Capítulo 1;

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Originality consists in trying to be like everybody else, and failing.
-Raymond Radiguet

UM VENTO EXTREMAMENTE FRIO E FORTE ROÇA MEU CORPO, fazendo meu cabelo bater em meu rosto, mas eu não me importo, o telhado, mesmo nesse clima, continua sendo o lugar mais agradável desse lugar, pois, por ser uma área restrita que ninguém além de mim tem a audácia e vontade de ir, posso quase ter a sensação que estou em um lugar só meu. Além disso, o barulho do vento silencia minha mente, me dando algo parecido com o que chamam de paz, fora que tenho uma visão quase panorâmica da cidade. Hoje é noite de ano novo, por isso, as ruas estão ainda mais iluminadas, e, dessa distância, está realmente bonita. Qualquer feiura e barbaridade é ofuscada pelas luzes ofuscantes, quase como se só elas existissem.

O vento traz consigo uma leve onda de areia e detritos, o que provoca um ardor no meu rosto, me fazendo lembrar do corte recém adquirido na minha bochecha e testa. Bem, a culpa foi inteiramente minha- penso, e um sorriso ácido brota instantaneamente no meu rosto. Normalmente saio escondido do orfanato e acabo brigando com pessoas aleatórias na rua, tão sedentas por briga e precisando descontar raiva como eu. Normalmente consigo evitar qualquer machucado visível, mas dessa vez, acho que foram 22 caras, ou foram 23? Teve algum motivo concreto? Bem, óbvio que não, nunca realmente tem, e se tiver, na verdade eu ou quem eu espanquei procurou. Foi idiota além da conta, porque como manterei as minhas saídas escondidas se a prova irrefutável está literalmente estampada no meu rosto?

-Ahh... Realmente, que inconveniente...- Deixo escapar, deitando no chão frio com as mãos na cabeça. Viktor provavelmente me daria um sermão sobre eu passar dos limites, ou talvez riria de mim. Não... ele provavelmente faria os dois.

Bem, não posso reclamar, se não fosse por ele, eu poderia estar morto por agora, afinal, sem sua instrução, não teria como eu sair só com alguns cortes...- Penso, olhando de relance para minha perna esquerda, e não posso deixar de lembrar de quando o conheci...

Não sei bem porquê ou quando exatamente começou, mas é quase como se eu fosse uma bomba ambulante sem sinal de quando e onde vou simplesmente explodir. É como se eu começasse a transbordar com todo tipo de sentimento, e tudo que quero é destruir qualquer coisa a minha frente, provocar e sentir dor, e não consigo controlar isso, é como se eu perdesse qualquer racionalidade, e depois, só sobra a destruição que causei e uma sensação sufocante de vergonha e arrependimento. Foi quando eu comecei a sair escondido do orfanato, quando quase descobriram quem foi que conseguiu destruir um quarto inteiro do local. Só consegui escapar de ser descoberto porque ninguém pensou que o responsável foi um pirralho de 7 anos de idade. Meus olhos, meu comportamento, coisas que eu via, e mais alguma coisa que eu não sei dizer sempre fizeram eu me destoar, por isso, a última coisa que eu precisava era de algo mais, não quando finalmente consegui me manter ,de certa forma,camuflado entre os outros. Se isso fosse descoberto, realmente os padres achariam que eu estava possesso, e bem, talvez eu estivesse... Mas não precisava que ninguém mais notasse.

Ainda lembro que estava chutando sem parar um pilar de concreto com toda força que tinha, tentando concentrar o que quer que fosse que estava dentro de mim nesse momento. Lembro da dor latejante e do sangue que manchava o pilar enquanto eu fazia isso. Eu tinha achado esse lugar estranho, onde as pessoas se "reuniam" por diferentes motivos, alguns só queriam ficar sozinhos, outros queriam ficar mais fortes, e alguns queriam mostrar serem mais fortes que outros. Não era um bom lugar, por isso, era perfeito. Ninguém se importava com ninguém ali, muito menos prestavam atenção um no outro, por isso, mesmo uma criança como eu, mesmo agindo dessa forma, era completamente ignorada. Lembro de sentir, nesse dia, pela primeira vez, alguém me observando. De primeira eu ignorei, e quando estava na posição para dar mais um chute no pilar, minha perna foi bloqueada pelo antebraço de alguém. Apesar da minha idade, um chute meu era estranhamente forte, o que tinha me deixado um tanto arrogante nesse quesito, mas mesmo assim, esse homem quarentão apresentava uma expressão serena, como se não tivesse sentido nada, além de ter chegado na minha frente tão rapidamente que eu nem notei. Meu eu pirralho tinha ficado impressionado.

OS ELEMENTOS CELESTIAIS: As Lendas Nascem das Cinzas- Parte 1. [PRÉVIA].Onde histórias criam vida. Descubra agora