Três

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JOE a manteve esperando por 15 minutos. Era uma manobra padrão, que Taylor usara muitas vezes, para desequilibrar psicologicamente um adversário, mas estava determinada a não se deixar abalar. Pior, não havia espaço suficiente para andar no maldito armário que ele chamava de escritório. Trabalhava num dos mais antigos quartéis de bombeiros da cidade, dois andares acima da garagem dos caminhões, o escritório uma pequena caixa cercada de vidros com uma janela voltada para a vista desagradável de um estacionamento com o piso rachado e casas de cômodos. Na sala ao lado, Taylor via uma mulher batendo à máquina numa escrivaninha quase totalmente coberta por arquivos e formulários.

As paredes eram de um amarelo sujo que poderiam ter sido pintadas, décadas atrás, de branco. Estavam cobertas por fotos de cenas de incêndios... algumas das quais bem terríveis para fazê-la ter vontade de fugir... boletins, panfletos e alguns folhetos com piadas de gosto duvidoso sobre ingleses. Claramente, Joe não tinha problemas com as brincadeiras idiotas sobre sua origem.
Prateleiras de metal estavam atulhadas com pilhas de livros, documentos, panfletos e dois troféus, cada um deles terminando com uma estatueta de um jogador de basquete.

E, notou ela, fungando, poeira. Sua escrivaninha, pouco maior do que uma mesa de jogo, toda riscada, tinha sob uma das pernas mais curta um exemplar antigo em brochura de The Red Pony. O homem, certamente, não tinha respeito nenhum por John Steinbeck, um dos maiores escritores americanos do século XX.

Quando não conseguiu controlar mais a curiosidade, Taylor se levantou da cadeira de dobrar, com o assento de plástico rasgado, e mexeu nos papéis sobre a escrivaninha. Não havia fotos, observou, nenhuma lembrança pessoal. Clips de papel dobrados, lápis quebrados, um grampeador, uma terrível confusão de papéis. Ela empurrou alguns, então se afastou, num pulo, horrorizada, quando encontrou a cabeça decapitada de uma boneca. Podia ter rido de sua reação, se não fosse tão horrível. Os restos do brinquedo de uma criança, os cabelos louros anelados chamuscados, o rosto, antes rosado, tinha uma das faces torta pelo calor. Restara um único e brilhante olho azul, que a olhava fixamente.

- Lembranças - disse Joe da porta. Estivera observando-a por alguns minutos. - De um incêndio classe A, na zona leste. A menina também se queimou. - Olhou a cabeça sobre a escrivaninha. - Ficou um pouco melhor do que a boneca.

O tremor de Taylor foi rápido e incontrolável.

- Isso é horrível.

- É, foi. O pai da menina começou o incêndio com uma lata de querosene na sala de estar. A esposa queria o divórcio. Quando ele terminou, ela não precisou de um.

Joe era tão frio sobre aquilo, pensou ela. Talvez tivesse que ser.

- Você tem um trabalho miserável, inspetor.

- É por isso que o adoro. - Ele olhou em volta quando a porta externa se abriu. - Sente-se, já volto.

Joe fechou a porta antes de se voltar para o bombeiro uniformizado que chegara atrás dele.

Através do vidro, Taylor ouviu o som de vozes. Mas não precisava ouvir Joe erguer a voz - o que ele logo fez - para perceber que o jovem bombeiro estava recebendo uma forte censura.

- Quem lhe disse para arejar aquela parede, calouro?

- Senhor, eu pensei...

- Calouros não pensam, não são inteligentes o bastante para pensar. Se fossem, você saberia o que o ar fresco faz com um incêndio. Saberia o que acontece quando o deixa entrar e há uma maldita poça de óleo combustível escorrendo para debaixo de suas botas.

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