Lúcio
Observo as prateleiras, a minha frente, indeciso. O alvejante comum até que daria conta por um tempo, mas será que esse concentrado realmente rende tudo isso?
Putz que decisão. Pego os dois alvejantes e sigo pelo mercado a procura de amaciante. Passo no corredor de bebidas e discretamente pego uma vodca.
Distraído, olho para os lados e vejo uma mulher me observando. Linda. Seus cachos escuros caem soltos pelos ombros. Seu corpo delgado está envolto em um vestidinho leve, típico desse verão. Os olhos amendoados me olham com timidez e desviam. Parece jovem. Talvez tenha no máximo vinte anos.
Saco. Sempre que isso acontece eu fico na berlinda. Olho bem as pernas cor de café, torneadas, o volume dos seios que parecem ser perfeitos para minhas mãos. A quanto tempo mesmo eu não fico com alguém? Hum!? Deve ter uns bons três anos. Eu devo poder controlar. Não posso?
Ando até ela um pouco inseguro e inclino um pouco a cabeça na direção dos vinhos que ela finge olhar.
— Hei! — tento com simpatia.
Ela sorri ainda um pouco tímida, mas me dá uma leve conferida mais de perto.
— Hei! — Ela responde.
Ficamos em um silêncio constrangedor. Ela olhando para as próprias mãos entrelaçadas na frente do corpo e eu olhando para ela. Credo. O que eu estou fazendo?
— Bom... — Pigarreio — Essa marca de vinho é bem boa, na verdade — Digo aleatoriamente sobre o vinho que está na promoção — Err... acho que já vou indo então...
Saio andando com o embaraço me consumindo. Merda. Ouço sua risada forte e um pouco rouca e me viro.
Ela me encara ainda com um sorriso brincando em seus lábios delicados.
— Acho que não começamos isso direito, não é? — Ela sorri novamente e estende a mão direita — Me chamo Jen.
Olho de seu rosto simpático para sua mão estendida. Aproximo-me devagar e aperto a sua mão estendida sem tirar minhas luvas.
— Eu sou Lúcio. — Me apresento sorrindo que nem um tapado.
Ficamos um tempo nos olhando ainda com as mãos apertadas uma na outra.
Ela tira a mão da minha um pouco constrangida e pega uma garrafa de vinho.
— Então — Ela desvia os olhos da garrafa em sua mão, pousando-os em mim — Estou indo para uma festa na minha fraternidade por aqui... — Ela hesita, arregalando os olhos — Você não é nenhum tipo de psicopata ou um daqueles caras violentos é? — Ela indaga assustada como se a ideia a acabasse de lhe ocorrer.
Acabo rindo um pouco da sua preocupação e da ironia da situação. Eu perigoso? Há.
— Bom, não. Eu não sou um psicopata e não sou violento. — tento tranquiliza-la — Moro a duas quadras de Columbia e sou até um ex-aluno.
Ela olha para mim, surpresa.
— Uau — ela exclama — Ex-aluno hein... — Uma ruguinha se forma entre suas sobrancelhas — Quantos anos você tem?
— Vinte e sete — Minto. Não tenho como dizer ter, na verdade, cinquenta anos sem ela me achar mentiroso ou maluco — Me formei tem alguns anos já! — Ao menos uma verdade.
Ela se mexe desconfortável na minha frente e sorri sem jeito.
— Foi mal ter perguntado se você era um psicopata... É que eu sou nova na cidade e ainda estou um pouco medrosa — Ela suspira — Mas se você puder esquecer esse detalhe, eu estava falando de uma festa que vai ter na minha fraternidade e gostaria de saber se você não quer me acompanhar? — Ela pergunta, enfim.
Olho para a garota na minha frente, admirado. Mesmo sendo obviamente tímida, ela foi direto ao ponto comigo. Desvio a minha atenção para minhas compras atrás de mim e encaro firmemente minhas luvas. É verão. Deve estar fazendo no mínimo uns 29 graus nessa noite e eu estou embalado que nem um maluco. Eu posso controlar.
Não adianta de ficar com medo pra sempre. Tiro as luvas como quem não quer nada e sorrio para ela.
— Claro, vamos sim.
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Fonte Inerte
FantasiHelóy luta há muito tempo para se manter pacífica. Dona de uma divindade que recebera ainda muito cedo, ela aprendeu amargamente o quanto pode ser perigosa. Trabalhando em uma boate em Dublin, ela tenta conciliar uma casa que só pede reformas, seus...