Epílogo

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Eu ainda me surpreendia quando olhava pela janela e via os prédios gigantescos, o trânsito insuportável da cidade grande — nem era uma cidade tão grande assim, mas tinha seu mérito. Era muito maior que Santa Terezinha, que nem universidade tinha. Para uma pessoa que olhava pela janela e via plantações de soja, essa era uma grande evolução.

— A Pri já está online! — gritou Larissa, e eu me afastei da janela da cozinha e corri para nossa sala minúscula. Só havia espaço para o sofá e a televisão, não havia nem mesinha de centro, então o computador estava apoiado numa almofada.

A imagem de uma Priscila sorridente surgiu na dela, ela ajeitava seus longos dreads e piscava por trás dos óculos.

— Estou oficialmente namorando! — declarou, e eu bati palminhas, apoiando as mãos nos ombros da Lari, sentada em minha frente. Tive de me controlar para não beijar o pescoço exposto dela, lembrar que Priscila estava nos vendo.

Vantagens de morarmos sozinhas é que não tínhamos muitos limites quando se tratava de sexo.

— Vi no Facebook! E aí? Teve um pedido romântico? Como foi? — Eu estava animada. Havia visto a foto que a Pri postou com o namorado, logo depois deixei vários comentários com emojis fofos na atualização do status de relacionamento dela.

— O Rafa é... tudo o que eu sempre quis — suspirou com um sorriso, e eu sorri junto. Se tinha alguém que merecia isso, esse alguém era ela.

Eu havia acompanhado as aventuras amorosas dela no primeiro ano de faculdade — Pri sempre se desiludia porque as pessoas eram simplesmente horríveis. Ela dizia que a questão racial atravessava muito sua vivência como assexual, porque as pessoas tendiam a vê-la de uma maneira sexualizada, mais um desses estereótipos racistas.

Aquilo me deixava furiosa! Pri era uma pessoa incrível e tão complexa! Eu ficava muito feliz que ela tivesse conhecido alguém que estava lhe fazendo bem, que a via por inteiro — e a carinha de felicidade dela me confirmava que Rafael lhe fazia muito bem.

Conversamos por quase duas horas, Rafael apareceu por poucos minutos — simpático e sorridente como a Pri, olhar carinhoso sobre ela. Gostei dele imediatamente.

Depois de desligar a chamada e fechar o computador, sorri para Lari. Ela era tudo o que eu queria. Ela, nosso apartamento, a faculdade. Tudo simplesmente se encaixava, espantando toda aquela bagunça adolescente durante o ensino médio.

Acho que crescer é isso, afinal. Nem sempre tudo é claro, mas as coisas se encaixavam. Assim como eu me encaixo com Lari. E eu amava cada pedaço da nossa vida imperfeita e completamente encaixada.

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