A delegacia de homícidios ficava no centro de Montes Claros, próxima a praça Coronel Ribeiro. Era um prédio pequeno de dois andares amarelo desbotado. Um prédio meio antigo, com a data de construção ignorada. Mas parecia ter resistência. Jonas suspirou aliviado. Finalmente o inquérito sobre o roubo na joalheria no centro da cidade tinha se encerrado.
A joalheria ficava perto da delegacia, praticamente debaixo do nariz da polícia. Os ladrões cada vez mais se sentiam à vontade para cometerem seus delitos, e a investigação tinha sido arrastada e cansativa. Ultimamente tinha sido assim. E a maior parte dos homícidios estava relacionada diretamente ou indiretamente com o tráfico de drogas. As vítimas eram cada vez mais jovens. Era lamentável ver jovens matando ou morrendo por coisas insignificantes.
Mas olhando pelo o lado da investigação em si, Jonas se sentia frustrado com aquele tipo de crime. A vítima, na maioria dos casos, andava pela calçada ou estava sentada em um bar, e do nada aparecia uma moto com duas pessoas e disparavam os tiros.
Em geral não era difícil pegar os culpados porque eram muito descuidados. Várias unidades da polícia eram acionadas e conseguia a captura dos suspeitos que, muitas vezes, acabavam confessando o crime. Como investigador, ele achava aquilo sem emoção e frustrante. Não desafiava a imaginação e a dedução do bom policial. Esse tipo de assassinato parecia impulsivo, sem planejamento, sem tato. A própria forma como acontecia, diante de várias testemunhas, é que tirava aquele ar de mistério que instiga a mente do investigador. Testemunhas demais. É claro que, nem todo testemunho era coerente, mas era só uma questão de saber peneirar.
Jonas estava na sua sala no térreo. Recostou a cabeça na poltrona e sorriu meio envergonhado consigo mesmo por pensar nas coisas daquela forma. Era ótimo quando apanhavam o culpado com rapidez. Era essa a intenção e o objetivo da polícia. Nos seus três anos como investigador, apenas duas ou três vezes ele trabalhou num caso em que teve que forçar a imaginação. Foram crimes familiares. Nada que envolvesse traficantes. Fizera o que ele realmente gostava de fazer: investigar.
Pegou o celular sobre a mesa e verificou a hora: três e vinte da tarde. Conferiu a data: nove de junho, quinta- feira. O friozinho aumentaria depois das cinco horas. Hoje ele estava ansioso para ir para casa.
_Também sou humano._ disse Jonas em voz baixa._ Não é todo dia que estou com disposição para trabalhar.
A delegada Sílvia tinha acabado de analisar alguns relatórios. Trabalho para fazer não faltava, mas se permitiu relaxar uns cinco minutos após uma dose quente de café. Dirigir uma delegacia era exaustivo de todas as formas. Um mundo totalmente diferente, mas ao mesmo tempo igual aos outros. Para Sílvia todas as profissões eram importantes. Cada uma com suas dificuldades, seus desafios, riscos.
Ninguém devia ter o seu trabalho desmerecido. Ter uma profissão significava ter um sonho realizado. Mostrava a determinação de uma pessoa por ter lutado pelo o que almejava. Representava horas de estudos, treinamento e dedicação. Às vezes era necessário abrir mão do lazer, e até mesmo de um encontro amoroso. Ela tinha passado por tudo aquilo. Orgulhava de si mesma, e das mulheres que, assim como ela, lutaram com garra para chegarem onde queriam. "As mulheres são capazes de chegarem onde querem". Essa frase ficava fixada em sua mente.
Em outros tempos uma mulher ser delegada era coisa de outro mundo, mas era um mundo que estava ficando velho e distante. Até mesmo a presidência da República a mulher já tinha chegado. As piadinhas sempre iriam existir, mas as mulheres também estavam aprendendo a contar piadas. Não foi por rebeldia feminina ou por status que entrou para a polícia. Muitas vezes sofrera por ver injustiça e impunidade. A sensação de impotência a atingia até a alma.
Foi daí que começou a crescer dentro dela o desejo de fazer algo, mesmo que fosse pequeno. Precisava reagir contra sua própria passividade. Mas fazer justiça não era fácil. Nem todo culpado era punido. Nem toda vítima recebia justiça. Uma realidade, com a qual, era duro lidar. Sílvia procurava fazer bem o seu trabalho. Graças a Deus venho obtendo bons resultados, pensou, satisfeita. Comandava sua equipe com seriedade, mas acreditava que ter leveza e harmônia naquele tipo de trabalho era essêncial para obter sucesso, e até mesmo para manter a saúde psicológica de todos.
Sílvia assustou-se com o toque do telefone em sua mesa.
_Delegacia de homicídios, boa tarde! Sim, sou eu. Onde?_ ela abriu uma agenda e começou a escrever._ A área foi isolada?_ perguntou ela com uma nota de preocupação na voz._ Muito bem, estamos indo._ Colocou o telefone no gancho, e olhou o endereço anotado na agenda.
Sílvia conhecia o bairro Esplendor. Era um dos bairros mais tranquilos da cidade. Alguns o chamavam de "bairro dos bacanas". Era raro receberem ocorrências do Esplendor e, quando acontecia, no geral, tinha relação com furtos. Mas agora era diferente. Um desânimo a invadia sempre que ela partia para um local de morte.
Sílvia passou as mãos nos cabelos castanhos claros e se levantou. Caminhou em direção à porta e saiu do gabinete.
Jonas ouviu as três batidas na porta do seu escritório e antes de ter tempo para dizer qualquer coisa, a porta se abriu. Era Sílvia. _Estou entrando!_ disse ela, dando um risinho rápido. Ela apoiu-se com uma mão na mesa de Heitor, que estava sem seu ocupante. Ele a olhou com interesse. Jonas notou mais uma vez que ela ficava bem com aqueles conjuntos de blazer com calça. Era alta e magra. O conjunto que usava hoje era preto. Sabia que ela tinha trinta e oito anos, marido e uma filha, mas não sabia detalhes da sua vida particular. Mas se tinha algo que tornava o trabalho menos penoso naquela delegacia, era a delegada Sílvia.
Ela passava segurança e tranquilidade. Apoiava a equipe, e costumava dar carta branca. Ele não gostava nem da ideia de trabalhar com um delegado que com nada contribuísse nas investigações e que pensasse só em se promover com o esforço dos subordinados. Graças a Deus por enquanto ele estava tendo sorte.
_Acabei de receber uma ocorrência de um policial militar. Do bairro Esplendor._ Sílvia falava rápido._ No caminho eu conto o restante._ Jonas levantou-se, pegou a pistola e a agenda que estavam sobre a mesa e seguiu a chefe.
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Cortina de Fumaça
Mistério / SuspenseLeonardo, um homem jovem e deslumbrante, é encontrado morto numa montadora apelidada de "Esqueleto" em Montes Claros, por uma jovem que praticava direção. Enfim, o investigador Jonas se verá livre dos crimes sem imaginação. Ele e sua equipe vão para...