Capítulo VI - Caminhos do coração.

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Após a fala de Elizabeth, se fez silêncio. Ela podia sentir seu estômago se revirando pela ardente vontade de ouvir algo, mesmo que fosse ruim, mesmo que não fosse nada de mais. Mas o silêncio permanecia. Hugh e Fionna encaravam-na pasmos, lábios entreabertos de surpresa, e seus dedos inconscientemente se cravaram na terra. Ela desviou o olhar, a incerteza a dominando aos poucos. 

Mas de repente, braços envolveram-na em um abraço surpreendente afobado. Os olhos de Elizabeth se arregalaram. Várias situações passaram pela sua mente, inúmeras reações, expressões, falas. Mas Elizabeth nunca supôs que algo assim poderia ocorrer. 

Um abraço.

O mesmo conforto que sua mãe lhe deu antes de se despedir, a calmaria que lhe foi passada quase instantaneamente em um simples contato. O abraço apertado que seu pai lhe dera antes que fosse participar da guerra para nunca mais voltar. O mesmo abraço que prometeu que nada iria separá-los, nem mesmo a morte.

A demonstração de afeto, de carinho, que ela nunca havia recebido de ninguém além de seus pais. A ternura que por tantos anos ela se esquivou, mas agora, ela apenas encontrou forças para retribuir o abraço de Hugh em um pedido silencioso.

Fionna a abraçava por trás, com o queixo levemente apoiado em seu ombro. Suas mãos tímidas eram leves, mas firmes. Tudo que Elizabeth podia sentir era o ardor em sua pele, e a frieza, que ela nunca percebeu que carregava em si, se dissipou em um instante. 

"... Eu entendo" sussurrou Fionna, tão baixo que quase não foi ouvida. Suas mãos se apertaram em torno da garota. Olhar para Elizabeth era como se olhar em um espelho, pois ela carregava em si o mesmo medo, o mesmo desejo de aceitação que Fionna tinha. Eram parecidas, percebeu, não pela aparência, mas pelas cicatrizes que adornavam seus corações. Unidas pelo peso de ser diferente; mas ansiar, secretamente, em ser normal. Comum.

Hugh sorriu, se afastando um pouco, para dizer, "Eu também entendo, Elizabeth. Todos nós entendemos."

Elizabeth fitou os dois, um sentimento crescia em seu peito. Ela os puxou novamente em um abraço enquanto deixava uma risada escapar.

Ela não estava sozinha.

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Peregrine observou cuidadosamente a cena por uma janela do segundo andar. As três crianças no chão, amontoadas em um abraço. O canto do seus lábios se curvaram, e ela não reprimiu o sorriso que apareceu em seu rosto. 

Elizabeth nunca deixava de a surpreender e quando ela viu o olhar brilhante da tímida Fionna, e a risada que ela compartilhou com os outros dois, ela novamente encontrou uma semelhança entre Elizabeth e Robert. Ambos conheciam os caminhos que levavam ao coração, e sabiam naturalmente como conquistar o favor dos outros.

Peregrine virou levemente sua cabeça para o garoto que estava ao lado. "Por favor, Enoch, avise-os que o almoço já está pronto, e que estamos aguardando por eles."

Enoch simplesmente acenou, sem falar nada, e lançou um último olhar rapidamente na cena antes de se retirar. Ele desceu as escadas, absorto em pensamentos e abriu a porta.

O quê, realmente, era essa garota?

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Durante o almoço Elizabeth decidiu conversar um pouco mais com Hugh e Fionna. Ela estava sentada entre eles, enquanto Fionna a explicava mais sobre as plantas do jardim. Ela aprendeu o nome de quase todas as flores que decoravam o canteiro. Havia petúnias, cosmos, tulipas, e uma das flores preferidas dela eram as papoulas vermelhas.

Após serem chamados para almoçar por Enoch (que carregava a mesma carranca de sempre), eles retiraram seus sapatos completamente imundos e os deixaram do lado de fora da casa. Enquanto lavavam as mãos, Claire que estava encostada na porta do banheiro apontou para o rosto de Hugh, e quando ele olhou para o espelho, arregalou os olhos ao perceber que tinha terra até na testa. Seu rosto ficou rosa enquanto ele enfiava o rosto na pia tentando se limpar em desespero. Claire quase chorou de tanto rir.

Elizabeth olhou para o prato com um sorriso gigantesco no rosto. O sentimento que ela havia sentido após ter sido abraçada ainda não havia deixado seu peito, mas parecia crescer, e dominava o seu coração aos poucos deixando uma sensação confortável de calor, como uma chama acesa dentro de si. Talvez esse fosse o sentimento de ser querida.

Mas Emma logo chamou sua atenção, exclamando com sua animação clara como o dia:

"Você vai amar a praia, Elizabeth! Vai ser incrível, eu posso até te emprestar um maiô se você quiser."

Elizabeth largou seu garfo no prato, arregalando os olhos. 

"Nós vamos usar maiôs?"

A loira acenou com a cabeça. Elizabeth podia sentir seu rosto corando ferozmente ao se imaginar usando aquela simples peça de roupa. Todos olharam para ela em confusão, deixando-a ainda mais embaraçada. Mas felizmente, Peregrine veio em seu socorro.

"Você não precisa usar um se não quiser, Elizabeth" ela disse rapidamente. Elizabeth balançou a cabeça, afastando os pensamentos. 

"Não, senhora Peregrine. É que... Eu posso usar minhas luvas mesmo assim?"

Alma acenou, e deu um sorriso reconfortante à menina. "Claro que sim, senhorita Atkinson."

Elizabeth suspirou, e sorriu de volta. "Então para mim está tudo bem."

Emma se alegrou novamente, e começou a divagar falando sobre tudo o que elas poderiam fazer juntas na praia. E se Elizabeth não estivesse tão distraída com a conversa, talvez ela percebesse que os olhos de um certo garoto não deixavam sua figura. 

Mas Victor percebeu, e não pode deixar de fazer graça sobre, ao que Enoch simplesmente revirou os olhos e murmurou um: 

"Cale a boca."

Mas ele logo se encontrou fixando seu olhar sobre ela novamente. Dizer que ele estava curioso sobre a garota seria um eufemismo. Enoch queria desesperadamente entender o que tinha de diferente em Elizabeth. Mas já que seu ego não o permitia ir e se aproximar da garota como uma pessoa normal, cabia a ele apenas observá-la.

E, secretamente, Enoch achava que era muito mais interessante dessa forma.

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⏰ Última atualização: Nov 09, 2021 ⏰

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