais lágrimas para saírem dos meus olhos. Sinto o canto da boca se levantar em um meio sorriso ao perceber que se dissesse isso para ela, ela reviraria os olhos e soltaria uma risada.
  Acho que essa é a minha vida agora: sorrir por coisas que ela sorriria. Ela sempre foi o meu sol, iluminando tudo aquilo que eu não conseguia ver. Acho que agora sou eu quem vai ter que iluminar o caminho.
  Balanço os ombros e saio do carro de Alex. Vejo que ele me espera para entrar no prédio á nossa frente e apenas cinco palavras passam pela minha cabeça: Queria que ela estivesse aqui.

-nina :)

Creative from Dusk to DawnWhere stories live. Discover now