Ele

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4.0 - ALTURA

Durante algumas semanas, consegui manter a mente focada em outras coisas e deixar James um pouco fora de meus pensamentos. Pude entender que o que acontecera na festa e até no sonho fora um surto de adrenalina de recém-chegada a famosa Los Angeles, talvez somado com a saudade que ainda guardava de Becky. A grana que eu tinha guardada já estava chegando ao fim e eu precisava de uma vez por todas arrumar algum emprego, ao menos temporário. Delilah me prometeu uma entrevista com um amigo dela que era dono de uma loja de "artefatos exóticos". Tenho certeza que era algum brechó macabro, os moradores de LA adoram fingir que são originais e excêntricos. Em troca, eu deveria dirigi-la até alguns pontos da cidade quando havia audição para figuração de alguma série ou comercial.

- Hey, lembra do James? - Delilah me pegou de surpresa, enquanto eu dirigia. - Alto, loiro gostoso, estava naquela festinha lá em casa há um mês e pouquinho. - A voz dela era séria, quase triste.

 - Aham, o modelo né? - Fingi discrição. - Ele mesmo. - Ela fez uma pausa e continuou. - Acho que ele vai passar uns dias lá em casa. Parece que o primeiro mentor dele na vida de modelo, faleceu. James disse que ele era como um pai pra ele, sabe? Que o ajudou na carreira quando ele estava começando. Tadinho, James está devastado. A família do cara é de Phoenix, o enterro será lá. - Eu a ouvia com atenção. - Eu ofereci ele ficar uns dias lá em casa, porque as únicas pessoas que ele tinha aqui nos Estados Unidos eram eu e esse mentor. Não acho certo ele voltar pra Alemanha agora, ficar lá na agência e tudo mais. Ele precisa de uns dias de descanso. - Ela falou com pesar, triste pelo luto do amigo. 

Depois de alguns minutos de silêncio no carro, chegamos ao destino de Delilah. - Boa sorte no teste! - Ela sorriu abertamente e cruzou os dedos. - Torce por mim! Ah, a propósito... Tem como você passar no Target e comprar um colchão de ar? O James é bem alto, ele não cabe no meu sofá. Já tentamos. - Ela deu uma risadinha e saiu andando confiante, como sempre. Não deu tempo de responder, o sinal de trânsito já estava verde e ela longe. Fiquei martelando na mente a última frase de Delilah. Como assim "já tentamos"? Não consigo imaginá-los dessa forma. Talvez já tentaram dormir juntos? Transar...? Não. Não era possível. 

Empurrava o carrinho de compras tedioso, aproveitando para enchê-lo de alguns pacotes de comida congelada. Enfim, o corredor de infláveis. Havia uma jovem de cabelo colorido e muitos piercings, ela usava o uniforme da loja. - Com licença, sabe me dizer onde posso encontrar colchões infláveis? - Abordei a moça, que estocava boias infantis numa prateleira. - Claro, qual seria o tamanho? - Ela perguntou com gentileza. Hesitei. - Hm... Ele é alto. - Disse, com um semblante confuso, lembrando das palavras de Delilah. Ela parecia ter ouvido a coisa mais idiota do dia. - Sim... Alto quanto? Mais alto que você, um pouco menos? - Ela fazia um gesto de medição de altura com a mão e um olhar curioso, pronta para ajudar. - Será que você pode me dizer onde fica e eu mesmo confiro? - Franzi o cenho e escondi um pouco os lábios, como quem pede desculpas por ser inconveniente.  

Precisava descobrir que modelo comprar. Eu poderia comprar o maior modelo disponível da loja, isso resolveria os problemas, já que com certeza ele não se importaria de ficar com um espacinho sobrando. Peguei o celular, abri o navegador. Afinal, ele era modelo, a altura dele com certeza estava em algum site de agência, era informação pública. Não sabia seu sobrenome, droga. Pesquisei no Google apenas James modelo alemão. Eram as únicas informações que eu tinha dele. Sem surpresas, uma enxurrada de modelos alemãs apareceram na tela. Porra. Tentei mais uma vez: James modelo alemão loiro. Novamente, uma enxurrada de modelos genéricos. Todos pareciam o mesmo, nenhum era ele. Fui clicando de site em site, agência em agência, os olhos atentos para achá-lo. Cadê você, James? Pensei em voz baixa, já há alguns minutos fitando a tela. 

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