Capítulo II

116 8 6
                                    


"Tarde demais a conheci, por fim; cedo demais, sem conhecê-la, amei-a profundamente." [Adaptado]
William Shakespeare

                                                                          ♥

Cantarolava uma música que teimou em se fixar em sua mente, bastou uma noite presente em uma casa de ópera para decorar praticamente todas as músicas mais enjoativas. Se lembraria de executar um serviço em um local menos barulhento da próxima vez, assassinatos em operas já estão se tornando cada vez mais clichês.

Ponderava no assunto enquanto passeava o tecido de algodão cru na lâmina de sua adaga suavemente, a peça era delicada e o homem gostava de vê-la brilhando. Considerava marcante quando a luz do aço desaparecia no mesmo instante em que o brilho dos olhos de alguém. O vermelho decorava os gumes trazendo aquele cheiro metálico que acalentavam suas narinas. Muitas pessoas consideravam seu trabalho um crime ou talvez um ato desumano, mas Fernand preferia pensar que era um artista, e como todos os artistas incompreendidos ele focava ainda mais em aperfeiçoar o serviço.
Era requisitado, podia desaparecer com alguém em questão de minutos sem deixar rastros ou qualquer tipo de evidência. Era bom em forjar também, fazia convizinhar um suicídio, um acidente infeliz ou um assassinato brutal. Só bastava alguém querer.

******************

No momento estava entretido com seus próprios negócios. Com a possível doença do monarca a aristocracia do clã original estava vulnerável, isso significava que o acesso a eles seria mais descomplicado. Caso arquitetasse bem seus próximos passos poderia eliminar o clã da Rosa até o ultimo membro e reivindicar seus direitos.

Enquanto estava pensando sobre ouviu um barulhinho vindo de trás de si, mais exatamente de dentro do armário de madeira. Caminhou suavemente até o móvel bem trabalhado o abrindo com calma. Deu de cara com a pior parte do seu serviço (vítimas mirins). Havia uma criança ali dentro, um garotinho de cinco aninhos agarrado a um coelho de pelúcia. Encarava bem a máscara medonha que cobria o rosto de Fernand. Era um menino corajoso! Ouvira seus pais deixarem este mundo minutos atrás e não deu nem um "piu". Nem mesmo quando viu de relance os corpos manchados estirados no carpete. Gostava de crianças assim, quietas e nada escandalosas. Simplificava o esquema.

Para o azar do jovenzinho a ordem que recebera era de não deixar sobrar uma alma vivente naquela casa. Não foi difícil. Não era como se já não houvesse executado crianças antes, era um trabalho vil mas não impossível.

Ao se certificar de que todos da mansão estavam em outro plano, se dirigiu aos fundos a procura de seu cavalo negro Bethoven. Teve de arrastar com o pé o corpo gordo da empregada para que pudesse finalmente abrir a porta e ir embora, tinha um outro compromisso na cidade e não queria se atrasar. Subiu na cela do seu belo animal lhe dando uma batidinha suave no pescoço para que colocasse o pé na estrada(no caso os cascos). Bethoven era veloz como um campeão, talvez o corcel mais ágil que aquela terra já vira. Inúmeras vezes despistou guardas de feudos e até a cavalaria imperial, parecia nunca se cansar. Bastava uma maçã e já estava preparado pra fazer qualquer exército de tolo. Por esta questão, chegaram a cidade da capital em um curto período de tempo. A sorte estava a seu favor, porque entrar naquela mansão não foi exatamente um trabalho simples.
Haviam guardas, sentinelas e muitos lacaios atentos. Precisou explorar bem suas habilidades para conseguir sair por cima, mesmo assim se feriu um tanto. Nada alarmante, um corte aqui e ali que precisavam de costura e um pouco de álcool para sanar qualquer infecção.
Iria sobreviver para lutar mais um dia.

Já estava chegando na cidade mais próxima.
Tinha sido convidado por um amigo a ficar para o jantar, havia tempo que não se reunia com Simon e lhe devia isso. Era seu melhor amigo e parceiro, ambos serviram bravamente o exército imperial na juventude e depois seguiram a carreira de mercenários até Simon decidir se casar e abandonar o manto. Não ficou infeliz com isso, na verdade o invejava. Seu amigo conseguiu uma mulher que o amasse apesar de seu passado manchado e o péssimo costume de cantar, tinha uma casa aconchegante, um trabalho rentável e logo teriam um filho. Fernand já pensou em possuir todas essas coisas, contudo, não era o tipo de pessoa que atraía as mulheres certas. Sabia que mulheres da vida, garotas emocionadas e jovens de péssima conduta lhe encaravam com desejo, mas não era exatamente esse tipo de moça que buscava. Não sabia ao certo seu tipo ideal, só temia o dia que de fato descobrisse.

O Cravo e a RosaOnde histórias criam vida. Descubra agora