O moço

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— É você! — afastei-me rapidamente para vê-lo melhor. — É você que vejo todo dia! Você que estava do meu lado no dia do assalto e depois sumiu, e é você que aparece todo dia dentro e fora da escola! — disse tudo de uma vez, quase gritando.

— Shh...

— Mas... mas... sempre que viro o rosto e, segundos depois, volto a te olhar... você não está mais lá! Como consegue ser tão rápido?! Você... você simplesmente some!

— Eu sei, eu sei...

— E ninguém te conhece! Não importa pra quem eu pergunte, ninguém nunca te viu! Como é possível?!

— Você perguntou sobre mim... — sua voz era de preocupação.

— É claro! Parece que só eu te vejo...

— Sim, Amanda... mas infelizmente eu não posso te contar o motivo, não ainda. É que... é super secreto — Ele sussurra as últimas palavras.

— Super secreto?

— Sim — Ele sussurra e eu dou uma risadinha. — Poucas pessoas da escola me conhecem, ou sabem que estou lá trabalhando.

— O que você faz?

— Protejo pessoas.

— Bem, você fez isso bem me tirando da rua... — Eu ri, mas de nervoso.

— É, e por falar nisso... você não devia estar na escola?

Então eu me lembro do motivo de eu vir parar aqui.

Tamara.

Somos grandes amigas há anos, mas eu não me lembro disso... eu me esqueci dela e sinto-me horrível.

— Amanda? Terra chamando Amanda... — o moço me chama do mesmo jeito que o meu irmão me chamava. Isso me faz rir.

— Meu irmão me chamava assim...

— É, sei... — o moço pareceu ter ficado sem graça — mas então? Por que saiu correndo?

— Porque eu descobri que sou uma pessoa horrível, eu me esqueci da minha melhor amiga, esqueci que somos grandes amigas há anos, escapou da minha memória e eu não sei como, não sei o porquê, só sei que sou a pior amiga do mundo! — Eu disse tudo de uma vez e a vontade de chorar me pegou com força. Não consegui segurar. Odiava fazer isso na frente das pessoas, odiava mostrar minha fraqueza.

— Ei, ei... eu tenho certeza que você não é. Se fosse, não estaria assim preocupada, e muito menos teria saído correndo daquele jeito. Olha pra mim — Ele me pede, tocando no meu queixo para que olhasse para ele... igual ao meu irmão... e isso faz o meu coração aquecer. — Tenho certeza que a sua amiga tem muita sorte de ter a sua amizade.

— Como você sabe? Você não me conhece... — Eu pergunto, mas, por dentro, agradeço pelas palavras, elas me acalmaram.

— Eu só sei — Ele só disse isso.

Eu sentia algo diferente vindo dele. Paz? Sabedoria? Não sei, mas gostava daquele moço. Eu não era de fazer amigos homens, não tinha assunto para falar com eles, mas, com esse moço, eu não precisava forçar nada, apenas fluía.

Ele me convenceu a voltar para escola antes que tocasse o sinal do fim do intervalo, e falar com a Tamara, pedir desculpas por não me lembrar, e por ter corrido daquele jeito, explicar que eu estava assustada, mas que agora passou, e que quero recuperar o tempo perdido. Ela entendeu super bem e ficou muito feliz com essa minha decisão, porque era o que ela estava tentando fazer desde o dia que decidiu fazer par comigo na aula de História. Se ela soubesse o alívio que senti na hora...

Ospróximos dias foram assim. Quando dava tempo, eu falava com o moço sem ninguémsaber. Normalmente, ele ficava na quadra de futsal da escola. Aquele lugarficava vazio porque não havia mais esse esporte na grade curricular, e não foisubstituída por nenhuma outra. O portão de entrada estava sempre fechado, masnunca trancado, então (quando ninguém estava por perto), eu entrava lá e ficavaconversando com o moço misterioso salvador de pessoas. Cada dia era umahistória diferente.

Eternamente, Pimentinha - Conto 1 (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora