#ChoquinhosNoEstômagoSinto-me terrivelmente vazio. Há pouco estive chorando, sem saber exatamente por quê. Às vezes odeio esta vida, estas paredes, essas caminhadas de casa para a aula, da aula para casa, esses diálogos vazios, odeio até este diário, que não existiria se eu não me sentisse tão só.
Caio Fernando de Abreu
•••
A vida humana é efêmera, passageira. Gostava de me questionar o que seriam de todas as memórias, sem pessoas para mantê-las vivas.
Isso me incomodava, de certa forma. Pensar que, por mais bom que eu fosse, por mais bem que eu tentasse fazer para as pessoas, se eu não tivesse alguém para ver e lembrar, eu não seria reconhecido por isso.
Outros questionamentos vinham em minha mente, também: por que eu gostaria de ser reconhecido por algo, que, tecnicamente, eu havia feito de bom coração?
Talvez fosse porque eu queria ser lembrado como ele.
Independente de quantas pessoas fizessem da memória dele viva, eu sei que todas teriam apenas amor e saudade para lembrar de cada recordação.
Quando perdi meu pai, perdi metade de mim sem aviso prévio. O choque veio, a revolta, a dor, a tristeza. Todos esses sentimentos iam e vinham. Mas quem sempre insistia em ficar, era ele: o vazio. Me lembro de cada parte do meu corpo gritar, xingar a Deus e qualquer outra entidade religiosa que viesse em minha cabeça. Xingar aos governantes, aos espíritos, quem quer que estivesse na frente, eles seriam vítimas de minha fúria.
A parte que mais machucou veio depois que a raiva passou. Aquele silêncio que me deixava surdo, doía como o inferno. Eu gritava, pedia para que todos em minha volta falassem todas as palavras que eles conheciam, porque meu corpo pedia por arrego. Meu coração, ele pedia por socorro a cada palavra que meus tímpanos deixavam de ouvir.
Conforme a tempestade foi indo embora, meu raciocínio voltava aos poucos. Mas aquele vazio, ele nunca foi embora. Soube que, daquele momento para frente, eu estava incompleto e precisaria lidar com aquilo.
E isso me fez ter diferentes interpretações sobre minhas dores. Mesmo que meu pai não se fizesse mais presente fisicamente, eu continuaria tendo sua essência em um lugar que eu jamais seria capaz de perder: dentro de mim.
Eu teria suas lembranças, as lembranças que morte nenhuma seria capaz de apagar. Suas ações, seus ensinamentos, seus conselhos. Tudo isso era parte de mim, e eu sabia que com isso, uma parte dele se manteria viva para sempre, e eu teria o mérito de carregá-la.
E isso me confortou, de certa maneira.
—Jungkook? —Ouvi o chamado de senhora Karen, um tanto quanto distante demais.
O dia de apresentarmos a melodia havia chegado. Gostaria de mostrar para a professora, mas, infelizmente não poderia fazê-lo à sós com a educadora. Teria que mostrar para a classe toda, o que me deixava um tanto quanto desconfortável. Minhas melodias eram pessoais demais, cada mínima nota se estendia em fragmentos de mim.
—Sua vez. —Apontou para o piano. Sentei-me desconcertado, um tanto quanto perdido. Haviam me perguntado no decorrer da manhã se havia virado a noite jogando vídeo games. Gostaria que esse fosse o motivo de minha insônia.
Sorri breve assim que ocupei meu lugar no pequeno banco. Levei as mãos, trêmulas demais, até uma das mechas de meu cabelo, a colocando atrás da orelha que eu havia enfeitado de brincos.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Prímula
FanfictionEle era a bagunça vestido de jeans e coturnos. Ele me fazia questionar minha sobriedade. Digno da beleza angelical de um Deus da antiga Grécia, carregado com o charme infernal do próprio anjo caído dono do inferno. Apolo. Lúcifer. Park Jimin. •...