Cap 1 - A Carta

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Estava frio, totalmente frio. As janelas embaçadas por dentro e bem molhadas do lado de fora. Eu sabia que seria assim quando aceitei me mudar para Londres há três anos e meio. Eu odeio esse tempo, esse cheiro, essa parte do ano, pois o inverno é sempre longo e rigoroso demais para aproveitar o calor. Porém, eu sabia exatamente de tudo isso ao dizer para minha mãe que aceitaria vir sem reclamar. Odeio tanto o clima daqui quanto odiava Austin, a cidade que moravamos no Texas antes de vir para esse freezer inglês. As pessoas de lá também me odiavam.

Encarei de forma cansada a janela ao meu lado e a chuva incessante que escorre descontroladamente pela mesma. Apesar de estar dentro da sala de aula, eu consigo ter a sensação de sentir as gotas d'água caindo sobre mim em um gelo quase que insuportável. Antes, esse tempo me ajudava a dormir, mas hoje, só consegue piorar o que nunca foi bom. As olheiras de meu rosto já fazem seu trabalho em dedurar que essa noite, tive outro daqueles pesadelos horríveis que sempre me fazem acordar suando frio e com o rosto franzido em uma careta de horror. Pelo menos agora não tem mais os gritos que acordavam a vizinha inteira de Austin.

Eu sou normal, eu sou normal...

Sempre repito isso pra mim mesma antes de sair de casa para vir estudar. Sempre me obrigo a lembrar que pesadelos são comuns, como o psicólogo disse. Que sonhar com vários corpos ao chão de criaturas assustadoras, com sangue derramado, gritos, muita poeira e luta, luta e luta é completamente normal. Parece tão errado saber que eu nunca vi outra pessoa capaz de sonhar a mesma coisa todos os dias e ainda sim tentar considerar normal. Bom, fica difícil saber se isso acontece com os adolescentes da minha idade, já que não tenho amigos aqui. Eu nunca quis, e nunca fiz questão. Hoje, vejo claramente as consequências de estar completamente sozinha, mas ainda sim não consigo ter o mínimo de arrependimento da minha escolha.

Quando o sinal ecoou, prendi a respiração, esperando que todos os alunos deixassem a sala vazia para que eu pudesse guardar o meu material devagar.

Completamente normal...

Os corredores estão tão frios quanto o vento gélido que me abraçaram assim que coloquei meus pés sobre a neve e passei o olhar pelo amplo espaço onde os estudantes andam sem olhar para trás, rumo a suas casas. Eu queria que fosse tão fácil assim, queria sentir satisfação em ir embora e simplesmente viver a minha vida em casa com a família harmoniosa e em perfeita convivência, só que, só tem um problema: o tempo não passa lá em casa. Dois dias, apenas dois dias, levam cerca de uma semana pra mim. Não que na escola fosse mais agradável, mas é uma distração melhor do que ficar olhando para o teto com a tinta descascando do meu quarto enquanto não era arrastada pelo pânico que era dormir. Minha mãe é agradável na maior parte do tempo, mas está sempre tão cansada, tão cansada.

Sempre sinto culpa por não estar arrumando um emprego em meu tempo livre para ajudar no sustento. Ultimamente as coisas não tem sido fáceis...

Coloquei uma mecha do cabelo atrás da orelha assim que apertei os dedos enluvados nas dobras do casaco e fui andando calmamente para a casa. As ruas estão cobertas de neve, então os ônibus estão reclusos. Todos estão reclusos em casa, menos essa droga de escola, que por infelicidade, continua funcionando. Talvez seja uma coincidência divina, afinal, não tem muito o que fazer no meu quarto, principalmente quando o frio entra por todas as lacunas possíveis. Nunca senti tanta falta de Austin em toda a minha vida quanto sinto agora. O tempo de lá é infinitamente mais agradável para o meu corpo.

Não demorou para que minhas botas quase soterradas fossem postas ao lado da porta e eu entrasse na casa que não está tão quente assim. Tudo está como antes, exceto pela fragrância do que parece ser comida recém feita. Indo diretamente para a cozinha, vi minha mãe sentada com a roupa de trabalho, as mãos sobre a mesa e um sorriso sereno na minha direção.

As 13 Bruxas do ZodíacoOnde histórias criam vida. Descubra agora